Capítulo I

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Prólogo

Aquela noite, em meio ao monastério, Irmão William dormia. Seu sono não era nada calmo. Já castigado pela idade, ele sentia o peso de seus muitos anos sobre os ossos doloridos e as articulações gastas; seus pulmões também arfavam a cada respiração. No entanto, não era nenhum destes infortúnios que o assolava hoje. Não, sua mente estava longe, aprisionado em território onírico – Irmão William estava sonhando, um sono agitado e inquieto – não um sonho daqueles capazes de levá-lo a paragens relaxantes, mas sim um eco; uma memória do passado. Esta não era a primeira vez que tal memória retornava à mente de William.
Ele estava em um corredor iluminado por uma penumbra; figuras encapuzadas o rodeavam – hoje, poderiam ser confundidos por monges, embora o termo real pelo qual são designados já esteja além do conhecimento.

Eles estão em um templo, ou pelo menos era isso que se entendia, estrelas de Davi e candelabros de doze braços decoravam o lugar; de Sião eles vieram, em frente ao altar eles se postaram; envolvendo todo o altar, havia fogo, fogo ininterrupto, sob as chamas fugazes, estava um sangue seco, outrora humano – se é que a criatura da qual veio podia-se chamar humana – agora reduzido a um fluido negro, inumano, descarnado. Cantos e mantras permeavam o ar expesso – Adonai – eles diziam – Adonai – vergonhosamente pediam perdão; sim, suplicavam, porque aquele sangue era maldito, a expressão máxima do inimigo.

Em resposta, dos céus o fogo veio, e a tudo abrasou, ao fim restava apenas o altar; sobre as pedras, nenhum traço de sangue – os doze ajoelharam-se, prostrados, em agradecimento; William era um deles. O sangue monstruoso fora lavado, e na manhã seguinte, milhões de semitas acordariam sentindo algo diferente. "Nós, que matamos o Filho, agora salvamos o Homem" foi a frase final.

Dito isto, William acordou, os pulmões ardendo em brasas; com dificuldade, sentou-se na cama; não havia medo em sua mente, em seus olhos, já vivera muito – vivera demais – para se curvar diante do medo. Sob a escuridão em meio à chama de velas, William ponderou, um antigo nome, perdido no tempo, lhe veio à cabeça, e este nome era seu. Este sonho não fora o primeiro, nem havia sido o ultimo. Era um presságio.

Há muitas eras, os sábios encerraram aquele mal.
E agora alguém estava tentando trazê-lo de volta ao mundo dos homens.

Capítulo I: Estranho em uma terra estranha¹

Castelo de Dusseldorf, Alemanha, 1941.

O cheiro acre da batalha tomava o ar. Cheiro de carne, e terra voando, cheiro de suor, adrenalina e lágrimas; cheiro de pólvora explodindo dos mosquetes, e atingindo a pele, cheiro de sangue, que jorrava das feridas entreabertas tal qual uma nascente de um forte rio. Bem-vindo à segunda guerra mundial.

Mas aqueles homens não eram soldados normais. Eram aliados, tal qual milhares de heróis que estavam lutando nesse exato momento, mas eram os grandes párias; eram as forças especiais, soldados treinados para lutar em qualquer tipo de terreno; e para suportar condições adversas – se é possível situação mais adversa do que a própria guerra – os soldados "normais" os chamavam de "metidos", para o nazistas, eram apenas simples amerikaners a serem exterminados. Se mais treinados ou não, para eles todos sangravam do mesmo jeito.

- Companhia! – gritou o comandante, Bill Jack James, de Winchester, sua voz apenas um assovio em meio ao turbilhão de balas – recuar! Para as trincheiras! Temos de tomar aquele castelo!

O castelo. Informes do alto comando com ordens diretas de figurões da frente dos aliados relatavam "alta atividade nazista em Dusseldörf"; logo, a unidade Motorhead – como fora apelidada pelos membros, não teve escolha senão desistir de seu merecido descanso e viajar para a região montanhosa – e rochosa – por isso, não era viável enviar soldados rasos para lá. Não. Para essas situações, sempre haviam as forças especiais. Mas aquela fortaleza, aquele monumento encravado na montanha, agora a vinte metros de distância, parecia ter algo de estranho sobre si.

Bandeira de Sangue (versão de degustação)Where stories live. Discover now