Queria dizer que o peso daquela manhã foi o suficiente para nunca mais cometer tal erro. Mas não foi. Dimitri não sabe e nunca saberá me amar quando está sóbrio. Ele precisa do cair da noite, da garrafa vazia e só então me puxar para perto.
Minhas poucas amigas me questionavam o porquê eu me submetia a esse relacionamento que claramente não me fazia bem. Minha resposta era sempre a mesma... o silêncio.
Haviam milhões de razões para eu deixá-lo, mas tomei a frase "o coração quer o que ele quer" como verdade absoluta por tempo demais. Tudo não passava de uma justificativa esfarrapada para a minha dependência da sua efêmera paixão por mim, a qual trazia conforto ao meu amor verdadeiro e unilateral.
Como faz para colher frutos em terras secas? Nada, pois não há o que fazer. Não existe retorno para aquilo que o fogo incinerou. E foi exatamente baseada nisso que a nossa relação se formou. A terra já estava seca quando entrei na vida de Dimitri, e mesmo me permitindo viver a ilusão de que aquilo daria certo um dia, ao descobrir toda a verdade, a chama da realidade engoliu o que tínhamos.
Eu só precisava aceitar isso.
Devido a isso mesmo que tardio, decidi pôr um fim. Entretanto, sabia que simplesmente terminar olhando cara a cara, não seria o suficiente. Cairemos de novo no ciclo vicioso, perto dele me sinto fraca, com poucas palavras ele consegue me desmontar. Por isso, num ímpeto tomei a decisão mais imprudente que poderia tomar.
Nervosa, esfregando as mãos suadas na calça, ouço batidas na porta. Abri a porta esperando levar um tapa na cara, mas ele não chegou.
- Você é Celina? - questiona a mulher, apesar de linda, possui feições cansadas, olheiras profundas e rugas ao redor dos olhos, mesmo que não aparentava ser alguns anos mais velha que eu.
Fiz que sim, sem entender como ela sabia meu nome.
Não pensei nas consequências dos meus atos ao ligar para a esposa de Dimitri. Tinha alguns cenários em mente, mas fui fortemente surpreendida quando nenhum deles se fez presente.
Eu precisava colocar um basta definitivo em toda essa história, imaginei que essa seria a melhor maneira de fazer isso. Estava prestes a ferir as cutículas dos meus dedos, de tanto roer as unhas, quando ela chegou. Sabia que minha aparência também não era a das melhores, não me preocupei com isso, mantive meu cabelo preso em um coque desconectado e maquiagem borrada. Convidei Nicole para entrar e ofereci uma água, apenas para ganhar tempo, já que não fazia ideia de como iniciar essa conversa. Quando tomei coragem e disse:
- Eu não sei nem por onde começar.
- Eu sei de tudo, - interrompendo-me fitando para além da sacada - sempre soube... você não precisa se explicar.
Estremeci por dentro, ficando em choque com o queixo caído, só consegui perguntar:
- Como?
- Mulher traída sempre sabe, a não ser quando não quer ver.
Involuntariamente concordei com sua afirmação que me atingiu em cheio.
- Eu queria te pedir perdão, mesmo depois de saber que eu era a amante - sorri sem o menor humor - eu ainda assim continuei com ele. Sei que no começo eu não tive culpa, mas perdi toda a razão quando o encontrei outras vezes a partir daquele dia.
- Sinceramente, desde aquela ligação eu penso constantemente em você, Celina... Eu sei que vocês continuaram juntos. Eu melhor do que ninguém sei o quão manipulador o Dimitri pode ser, não queria que mais ninguém passasse por isso.
Dentre todas as reações possíveis, a única que nunca imaginei, de fato aconteceu. Era informação demais para eu processar, minha cabeça girava mas não conseguia entender o que estava acontecendo.
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Sober
RomanceUm conto de fadas moderno, mostrando a vida real com dores e magoas, sem promessa de felicidade duradoura, amor verdadeiro ou finais felizes. "Você não sabe me amar quando está sóbrio."