Olhei em meu relógio. Eram quatro horas da manhã.
Não consegui pensar em quem estaria batendo à porta; meus pais estavam em Busan, mas tinham as chaves. Ninguém de minha família faria uma visita em tal hora, muito menos alguém da escola.
Girei a tranca lentamente e a porta de entrada se escancarou no breu da noite. Aquele véu de escuridão e estrelas se ergueu perante a mim.
Forcei meus olhos e consegui enxergar um garoto, alto e magro, ofegante. Estremeci, com medo do que poderia acontecer em seguida.
—Ajuda —ele conseguiu dizer enquanto procurava o ar —Por favor.
Me compadeci com o triste olhar do rapaz. Ele parecia um ou dois anos mais novo, exausto, sem forças para me causar qualquer tipo de dano.
Fechei a porta atrás de mim, olhei para os lados me certificando de que não havia mais ninguém e o puxei até a garagem externa.
Liguei as luzes e pude ver claramente o desconhecido. Ele não era como os outros garotos de Seul. Não tinha vestes chamativas, brincos nem cabelo colorido.
—Respire —estendi minhas mãos na direção dele —Quem é você? Está fugindo de alguém?
Ele caiu de joelhos, levando a mão a cabeça.
—Eu fugi —sua voz era grossa, mas estranhamente bonita —Minha família e eu corremos pela fronteira. Entrei em um trem e agora estou aqui.
—Fronteira? Você veio de outra cidade?
—Coreia do Norte.
Recuei um passo, quase caindo, esbarrando em algumas tralhas da garagem. Levei a mão a boca e tentei raciocinar. Aquilo só podia ser uma brincadeira, certo? Programas de variedades são comuns aqui.
—Me ajude, por favor. Eu não posso voltar.
Notei que ele apresentava algumas feridas no rosto e nos braços. Eu poderia dar um jeito naquilo depois.
—Certo... —eu disse, ainda insegura —Fique aqui por esta noite. Se tentar fazer algo, eu ligo para a polícia.
Ele respondeu com uma reverência formal.
Saí com passos rápidos em direção a minha casa e me tranquei lá novamente.
Havia um estranho dormindo na minha garagem.
Encarei o céu pela janela por um momento, já sem sono, e pensei no quão excitante aquela situação era.
Eu venho pedindo há muito tempo por algo que mude minha realidade, por algo que me faça sentir adrenalina. Talvez essa situação fosse demais, mas eu não podia estar mais alegre por sentir meu corpo arrepiado, meu sangue gelando.
Era a chance perfeita para a aventura que eu tanto venho esperando na minha vida de colegial. Talvez eu esteja em um momento de pura insanidade.
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F R O N T E I R A S
RomanceKim Yo Song e Cha Hye Moon. Dois adolescentes com histórias parecidas, mas limites estabelecidos; ele nasceu na Coreia do Norte e ela, na Coreia do Sul. A família de YoSong consegue fugir após um período de crise na ditadura em que vivem, e o jovem...