09- Entre um beijo e uma desculpa

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Tem vezes que eu adoraria voltar para casa. Abandonar essa faculdade, todas essas coisas e ir correndo para o colo da minha mãe.

Não sei se todos passam por isso ou se meus amigos também enfrentam esse dilema, mas me sinto perdido e aborrecido a maior parte do tempo. Tenho tudo, mas ainda me sinto vazio. Não deveria sentir que estou no caminho certo?

Talvez seja por isso que nunca mais voltei para casa, mesmo nos feriados ou férias. Se eu entrar no meu antigo quarto, sentir o cheiro da comida da minha mãe ou ouvir as músicas flashback do meu pai, sei que, de alguma forma, não vou conseguir sair. Vou querer ficar, como o bom covarde que sou. Não vou largar tudo de novo.

O mundo é cruel demais com nossos sonhos, e mesmo tentando preencher os buracos, me sinto insatisfeito por não ter garantias ou por não saber o que fazer.

Na minha idade, meu pai já era casado. Tinha um emprego que pagava bem, uma mulher grávida e até mesmo um carro. Eles pagavam a casa em que moram hoje e estavam com a vida encaminhada. Quando eu e Pedro éramos crianças, nossos pais conseguiam cuidar das finanças e ainda sobrava dinheiro para viajarmos no Natal. Vê a loucura?

E eu... vamos ver, tenho uma moto que ainda estou pagando, minha faculdade e só. Não tenho uma casa, não tenho uma vida boa. Aliás, é graças a vaquinha coletiva que conseguimos pagar todas nossas contas da república, mas o pouco de dinheiro que sobra é quase impossível de se chegar ao fim do mês. Se não fosse por Alisson, não haveria nenhum luxo, tipo festas ou coisas supérfluas. Graças a ele temos uma ou outra regalia.

Como nossos pais conseguiram passar por isso e se estabilizar? É tão difícil. E eu sou sozinho. Imagina se estivesse casado e com um filho?

Quando guardo grana, algo quebra. Quando termino de pagar, alguma coisa minha dá defeito. Se estou começando a juntar dinheiro, aparece um problema. Não faço ideia de quantas vezes precisei estourar meu cofrinho para emergências. Estou começando a pensar que nem minhas economias me suportam.

— O que tá fazendo, cara? — Fábio pergunta.

— Enchendo a cara com tequila. — Dou um gole, sentindo o gosto do álcool me arrepiar. Meus dentes já estão amortecidos. — Quer?

— O que aconteceu?

— Nada dá certo na minha vida — balbucio as palavras de um jeito enrolado. Não porque estou bêbado, acabei de começar a beber, mas porque se falar, vou chorar. Não quero chorar.

— Você tá deprimido?

Fábio é o amigo sensível. Ele nunca te zoa por nada. Sempre filosofa e fica de boa. O conselheiro furado da turma. Acho que se ele não tivesse esse estilo de punk meio emo, com certeza seria hippie. Posso até imaginá-lo com dreads e aplaudindo o sol.

— Eu não sei ser adulto, meu computador deu pau depois de eu passar quatro horas digitando meu projeto final, não fiz Backup e fiquei puto demais para tentar consertar.

— Vish, cara. Que foda, posso tentar te ajudar...

Fábio entende tanto de computadores quanto eu entendo de biologia.

— Fica tranquilo. Só estou aproveitando o resto do sábado.

— Não vai sair com ninguém hoje? — Estranha. — Encontrar alguém? — Incentiva.

— É tão ruim assim não fazer nada?

Ele ri.

— Não, mas é como se o próprio Freddy Krueger tivesse desistido de matar. É bizarro de ver, mas não tem nada de errado nisso. — Zomba.

[DEGUSTAÇÃO] Entre Stela & TequilaOnde histórias criam vida. Descubra agora