That Voice

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A Luz era escassa naquela rua. Apenas alguns carros ali passavam, com uma distância de tempo enorme entre eles. O barulho vindo de alguns dos restaurantes na vizinhança servia de ambiente de fundo. E o cheiro ali já era bastante conhecido. Tabaco, drogas e sexo. Ninguém de perfeita decência ali passaria. Mas para a moça de vinte e dois anos, com cabelos sedosos e castanhos, seu rosto que mais parecia ter sido esculpido por mãos divinas, e roupa que realçava seu belo corpo, era não só um local de passagem, como de trabalho também. Sentada na borda de uma calçada, com um cigarro entre os lábios, contava o dinheiro que havia feito naquela noite. Não fora das melhores noites, mas daria para o gasto. O casaco de cabedal que antes usava, estava agora sob seu ombro. Seu corpo estava mole, precisava de um bom banho e de uma noite de sono digna.

- Hey Cabello - a loira de olhos claros chamou.

Camila ergueu o olhar, deparando-se com uma loira amassada, com uma camisa meio aberta e marcas de batom no rosto. Um sorriso travesso fazia-se presente, tirando qualquer inocência que os seus olhos pudessem criar.

- Parece que te deste bem hoje - Camila resmungou.

- Mais que bem. Cinco clientes! Um deles quis apenas o serviço A. Fiquei meio desiludida, pois era bem bonito, mas o dinheiro pago compensou!

Camila levantou-se, limpando as calças e guardando o dinheiro no bolso. Ignorando Dinah, foi se afastando, caminhando de mão no bolso e cansaco já  amarrado à cintura de forma desajeitada.

- Espera! Vim te chamar para ir à um bar. Devone disse que hoje oferece uma bebida à cada um de nós.

A loira caminhava já lado à lado com a castanha, tagarelando animada. Quando por fim notou que Camila estava mais calada e fechada que de costume, pôs uma mão sob seu ombro.

- A noite foi assim tão má?

- Má? Foi péssima! - falou entre dentes  - Um homem chamou-me e pediu que fizesse o serviço A e B. As coisas foram decorrendo, e a meio desatou a chorar. Foi então que confessou ser casado.

Dinah ficou alguns minutos em silêncio, e em seguida solta uma estridente gargalhada, apertando o ombro da amiga.

- E depois? Pagou ao menos?!

- Dinah, além de loira e burra, és estúpida? Ele é casado! Pagou o que deveria, mas senti-me mal por receber aquele dinheiro, não quero ser uma destruidora de lares. Além disso, sabes que uma das regras do Damon é: nada de homens casados.

Pararam frente ao Devine's Bar. Cabello sentia como se o dinheiro em seu bolso fosse a qualquer segundo incendiar-se, e que a chama iria se alastrar por seu corpo. Era peso demais para ela. Mas ela não tinha culpa, ou teria? O rapaz não esta a usar aliança.

- O Damon não precisa saber. Se eu não vou contar, não há como ele vir a saber. Quanto dinheiro conseguiste afinal?

- Tive apenas este homem como cliente. Então, juntas o serviço A e B, e terás o valor que recebi.

Após algumas contas rápidas, Janne sorriu, dando uma palmada nas costas da amiga, indicando-a que deveriam entrar.

- Essa quantia já dá para os gastos dessa semana.

Entrando no bar, o ambiente era de festa. Algumas pessoas dançavam, e aproveitavam para usar a bebida como desculpa para fazer conquistas. Harry já dançava animado encima de uma mesa, com duas morenas rebolando junto à ele. Este lançou um sorriso provocador às outras duas, que viam a cena enquanto se aproximavam  do balcão onde Josh servia as bebidas.

- Está ali há mais de meia hora. Já deve ter dançado com mais da metade das raparigas - Devine comentou, puxando conversa.

- Contanto que sobre uma ou duas para mim! - Dinah exclamou.

Camila olhou para o rapaz, que apesar de vinte anos, parecia ter acabado de receber o primeiro doce de sua vida. Revirou os olhos. Camila e Dinah tinham uma vida estranha. Para Camila, quando não estava trabalhando, acabava-se o clima de diversão, de engate, e assumia uma postura séria. Já Dinah, continuava animada, barulhenta, e à procura de novas conquistas, embora na faculdade se mantivesse mais calma. Fazia parte do disfarce dela e de Camila.

