Medrus Hebofn

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   Anderson, o pai da família Dumitresco, estava muito animado naquela tarde. Ele pediu que os três filhos, Andrew, Alexander e Alice, fossem até o quintal da casa e o esperassem. As três crianças se entreolharam desconfiadas até verem sua mãe, Maressa, na sacada.  Apesar de Andrew, o mais velho, ser o mais parecido com ela, Alexander era o único a possuir a mesma tonalidade azul cinzenta dos olhos da mesma. O vento soprando em seus cabelos levemente ruivos, a deixava ainda mais bonita enquanto sorria para os seus pequenos, assustados:

   - Fiquem tranquilos, ele só quer... fazer um pequeno teste. - Mas Andrew pôde notar que, por trás daquele sorriso doce, havia preocupação.

   Anderson apareceu na sacada ao lado da esposa e entregou uma câmera a ela, pedindo para que os gravassem. Logo, ele se juntou ás crianças, passando seu olhar crítico sobre elas. Alice ainda era muito pequena, então ele a manteu distante; depois ele se voltou para os meninos, porém, ele apenas lançou um olhar de desprezo e decepção ao seu primogênito, que o encarava de braços cruzados. Andrew tinha raiva e mágoa misturados em sua face, pois depois de realizar um pequeno teste de habilidades com seu pai, no qual ele havia fracassado, Anderson nunca mais foi o mesmo com o garoto. Ele alegava que o filho mais velho de uma família deveria ser sempre o mais forte, o mais habilidoso, mas como isso não aconteceu em sua família, ele sente vergonha do garoto de dez anos. 

   - Venha Alexander, me dê sua mão. - Chamou Anderson.

   Alexander estava suando, tremendo, pois estava com medo de fracassar como seu irmão e seu pai surtar. Ele olhou para sua mãe, que sussurrou ''Boa sorte, querido.'' e sentiu mais confiança. Pegando na mão de seu pai, o menino de apenas sete anos fechou os olhos e suspirou, ouvindo seu pai dizer que ele deveria explodir todos os pneus do carro deles, estacionado logo adiante. Não é uma tarefa fácil, pois usar as habilidades de Dotado exige muita concentração, esforço físico e mental, principalmente quando se é uma criança. 

   O menino sentiu tudo ao seu redor indo em câmera lenta, os barulhos, os movimentos, tudo estava acontecendo a parte da sua cabeça, enquanto permanecia de olhos fechados. Ele ergueu seu pequeno e franzino braço na direção do carro e começou a imaginar as rodas tremendo, lutando para saírem de seus lugares, para liberarem o ar ali contido. As imagens em sua cabeça eram tão vívidas, que conseguia até imaginar o sorriso de orgulho se esboçando no rosto do pai. Entretanto, o menino começou a tremer freneticamente e a sentir dores extremamente fortes na cabeça. 

   - Continue, Alexander! - Gritava Anderson, fora de sua cabeça - Concentre toda a sua força! - Mas o menino já estava implorando, aos gritos, para que pudesse parar com essa tortura - Eu não admito que você falhe! Mais força, filho, agora!

   Implorando por misericórdia da parte do seu pai, Alexander podia ouvir sua mãe e seus irmãos protestando contra os atos de Anderson. Mas logo tudo se transformou num zunido, quando uma força dilacerante percorreu o corpo do menino e com um grito, ele liberou todo esse poder, essa força concentrada dentro de si. Foi uma explosão tão grande que tudo que ele viu foi branco. Depois disso, o brilho se apagou dos olhos de Alexander. 

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   Alexander acabou de acordar, assustado, suando, na cama do seu quarto, no dormitório masculino B3. Ele passou a mão por seus cabelos espessos que alcançam os ombros e respirou fundo, olhando para seu quarto decorado com as cores preto e vermelho, de forma sombria. Pegou uma xícara de chá da cabeceira da cama e bebeu, tentando se acalmar depois do pesadelo que teve. O pesadelo era o mesmo há anos, a memória de um dos dias mais tristes de sua vida.

