Notas

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Eu realmente não sei quanto tempo eu
irei durar, mas escreverei isso, para caso o momento em que eu tire minha vida chegue sem eu notar.

Com certeza será em um dia por um impulso, por um comando aleatório de minha mente doentia. "Pegue uma faca na cozinha. Passe no pescoço e será rápido. Vai doer, mas vai passar. Nada mais dói do que você sente agora." Essa frase apita à qualquer momento em meu cérebro, dia e noite, como um pisca-pisca que sempre surpreende-te ao acender suas luzes brilhantes.

Suicídio, para mim, não seria algo doloroso, já que nada dói mais que as brigas que presencio em minha residência todos os dias. Mesas, pratos e copos quebrados pela raiva já não me assustam mais, somente fazem com que meu coração quebre-se pouco a pouco também.

Nada dói mais que os comentários cruéis e maldosos mascarados pela "simpatia" que ouço todos os dias de minha vida: "você é fofa!", "Seus ossos são largos", "não se sinta mal, é genética".

A depressão rasteja como uma serpente, esgueirando-se pelos cantos, levando-me pouco a pouco. Os sorrisos, as brincadeiras e as piadas são uma máscara que a depressão é ótima em fazer. Concordâncias em perguntas do tipo "você está bem?" fazem parte do meu dia-a-dia, mesmo que isso seja feito no piloto automático e não passe de uma mentira descarada.

Sempre amei comida: doces, salgados e até mesmo saladas sempre estiveram em meu coração. Mas a anorexia veio sorrateiramente até mim, levando tudo que é prezado pelo ser humano: meu peso, o prazer sentido ao comer, a saúde...

Comer, para mim, tornou-se algo feito somente para ter a precaução de não desmaiar e ser enviada para o hospital, onde tomaria mil calorias de soro. O prazer agora não é mais encontrado ao sentir o doce chocolate em encontro à minha língua, e sim ao ver os números da balança abaixando cada vez mais, ao sentir o estômago contorcendo e implorando por algum alimento e sentir as tonturas de fome. Sentir-me morta de fome a cada segundo tornou-se meu prazer.

Fotos de modelos magras e de garotas da internet com seus ossos à mostra possuem uma pasta especial em meu celular, juntamente com as dietas de no máximo cem calorias por dia e exercícios que queimam várias calorias por repetição.

Minha querida anorexia veio acompanhada de sua amiga, bulimia, que aos poucos, também dominou minha vida.  Noites em claro praticando exercícios e horas no banheiro purgando a pouca comida que passara pelos meus lábios tornaram-se parte de minha dolorosa rotina.

Rio comigo mesma ao segurar a faca, em meus últimos segundos de vida, com a decisão já feita, mesmo sabendo que no final, serei reconhecida como egoísta.

A depressão não mata, muito menos a anorexia e bulimia. O que mata, direi-lhes agora, encerrando essa nota e passando a gélida lâmina em meu pescoço e, em poucos segundos, esperar todo o sangue esvair-se de meu frágil corpo: O que mata, meus caros amigos, é o ser humano.

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Acho que esse texto é um dos mais pessoais. Eu escrevi ele quando eu estava em uma crise de pânico e acabei por escrever o que estava pensando. A maioria dos textos que eu estou postando recentemente são do ano passado, então já posso dizer que minha saúde mental melhorou muito desde aquele tempo para cá, embora não esteja 100% boa.

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• Espero que tenham gostado :) •

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