Saligia: pt 1

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O prédio cheirava a podre, em seu chão haviam poças de água e lodo, no segundo andar daquela construção abandonada havia um colchão que fora largado ali há tempos atrás junto com mais alguns entulhos, a luz do sol invadia o espaço por uma fresta no teto, acertando o rosto de Hoseok em cheio, incomodando seu sono, embora ele quisesse permanecer naquele lugar para sempre, se obrigou a levantar devido a claridade repentina, limpou-se freneticamente, não acreditando em sua coragem de ter deitado naquele colchão mofado, nem mesmo ratos se atreveriam a tocar naquela coisa.

Sua bolsa, a única coisa que carregava consigo, estava largada próximo a seu pé, o garoto sorriu aliviado em vê-la, não que houvesse algo de extremo valor ou algo que fosse servir de ajuda no futuro dentro dela, a única coisa que lhe fazia peso estava presente no bolso principal, era possível ver o contorno dos recipientes cilíndricos de suas tão preciosas pílulas, mordendo seus lábios com receio, ele se abaixou, abrindo o zíper de imediato, quantas vezes já não havia prometido parar com aquilo, mas naquele momento tão miserável não havia nada para ser perdido, Hoseok já havia perdido tudo.

Despejou as cápsulas de cores variadas na palma de sua mão, os comprimidos em tons vivos de azul, vermelho, amarelo davam a impressão de serem pequenos doces, mas diferente da sensação adocicada e reconfortante de mastigar açúcar puro, aquelas pílulas amargavam como o inferno e faziam o cérebro de Hoseok se apodrecer a cada dose exagerada que ele tomava.

Contou oito ou nove pílulas que entravam em sua boca, a garrafa plástica de água que sempre estava em sua bolsa para acompanhar aquele vício inegável, já estava quase vazia, mas era suficiente para fazer com que aquelas coisas fossem garganta abaixo.

Hoseok tirou do bolso de sua calça a carteira de couro gasto, a jogou no chão e pegou o fósforo que havia pego antes de sair de sua casa, colocando fogo na mesma, todos seus documentos estavam sendo incinerados enquanto ele assistia aquele pequeno show de chamas.

Deixando o edifício que lhe serviu de abrigo por uma noite, ele caminhou em direção a lugar nenhum, o movimento de carros ainda era tímido devido ao horário cedo, o que deixava o jovem mais tranquilo, não precisava de mais barulho, sua mente em si já estava lhe deixando louco.

O dia passou ligeiro, e as pernas de Hoseok gritavam por descanso, mas ele não queria parar, seu corpo estava a um fio de ceder, estava com sede e fome, mas incapaz de parar e pedir por ajuda.

Nenhum infortúnio havia lhe acontecido durante aquele dia, nenhum imprevisto, nada que o tirasse de sua bolha problemática. Quando a escuridão tomou conta do céu, sua jornada ganhou um ar fúnebre e sombrio, aquele jovem nunca havia sido um homem valente, honestamente, sua covardia o impedia de fazer inúmeras coisas proveitosas, mas naquele estado em que ele se encontrava foi impossível o medo o consumir, por isso seus passos nem aumentaram ou diminuíram de velocidade quando colocou o Primeiro pé na ponte do rio Ran, longa e escura, talvez um pouco perigosa para aquele horário, em condições normais, nenhum ser humano seria louco o suficiente para ir sozinho, Hoseok não possuía um condição normal, para se passar um pouco mais de controle mental, abriu a bolsa pegando os remédios, graças a ausência de água ele foi obrigado a mastigar os comprimidos até que virassem uma massa amarga e fácil de engolir.

O frio o importunava, queimava seu rosto indo na direção contrária ao seu corpo, literalmente chicoteado as partes de sua pele livre de vestes.

Quase chegando na metade do caminho Hoseok se sentiu tonto e assustado, um arrepio incomum desceu por sua espinha, ele sentia que havia alguém o seguindo, mas se via errado quando olhava para trás, não havia nem mesmo uma sombra, a ponte estava tão vazia quanto a alma de Hoseok, sentindo o peso de seu corpo, caiu em seus joelhos, incapaz de executar um movimento sequer, o vislumbre que teve antes que seu rosto batesse contra o concreto gelado foram de alguns vultos andando ao seu redor, ele escutava vozes, mas elas pareciam tão distantes, tentava gritar mas algo lhe impedia usar sua voz, sentiu como se um lençol houvesse sido estendido sobre o seu corpo, o afundando ao chão, Hoseok tinha consciência apesar de estar em meio a um cenário totalmente negro.

S.A.L.I.G.I.AOnde histórias criam vida. Descubra agora