- Estão aqui vossas bebidas - Diz Devine ao nos servir.

Dinah não olhou duas vezes para o copo, bebendo-o de uma vez só. Já Camila preferiu esperar pela altura certa. Sabia que em algum outro momento a bebida gratuita sairia bem melhor. Janne afastou-se do balcão, dançando enquanto se aproximava da mesa onde Harry dançava, agarrado à uma das morenas.

- Damon esteve aqui mais cedo - Josh murmurou perto do ouvido de Cabello - perguntou por ti.

A castanha olhou por cima do ombro, fitando Josh  pelo canto do olho. Não gostava quando Damon andava por aí perguntando por ela. Normalmente, quando o fazia, significava que haviam problemas para seu lado.

- Deixou recado?

- Oh Cabello, estás tão lixado - ao dizer, chamou a atenção da outra, fazendo-a virar de frente para o balcão - acho que te procurava por causa do irmão dele.

- O que tem o Stefan?

- Seria mais fácil perguntares o que não tem ele. E a resposta seria: tu. Sabes que ele não vai desistir tão facilmente, e o Damon quer sempre agradar o irmão mais novo.

Camila riu, pegando no copo com líquido de cor esverdeada. Levou-o à boca, franzindo o rosto à medida que o copo se envaziava. Era forte, queimava ao passar pela garganta. Josh riu da careta dela.

- Agradar? Damon e Stefan  são incestuosos. Jamais me envolveria com ele novamente. Não quero acabar numa cama com os dois. - passou a língua pelos lábiosao imaginar - ele próprio que agrade o irmão dele.

Devine riu alto, afastando-se do balcão para servir outros clientes. Cabello limitou-se a ficar ali, por o que pareceu muito tempo. Havia muito que lhe ocupasse a cabeça. O trabalho, a faculdade, os pedidos absurdos de Damon, um Stefan persistente.

Ela tinha que admitir que o rapaz era belo. Os seus cabelos castanhos que lhe emolduravam o rosto, elegante, inteligente. Mas, viver sozinho com um irmão como Damon, o fazia esquecer de suas qualidades. Camila e Stefan haviam tido um breve caso, ela não o amara, mas havia tido sentimento ali. E não estava preparada para um dia o encontrar nos braços de outra. Camila não tinha espaço para um drama daqueles em sua vida.

Bebeu o resto da bebida, pousando o copo no balcão, afastando-se dele, se dirigindo à saída. No dia seguinte teria aula, estar acordado às quatro e quarenta e seis a daria umas quatro horas de sono. Deixando o bar, percorreu as ruas pouco movimentadas, pontapeando pedra ou outra que se metia no seu caminho. Pôs a mão no bolso do casaco, tirando um cigarro e isqueiro. Pôs o primeiro entre os lábios e o acendeu. Escutou um pequeno silvo, fazendo-o  virar-se brevemente para trás. Ninguém. Ignorou a sensação de estar sendo perseguida e continuou o seu caminho.

O prédio onde tinha seu pequeno apartamento ficava não muito longe dali. Uns quinze minutos à pé, desde o bar até lá seria o bastante. Cantarolava algo baixo, revendo o que teria que fazer no dia seguinte, as aulas que teria, quando escutou. Não fora alto, não fora muito baixo. À princípio pensara até que havia sido sua mente lhe pregando uma peça por conta da bebida forte. Mas aquela voz não era a sua.

- Camila... - tornou a ouvir a voz rouca e lenta.

Quase pode visualizar a dona da voz. Na verdade, Camila realmente conseguiu visualizar durante breves instantes. Uma moça de cabelos escuros, encaracolados, e uns olhos brilhantes, verde esmeralda. Camila estancou no lugar, olhando ao redor e esfregando o rosto. Não havia ninguém. Mas se fora uma ilusão ou uma peça pregada por sua cabeça, de uma coisa Camila tinha certeza: aquela era a garota com o rosto mais angelical que ela alguma vez vira.

One Dark Heart [Camren]Onde histórias criam vida. Descubra agora