Capítulo Único

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Tabitha sabia que seu grupo esperava por ela para seguirem jornada, mas não podia deixar passar aquela oportunidade. Depois de anos procurando, finalmente encontrara. O vestido era, sem dúvida, o artefato que mais desejara desde que soube de sua existência. E agora ele seria seu.

Despejou todas as suas economias no balcão, sorrindo de orelha a orelha. O velho elfo soltou um suspiro e começou a contar. Tabitha já fazia seu caminho até o provador com o vestido em mãos.

Tirou sua armadura tão rápido quanto conseguia, enquanto se balançava de um lado para o outro e dava pulinhos. Ignorou os chamados de seu grupo pelo brinco encantado, se limitando a responder 'Estou ocupada' uma única vez.

O tecido rapidamente se ajustou a sua pele enquanto ela admirava os padrões florais que decoravam o vestido. Quando se deu por satisfeita, recolheu suas coisas e voltou para o balcão.

— Tudo certo? - perguntou ao ver que seu dinheiro já tinha sido recolhido.

O elfo apenas concordou com a cabeça e um suspiro e a clériga saiu porta a fora saltitando.

Carina estaria furiosa pelo atraso, a maga sempre fora chata com essas coisas, mas Tabitha só pensava na cara que Kana faria. A halfling era a paladina do grupo e sua companheira de compras e sempre duvidara da existência do artefato. Agora teria que acreditar.

A praça central estava começando a encher e a clériga pôs-se a correr, tanto para não irritar mais Carina quanto para evitar a multidão que logo dificultaria sua passagem. Quando avistou seus companheiros, Kana veio ao seu encontro.

— Você achou!

— Sim! - Tabitha girou no lugar, deixando a saia ganhar volume.

— O que é isso? Onde está sua armadura? - perguntou Carina, com cara de reprovação.

— Isso tem bolsos. - ela não conseguia esconder a felicidade.

Carina levou esfregou as têmporas e soltou um suspiro.

— Não importa, vá se trocar. Essa roupa não é apropriada para a nossa missão.

— Acredite, meu vestido é apropriado para qualquer missão, ele tem bolsos.


Ok, talvez eu não tenha pensado nisso direito. Tabitha estava escondida atrás das rochas do covil de um dragão verde enquanto Kana e Hugar, o guerreiro que as acompanhava, serviam de isca. A missão era para ser simples. Entrar, pegar um ovo e sair. Já tinham enfrentado dragões antes, o quão difícil podia ser? A resposta era muito. Aquele dragão era maior do que qualquer um que tivessem visto antes. E era venenoso. A clériga estava sentindo falta da proteção contra veneno que sua armadura lhe conferia antes.

Sacudiu a cabeça, o vestido tinha bolsos. Obviamente era um artefato mágico infinitamente superior. Ela só tinha que adaptar um pouco seu estilo de luta. Ia ficar tudo bem.

— Eles não vão aguentar muito tempo. Vou usar Invisibilidade em você e você pega o ovo. - falou Carina, que se escondia ao seu lado.

— Por que eu?

— Porque você é mais resistente que eu, um sopro daquele bicho e eu já era.

— E você acha que eu não?

— Você costumava aguentar. Ninguém mandou colocar um vestido.

De cara amarrada, Tabitha concordou. Carina fez o encantamento e logo Tabitha viu seu reflexo no córrego próximo sumir. Assim que a magia fez efeito, ela começou a caminhada até o ninho. E a primeira coisa que notou é que não fazia barulho.

Por estar acostumada com armadura pesada, era também a pior pessoa do grupo para se esgueirar por lugares, porque sempre que andava, ficava óbvio onde estava graças ao metal se chocando. Mas seu vestido não era de metal. Mais empolgada, apertou o passo. Precisava ser rápida. Por melhor que Kana e Hugar fossem, eles não aguentariam para sempre.

O ninho era gigante, assim como o ovo verde brilhante que descansava nele. Respirou fundo e pulou para dentro. Ela era uma humana razoavelmente alta, e aquele ovo ainda era duas vezes sua altura. Tentou levantá-lo e, surpreendentemente, conseguiu. Mas não aguentaria carregá-lo por muito tempo. Eu tenho bolsos! E para sua surpresa, o ovo coube num deles.

Aliviada, iria fazer seu caminho de volta, quando viu Kana cair, seu escudo quebrado ao meio. Usando suas botas, Tabitha cruzou o espaço que a separava da amiga em tempo recorde, passado por baixo das patas do dragão.

Uma mão no símbolo divino em seu pescoço, a outra estendida para tocar a amiga, brilhando com um tom azulado. As palavras saiam de sua boca sem que precisassem pensar nelas. A magia se espalhou pelo corpo de Kana e a halfling respirou profundamente antes de acordar.

Tabitha só teve tempo de sorrir antes de ser atingida na cabeça pela cauda da criatura, se chocando contra a parede. Podia sentir que tinha deslocado algumas costelas e se curou rapidamente. Colocou a mão no bolso esquerdo e puxou sua maça prateada.

Uma vez focada na batalha, o dragão não a acertou mais. O vestido parecia puxá-la na direção certa para esquivar toda vez que um ataque se aproximava.

— Eu estou com o ovo! - gritou para os companheiros.

O ovo podia ser a missão, mas o dragão definitivamente iria atrás deles se o deixassem vivo. Isso se conseguissem escapar sem matá-lo primeiro.

— Eu tenho um plano! - falou Carina

A maga conjurava feitiços que empurravam a criatura para o fundo da caverna. Tabitha e Kana usavam suas magias divinas para impedir que o dragão levantasse vôo e Hugar o mantinha ocupado. Quando Carina deu o sinal, Tabitha correu até Hugar e o puxou para longe enquanto a maga causava um desmoronamento.

O grupo correu para a saída, Hugar pegou Kana no colo e Carina deu a todos habilidade de vôo. Esquivando das rochas que caíam do teto e dos jatos de veneno do dragão que ainda tentava alcançá-los, os quatro saíram para o ar livre a tempo e observaram a entrada da caverna fechar atrás deles, enterrando a criatura.


O bar estava animado. Hugar tinha ido entregar o ovo para o contratante e as meninas gastavam o dinheiro que ganhariam com bebidas para relaxar.

— Admite, meu vestido é útil. - Tabitha dava cotoveladas amigáveis em Carina enquanto carregava as cervejas até a mesa.

— Você teve sorte, só isso.

— Eu não teria conseguido pegar o ovo estando de armadura e você sabe!

— Eu não teria pedido pra você pegar o ovo se estivesse de armadura, o plano teria sido diferente.

— Mas os bolsos! Você tem que admitir que é útil!

Elas se sentaram uma de cada lado de Kana. A clériga distribuiu as bebidas e tomou um gole.

— Vamos, Carina, o vestido dela é incrível! Eu quero um pra mim!

— Vai ser difícil achar outro desse. Eu demorei uns cinco anos pra achar esse. - falou Tabitha.

— Ok, ok. Vocês venceram. O seu vestido é bem legal, Tabitha.

— Obrigada, ele tem bolsos!

Obrigada, Ele Tem BolsosOnde histórias criam vida. Descubra agora