CAPÍTULO 1

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- É difícil de explicar... Só sei que eu me sinto assim. – Ela olhou para baixo e juntou as duas mãos no colo. O olhar fixado num grande nada. – Espero que um dia eu pare de me sentir assim.

A Dra. Carmem sorriu e disse:

- Lila, é importante você parar para observar o quê, exatamente, faz você se sentir assim. O que ele faz que te causa isso. – Fez uma breve pausa e prosseguiu, cautelosamente. – E também o que você mesma faz que mantém a situação como está...

Lila olhou para cima, com o olhar pensativo.

- Bom, eu não sei dizer o que é, mas tenho consciência de que parte da responsabilidade é minha também.

Com isso, a Dra. Carmem descruzou as pernas e deslizou para a frente, para a beirada da poltrona, dizendo:

- Então você presta atenção nisso e me conta na próxima semana. Ok?

- Ok. Obrigada.

Sorrindo gentilmente, a Dra. Carmem se levantou e abriu a porta. Lila saiu do consultório com uma sensação pior do que a que entrou. De qualquer forma, sempre soube que era isso o que encontraria na terapia, e por isso demorou tanto tempo para começar. Ela e Dave namoravam há 3 anos, e há 3 anos não se sentia feliz com ele. Porém, ruim com ele, pior sem ele, ela pensava.

Ao chegar à calçada, lembrou-se que tinha decidido não usar o carro naquele dia. Teria uma longa caminhada pela frente, até em casa.

Hoje, percebia como tudo aconteceu tão rápido. Conheceram-se na universidade, em San Francisco, numa festa no campus. Ela estava no último ano da graduação em Letras, e ele, em Odontologia. A festa aconteceu no gramado em frente à reitoria, promovida pelo Diretório Acadêmico da Faculdade de Artes. Fazia frio, e Lila estava sentada próximo à fogueira, em uma roda com seus amigos. Cada um deles segurava um copo descartável com vinho dentro.

- Eu juro que não consigo entender como esse cara pode se achar legal. É o último ano de faculdade, e eu nunca tive um professor tão ruim assim! – Brianna deu um gole no vinho e continuou. – Sério, é impossível ler todas aquelas páginas de uma semana para a outra. Será que ele pensa que a gente não tem mais nada pra fazer? – Ela já estava falando devagar e um pouco embolado. Lila sabia que, em pouco tempo, Bri estaria dançando loucamente com algum cara que acabou de conhecer. Por mais bêbada e descabelada que estivesse, continuava sendo, de longe, a garota mais bonita que Lila já conheceu. Por onde passava, atraía todos os olhares, e facilmente conseguia colocar qualquer homem na palma da sua mão.

- Concordo que ele não tenha muita noção da quantidade de textos pra ler. – Kurt estava deitado de lado na grama, com a cabeça apoiada em uma das mãos. – Mas daí dizer que o cara é o pior professor de todos? Vou ter que discordar de você, Bri. O cara sabe demais! É o maior especialista em literatura francesa que essa universidade já viu. – Kurt olhou para Lila, buscando apoio. – Eu sei que você concorda comigo.

Brianna lançou um olhar fuzilante para Lila, e ficou aguardando o que estava por vir. Lila sorriu sem graça e deu de ombros:

- Desculpe, Bri. Eu também gosto dele. Aprendi mais com o Prof. Brown do que com qualquer outro de literatura francesa. – Bri revirou os olhos e virou de uma só vez o copo de vinho na boca. Lila não era muito boa em decepcionar os amigos, e por isso continuou: – De fato são muitos textos, muitas avaliações e...

- Uou, uou, uou! Acho que é hora de encerrar o assunto "Prof. Brown" e iniciar o assunto "Lila tem um paquera"! – Veronica olhava para o outro lado do gramado, com um sorrisinho sarcástico.

Consigo MesmaWhere stories live. Discover now