Após separar meu rosto da máscara que me cobrira para proteger-me da claridade escura do dia, pude ser tomado pela sensação caótica de satisfação que a escuridão me trazia.
Meu cenho se relaxou, agora na escuridão eu não me preocupava com a imensidão de olhos que me encaravam fixamente ao tentarem decifrar meu disfarce.
Eu presenciava o clima gélido do cômodo invadir minhas artérias que pulavam em meus pulsos. Perfeito. Eu fui consumido pelo frio e escuridão que estavam acoplados à tinta branca da parede alta da qual me prendia a atenção. A luz da lua era única fonte de luz que podia ser vista, ela desenhava suas cartas de amor ao Sol nas placas de cerâmica do cômodo. Junto a sua luz estavam os sopros serenos da noite também frios, dos quais remexiam as cortinas fazendo-as dançar.
O frio que prevalecia em meu interior, alimentava o ego que a mim pertencia e me exterminava gradativamente, rasgando minha alma em estilhaços que não se reconstituiam, mas se tornavam feridas cada vez maiores que não se cicatrizavam.
Tempos após consumir as pílulas coloridas em pleno escuro, as paredes brancas já não prendiam a atenção, eu podia sentir a instabilidade que os móveis se encontravam. Meu estômago rugia ao lamentar tal mazela, meu neurônios se queimavam ferozmente, a temperatura subia, meu corpo tremia involuntária e rapidamente, as mágoas que antes eram aprisionadas em minha consciência. Tudo balançava brutalmente, até que a calmaria tomou conta do cômodo novamente, a normalidade havia sido estabelecida. Porém, eu não podia mais ver o luar que iluminava o quarto e escrevia as cartas apaixonadas, não podia sentir o sopro que se tornara trilha sonora para a dança das cortinas. Só restou a mim uma vastidão negra e estática. Minhas artérias não bobeavam mais o sangue que escorreram antes por minha pele. Eu havia me transformado num cadáver, sóbrio e solitário. Estava a vontade, pois o bom filho a casa torna.
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Melancolia (Contos)
General FictionContos demonstrativos de personagens diferentes dos quais sofrem com a psicopatia reforçada pelo cotidiano dos quais frequentam. Todos se disfarçam rotineiramente para esconder o monstro melancólico dos quais se tornaram. "O frio que prevalecia em m...