Cap. 12

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- Acorde menina. - O caçador me chamou, me tirando dos sonhos que me ligavam ao lobo. - Sente-se a mesa. Vou lhe servir algo para comer.

Se virando para o fogão no canto da parede, ele comessou a remexer um caldeirão. Me levantei da cama de palha e andei até a cadeira que ele puxou pra mim em frente a mesa antes de voltar a sua função.

- Por que você me sequestrou? O que quer de mim? - Eu tinha muitas perguntas a fazer.

- Fique calada, menina.

- Eu quero saber. - Insisti. - Não entendo porque sempre muda de assunto quando te questiono.

- Quando chegar a hora saberá. Agora se cale. - Me calar? Como se isso fosse responder às as minhas perguntas. - Sabe menina, eu tive uma filha. Ela era assim, como você, curiosa, impaciente e corajosa. Sempre se metia onde não era chamada, e então, ela morreu.

- Eu sinto muito - falei com um fiasco de voz tentando imaginar o motivo de ele me prender no meio do nada.

- Dizem que você escolhe o seu destino. Não se deixe enganar, criança. O destino é traçado quando você escolhe de qual lado está, do bem ou do mal. Não importa o que você faça, ele sempre vai te levar aonde ele quer que você esteja.

- E em qual lado estás? - Naonpude me calar.

- Não estou de lado nenhum. Eu apenas quero me vingar. Durante anos venho lutando, mas sempre acontece algum imprevisto. - Ele se virou e andou até mim para pegar algo. - Logo após a morte de minha filha, prometi lhe vingar. Desde então, venho acompanhando os que se apaixonam e não podem viver o amor por causa de um casamento arranjado. Sempre tento unir os apaixonados, mas o destino é traiçoeiro. Se a noiva morre, o noivo também morre.

- Não entendo. Você diz querer vingança e não estar de lado nenhum. Mas tenta unir os apaixonados? Por que?

Ele pegou uma cumbuca e levou até o caldeirão. A encheu de sopa e me trouxe de volta. O silêncio tomou conta do ambiente e eu não soube o que dizer. Comi a sopa de legumes que me foi oferecida e voltei pra cama tentando entender sua lógica. Não esperava mais que ele me respondesse, quando me surpreendeu.

- Eu não tenho a idade que aparento. Acredito já ter se passado mais de um século que luto contra o destino e busco vingança pela minha filha. Já perdi a noção do tempo. Não fosse as poções para me manter com a vitalidade de um jovem, não conseguiria...

- O que aconteceu com sua filha?

- Minha querida Zélia se apaixonou. Ela foi recusada porque ele já estava noivo e era um homem de palavras. Dizem que ele era apaixonado pela noiva, mas não acredito. Ao ser recusada, Zélia, lançou um feitiço no homem por quem se apaixonou, em plena luz do dia, não se preocupando em revelar sua identidade. A identidade de sua mãe e irmãos. Não a culpo. Os moradores da vila, ao ver o ato de minha filha, já desconfiados por tamanha beleza que ela tinha, se revoltaram com tais palavras profanadas contra uma família que era tão querida pela vizinhança, e assim ataram fogo em minha casa, matando toda minha família, acusando nos de bruxaria. Dizem até hoje que ela conseguiu escapar, pois só foram encontrados três corpos que pertenciam ao seus pais e irmão caçula. Mas não é de tudo verdade. Naquele dia eu consegui fugir levando comigo o livro de feitiços da família. Infelizmente não consegui salvar meus filhos e esposa.

Eu queria lhe dizer alguma coisa. Mas não havia nada que eu pudesse dizer que lhe confortasse o coração. Me restava o silêncio para ouvi-lo, mesmo estando abismada com tamanha revelação. Era muita crueldade não se importar com os sentimentos do homem por quem se apaixonou e mais crueldade ainda lhe lançar um feitiço amaldiçoando os seus familiares e descendentes. Mas não cabia aos moradores lhe sentenciar. Eram cruéis. Todos os envolvidos.

- Estavamos no fim do século XVII. Carl e Diena se casaram na primeira lua nova. Estavam felizes, todos os membros das duas famílias que agora se uniam estava comemorando o enlace, juntos aos amigos e vizinhos mais próximos, até que a surpresa: todos se transformaram em lobos. Eu os assisti de longe. O medo, a angústia. Tudo em um só olhar. Com medo da reação de desconhecidos, e temendo terem suas vidas arrancadas a força, assim como a de minha família fora, decidiram buscar abrigo em meio a floresta, longe da Vila de Leaff, longe de Asareu, longe de tudo que pudessem lhes causar mal. Mas se esqueceram que havia um sobrevivente. Durante todos esses anos eu tramei. Sempre disposto a impedir a felicidade dos que sacrificaram minha filha. Mas em todas as tentativas falhei. O último casal foi a quase cinquenta anos. A noiva ao descobrir que o noivo era apaixonado por sua melhor amiga, pulou de um penhasco. Não demorou para que ele também morresse. Todos morrem no final. Não tem um fim pra isso. E bastou que eu lhe contasse e é a levasse até a mulher apaixonada.

🐺

- Emille, olhe adiante. Não é Johan? - Charlotte perguntou correndo a minha frente.

Despois de um dia inteiro correndo pela floresta, finalmente o encontramos. Johan estava dormindo quando nos aproximamos. Ao nos sentir, ele se alarmou e levantou em um só pulo.

- Emille? Como me encontrou aqui? - Ele estava cada vez mais pálido e parecia usar toda a força que lhe restava para se manter de pé.

- Te conheço tão bem quanto tu mesmo se conhece. Te lembras de quando era pequeno e fugia pra cá? Eu te vi uma das vezes que fugiu e adentraste na cachoeira. Era óbvio que estaria aqui.

- Eu sei onde ela está. - Falou mudando o assunto. - Ela está aqui. Ela me mostrou.

- Entoa nos leve até ela. - Charlotte se pronunciou.

Johan nos guiou o quanto pôde. Fraco, não conseguiu caminhar mais do que um quilômetro, desmaiando próximo a uma cabana.

- Johan! Johan, acorde! Meu irmão.

- Deixe o descansar. - Charlotte falou após medir sua pulsação. - Logo que ele recuperar as energias voltará a nos guiar. - Charlotte falou se sentando ao lado de meu irmão. Me juntei a eles e observei o orizonte. Aquela floresta era diferente da que havia do lado de fora da gruta. As árvores eram cheias e tinham um tom de verde mais claro. As águas de um rio que passava próximo a cabana era cristalina. Não havia pássaros ou outros animais ali. Parecia feito de magia. Um espelho.

Cansada, eu e Charlotte acabamos cochilando e não vimos a hora passar. Já estava amanhecendo quando acordamos. Johan ainda dormia.

- Vamos deixa-lo aqui e procurar por ela. A cabana parede um bom lugar para se esconder. - Falei me levantando.

Enquanto seguiamos até a cabana, meus pensamentos se voltavam para meu pai, Herry e Querin. A essa altura deviam estar nos procurando, mas desconhecendo a cachoeira, não nos encontrariam.

Infelizmente a cabana estava vazia e não havia nenhum sinal que nos dissesse que Lucinda havia estado ali. Não tínhamos outra escolha se não voltar.


- Deve haver outras cabanas por aqui. Vamos acordar Johan para ir conosco.

 Apaixonada Pelo Lobo (CONCLUÍDO)Onde histórias criam vida. Descubra agora