   Ele se levantou, foi ao banheiro, tomou um banho quente e vestiu-se com o uniforme formal da escola que são das cores azul-marinho e preto. Depois de ajeitar o cabelo, Alexander pegou sua mochila e celular, para só então notar que eram apenas seis horas da manhã, o que significa que ele tem mais uma hora antes das aulas começarem.

   O rapaz passou pelos corredores cheio de portas para os quartos de seus colegas e pelas escadas do dormitório vazio, para então sentir o frescor do ar gelado que cerca o Internato para Dotados, Medrus Hebofn, localizada em País de Gales, mas existem inúmeras outras escolas específicas para Dotados no mundo todo. A escola é antiga e tem uma estrutura gigantesca, a qual os alunos que acabam de chegar demoram para descobri-la por completo. Os dormitórios são divididos em três blocos: A, B e C, e cada corredor tem um número, assim como cada porta tem um código escolhido pelo próprio aluno. Alexander caminhou para a parte mais afastada da escola, onde só havia plantas de várias espécies. Ele subiu na parte mais alta da sua já muito conhecida, Figueira. Lá é o seu refúgio, onde nenhum outro aluno ficava, a não ser sua melhor amiga, Cassie:

   - Teve algum pesadelo de novo? - perguntou a garota, olhando para cima, com os pés sob as raízes da árvore.

   Cassie Maskov sempre foi sua única e melhor amiga. Ela pertence a uma família também muito respeitada e mente aberta. Loira, pele extremamente clara, olhos azuis que lembram frieza, com piercings no septo, na sobrancelha e na orelha, a garota é a personificação do sarcasmo e da ironia. Mas apesar de ter uma personalidade forte e difícil de lidar, ela sempre foi uma boa amiga para Alexander.

   - É, de novo. - Respondeu o rapaz, dando espaço para a amiga subir.

   - Você deveria parar de pensar tanto nas coisas ruins da sua vida, meu caro - ela se apoiou no ombro dele e se sentou ao seu lado - Sei que é difícil, Alex, mas está na hora de deixar seu irmão ir...

   - O que? - Perguntou o rapaz, confuso - não, não foi com isso que sonhei. Não hoje. Foi só uma memória de quando eu tinha sete anos. 

   - Ah, sei... - Cassie ficou sem jeito, pois esse também é um assunto delicado - pelo menos você está superando a morte do seu irmão, depois de seis anos...

   - Uhum... ele se foi aos catorze anos, eu tinha onze. Se ele estivesse vivo, estaria com vinte anos já. Dá para imaginar? - Alexander olhava nostálgico para o horizonte entre as folhas da árvore.

   - É, dá, mas deixa isso para lá. Estamos vivendo o presente, no qual você tem dezessete anos, eu tenho dezesseis e nós temos que organizar sua festa de aniversário que já está bem perto! - ela puxou um espelho da mochila e começou a retocar sua maquiagem preta.

   - Até parece que eu vou fazer festa. - ele a observou se maquiando - Para com isso ai, vamos voltar.

   Eles desceram da árvore e caminharam em direção às salas de aulas, mas foram interrompidos pelo vice-diretor da escola. Vicent é um homem alto, negro, que assim como todos os outros membros sócios da Diretoria da escola, usa roupas brancas.

   - Senhor Dumitresco, senhorita Maskov, bom dia. - os dois jovens o cumprimentaram - A Diretoria solicita a presença do senhor Alexander Dumitresco na sala da própria Diretoria.

   Alexander e Cassie se entreolharam, mas o rapaz não se importou, pois todos os membros da Diretoria tinham muito apreço por ele, especialmente seu pai, que também é sócio da escola. Ele caminhou para a central da escola ao lado de Vicent, imaginando o que viria a seguir.

O Escolhido das Sombras Where stories live. Discover now