Eu não imaginaria que no início daquela primavera conheceria os netos Ló.
Era uma tarde incomum de inverno ao passo que fazia muito calor. Na velha rodoviária da cidade aguardava minha carona para me dirigir a casa de tio Olívio.
As aves pousavam nas árvores e os mosquitos, aos montes, sobrevoavam o longínquo gramado. O ar que soprava vindo da rodovia – na entrada da cidade –, era pesado, carregando cheiro de asfalto e pneus queimados.
Algo me dizia que aquele lugar era diferente. Durante a espera para ser levado, a atmosfera levantava sensações estranhas e sentimentos ocultos. O que seria? Eu não entendia.
Eu, jovem que era, tentava me convencer de que não errei ao ir passar uma temporada naquele lugarejo. Chegar à cidade parecia-me um equívoco, pois não havia motivos que me entusiasmassem em ficar.
Sentado no banco da rodoviária da cidade, com as malas e meus pensamentos, questionei-me sobre estar ali.
Eu tinha uma grande proposta do meu tio adotivo. Mas não descartava que também era sedento de novas experiências e de viver a turbulência da metrópole paulistana, da qual eu tinha saído.
Cair naquele vilarejo não era ideal ou desejável.
– O senhor está esperando alguém? – pediu-me um taxista, que não tinha passageiros.
Eu observei ele com as chaves que balançavam penduradas no cinto, uma mão apontando para o taxi branco e outra segurando um palito de dentes.
– Ninguém que chegará logo – gracejei, desconversando – Parece que é cidade pequena para um taxi, ein?
Eu usava meu chapéu Panamá e nem fiz questão que o taxista reconhecesse minha face. Tirei a carteira de cigarros do bolso da camisa e abri o lacre.
O que eu falei, embora soasse como brincadeira – ele entendeu assim – tinha como intenção faze-lo sair deixando-me olhar o gramado da rodoviária em paz.
Rindo ele sentou ao meu lado e atirou o palito num cinzeiro velho de pedra.
– Também não é cidade que atraia muito jovens – ele debochou.
Depois de ouvir o comentário, cheio de sarcasmo, o sentimento de estar no lugar errado aumentou.
Era um lugar para viver tranquilamente, bonito, cheio de flores e árvores antigas e outras belas paisagens, porém, o vazio que havia no ar trazia sentimentos de angustia.
– E porquê? – eu pedi, lendo as entrelinhas do que ele dizia...
– Não sei, mas há três dias um jovem morreu nesta cidade e tudo parece mais sombrio...
Embora fosse manchete todos os dias nos jornais de São Paulo, de onde eu vinha, imaginei que essa notícia da morte do garoto não era comum aqui. Sem querer espantá-lo por achar aquilo corriqueiro, quis saber mais.
– Morreu, hã? – pedi, arrumando a manga da minha camisa – E como ele morreu?
– Alguém o matou... – ele respondeu, sem coragem, como se tivesse um motivo especial para estar triste por isso – Que diabos pensou o idiota para mata-lo?
– Eu sinto muito... – disparei, tentando terminar a história triste.
Os pássaros, pelo menos aqueles que não iam embora no atípico inverno, pousavam graciosamente nos galhos das cercas-vivas. Ao pousarem, os pássaros subiam e desciam nos ramos finos e flexíveis.
O taxista colocou as mãos cruzadas entre as pernas e olhou ao redor para descobrir o que eu estava pensando ou sentindo. Sem sucesso, ele se recostou no banco e cruzou os braços.
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Os Netos de Ló
Misterio / SuspensoFausto chega na pequena cidade de seu tio adotivo. Entre a morte misteriosa de um jovem e hábitos estranhos dos moradores, ele descobrirá uma seita existente desde os tempos de Sodoma e Gomorra e seus planos sombrios para a humanidade. Livro no Kind...