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PARK

Como ela podia fazer isso com ele? 

Depois de tantos acontecimentos, depois de sua mãe finalmente aceitar Eleanor. Depois de compreenderem, em parte, sua esquisitice. Depois de tudo.

Como ela podia fazer isso com ele?

Ela nem sequer ligou. Nem escrevera nada. Nem um "Olá, mestiço idiota!" num simples pedaço de papel. Park estava mal. Ele realmente estava muito mal.

Park estava deitado no chão do quarto. As fitas quebradas na noite em que Eleanor esteve ali permaneciam no mesmo lugar. Cada caco em seu lugar. Park também estava no mesmo lugar em que estivera naquela noite. Não parava de olhar para o chão onde Eleanor esteve sentada por horas com ele, ali, ouvindo as fitas, se beijando sempre que achavam seguro, uma vez que sua mãe pudesse aparecer e estragar o clima. Naquele tempo, ela nem gostava tanto de Eleanor. Ela nem a entendia... Ninguém a entendia. Aliás, nem mesmo Park, que estava sempre com ela a entendia tão bem assim, porque ela nem contava muito sobre si.

Ele não conseguia parar de pensar em como ela estaria, se estava bem sem ele. Ele temia estar ficando paranoico. 

É claro que ela está bem, caso contrário teria me procurado. Pensava o tempo todo.

Park passara a noite inteira pensando em respostas. Respostas para perguntas como: Porque ela não me ligou? Ela não me responde? Porque não dá um sinal de vida? Ainda está viva? Será que está indo à escola? Será que fez amigos? Será que as pessoas estariam a tratando bem? Será que ela pensa em mim? Por quê?, Por quê?, Por quê? Estava tão exausto que adormecera ali mesmo.

***

- Como está, Park? - disse a mãe, abrindo a porta e parando assim que o viu estirado no chão em meio às fitas e aos quadrinhos que tinham cheiro de baunilha. Cheiro de Eleanor.

- Estou bem - ele disse - vou ficar bem. - suspirou olhando o teto.

- Dormiu no chão de novo?

- É... - ele disse colocando o braço sobre os olhos - Acho que peguei no sono enquanto lia uns quadrinhos.

A mãe de Park sabia que parte era mentira, mas entendia pelo que ele estava passando e não questionou mais.

- Desça - disse saindo do quarto - Cal quer te ver. 

- Subir... - ele disse emborcando - se no chão e  enfiando a cara sobre os braços cruzados. - mande ele subir.

***

ELEANOR

Após inúmeras vezes escrevendo, rasurando, reescrevendo e fazendo das folhas do caderno bolinhas de papel e arremessando no cesto de lixo no canto do seu novo quarto, Eleanor não conseguia mais pensar em nada. Semanas se passaram e ela não saía de "Querido Park...", "Querido mestiço lindo, estou com saudades...", "Meu mestiço favorito...", isso a deixara impaciente, talvez até um pouco irritada. Eleanor escreveu, ou pelo menos tentou escrever uma carta como a que escrevera uma vez na aula de espanhol:

"Estimado Señor Sheridan.

Mi gusta comer su cara.

Besos,

Leonor."

Eleanor riu lembrando do rosto de Park naquele dia, mas logo foi tomada pela angustiante realidade da vida sem ele por perto.

***

E foi deitada de barriga para cima, enquanto uma brisa invadia o ambiente que Eleanor lembrou-se de um dos motivos que a fizera gostar ainda mais de Park. Como a conversa que tiveram por telefone enquanto estava na casa de seu pai.

"- Porque gosta de mim? - perguntou a Park

- Não gosto de você - ele disse - Preciso de você."

Quando lembrou dessa parte da conversa, sorriu feito criança, embora seu rosto estivesse sido tomado por lágrimas que corriam como o Itasca*.

E por mais que Eleanor também precisasse de Park e sentia isso, não sabia o que escrever para ele.

***

Geoff e Susan perceberam a angústia de Eleanor durante toda a semana. Levou alguns meses até que ela falasse sobre Park. Ela falou muito pouco sobre Park. O que eles sabiam basicamente, é que Eleanor sentia muito sua falta e que ele a amava. Ela contou somente o que achava que eles precisavam saber. Contou sobre o primeiro dia no ônibus, sobre os quadrinhos, sobre como ele a defendeu de Tina e do chute que deu no rosto de Steve. Jamais cogitou falar sobre os beijos, sobre o encontro, sobre o Impala ou coisas desse tipo.

Eles acreditavam que Eleanor sentia falta dele porque era grata por tudo que fizera por ela. E ela era. Mas se eles soubessem da história completa, veriam que, na verdade, ela o amava. Ela o amava muito.

***

Eleanor estava deitada no chão do quarto, quando Susan chegou do trabalho com algumas sacolas. Deixou-as na cozinha e retirou um pacote de uma delas e foi até o quarto de Eleanor.

- Acho que deveria ligar para ele - disse ao entrar no quarto de Eleanor com um pacote na mão - Para Park. Se ele é mesmo o seu amigo, você precisa ligar pra ele. 

- Não sei se quero falar com ele - disse - ouvir a sua voz, na verdade. Não sei se aguentaria.

- Compreendo. Pegue. - disse estendendo o pacote para Eleanor

- Obrigada - disse ao pegar o pacote - o que é?

- Abra - disse Susan deixando a só.

Eram dois cadernos novos, alguns envelopes. Dentro de cada envelope, haviam selos e um cartão postal com os mais belos lagos de Minnesota.

-Assim que passou pelo quarto de Eleanor, Susan colocou a cabeça na porta que estava aberta e disse:

- Escreva para ele! - fechou a porta deixando Eleanor só e então foi até a cozinha guardar algumas coisas que comprara num mercado

- Susan! - Gritou de volta 

- Pois não? - disse, voltando ao quarto de Eleanor

- Não sei o que dizer. Escrever

- Escreva o que o seu coração está gritando dentro de você, Eleanor.

- Obrigada.

Susan acabara de dizer um dos maiores clichés da história da humanidade, deixando uma garota confusa com um monte de cartões postais sem saber exatamente o que escrever. No fundo Eleanor sabia o que escrever, o que ela não sabia era como o faria.



*Um dos 10.000 lagos de Minnesota. Localizado no noroeste, com 4,7 km² de extensão.

eleanor & park - O final.Onde histórias criam vida. Descubra agora