Mal estacionei o carro, já em casa, apressei-me a ir buscar as malas ao porta bagagens e entrar em casa. Tentei subir as escadas a correr, mas falhei nessa missão. O tamanho das malas não me possibilitou usar a minha rapidez a subir aquelas escadas que eu tão bem conhecia.
- Já chegaste? - ouvi o meu pai da sala.
- Já - respondi alto o suficiente para que ele me ouvisse.
- E não vens comer?
- Eu já comi - subi o último degrau com a segunda mala pela mão e entrei no quarto, fechando a porta atrás de mim.
Atirei as duas malas para cima da cama e abri-as. Eram, de facto, muito grandes. Não tive outra opção senão escolher das maiores que vendiam, visto que tenho demasiada roupa. Às vezes pergunto-me como é que arranjo espaço para arrumar tudo aquilo que compro.
Dirigi-me ao armário e agarrei em todos os cabides que couberam entre os meus braços, retirando-os do varão que os segurava.
Enquanto dobrava e arrumava cada peça de roupa dentro das duas grandes malas, os meus pensamentos viajam para fora do meu quarto, levando-me a questionar se ir embora seria o mais correto. Se era aquilo que eu realmente queria e precisava.
Fui interrompida pela minha porta bater e um grito feminino e estridente atrás de mim. Mãe.
- Theresa? O que é isto? - perguntou-me alto o suficiente para me fazer pular para trás com o susto.
- Eu... eu vou embora, mãe - disse devagar, quase num sussurro.
- Como assim? Sem falares comigo e com o teu pai primeiro?
- Da última vez que confirmei, já era maior de idade - a frieza nas minhas palavras era evidente - Por isso, sim, eu vou embora. Não precisam de se preocupar.
- Para onde? Quando é que tomaste esta decisão?
- Londres.
- Para a cidade? Oh Ther... - interrompi-a.
- Sim, mãe, para a cidade. Está tudo tratado - menti.
A sua expressão era indecifrável. Não sabia dizer se era de espanto, felicidade, tristeza, deceção. Talvez fossem todos ao mesmo tempo.
A minha mãe continuava a olhar-me, enquanto os meus olhos passeavam por todo o quarto, tentando não a encarar. Os seus olhos castanhos não descolavam dos meus. Estaria ela a tentar memorizá-los?
- Mãe? - tentei acordá-la do seu transe - eu tenho de continuar a arrumar.
- Já falaste com o teu pai? - por fim piscou os olhos e voltou o seu olhar para um dos cantos do quarto.
- Ainda não.
- Está bem - murmurou e apressou-se a sair do quarto.
Devo dizer que nunca antes tinha visto a minha mãe tão apática, sem uma resposta rápida nos lábios. Julgo tê-la apanhado demasiado de surpresa. Ninguém estava preparado para a minha "iluminação fantástica de uma noite" de sair de casa e ir para a cidade, incluindo eu.
Respirei fundo e continuei a arrumar tudo aquilo que conseguia colocar nas malas. À medida que ficavam mais cheias, o meu nervosismo aumentava. Mais tarde, ou mais cedo, iria ter de contar ao meu pai que iria embora e eu não estava de todo ansiosa por esse momento. A partir do minuto em que lhe contasse já não havia como voltar atrás e eu sabia disso.
Gostava que os meus pais me apoiassem nas minhas decisões. Afinal de contas, eu sou a sua filha, deveriam querer o melhor para mim e, mais importante ainda, a minha felicidade. Porque não podiam simplesmente ficar felizes pelas minhas escolhas? Fossem elas acertadas, ou não. Mas não seria diferente desta vez, apesar de eu no fundo desejar que fosse. "Não vai ser", acrescentou o meu subconsciente.
Mal acabei de fechar as malas, sentei-me na beira da cama a ganhar coragem para descer aqueles degraus que eu tão bem conhecia para contar ao meu pai que tinha decidido ir para Londres. Eu não sei o porquê desta decisão, eu não tenho propriamente dinheiro, ou alojamento, mas eu não aguentava ficar em Lavenham mais um único dia. Sentir que não pertenço a um sítio é desgastante, e eu sinto que não pertenço ali, embora tivesse sido o local onde eu tinha crescido e vivido toda a minha vida. Talvez Londres acabe por não ser tudo aquilo que eu procuro, mas eu preciso de experimentar. Experimentar outro ambiente, ver outras pessoas, conhecer outros lugares. No fundo eu só quero sair daqui.
Inspirei fundo, estava na hora. Empurrei o meu corpo para fora do quarto e fui ao encontro de ambos os meus pais.
- Pai! Mãe! - chamei por eles - Temos de falar!
Estava na hora. Era irreversível, eu ia destruir a união quase escassa que restava na nossa família e eu tinha noção disso.
- Diz - a voz grossa e grave do meu pai atrás de mim fez-me estremecer.
Rodei o meu corpo de modo a encarar a sua face desprovida de quaisquer sentimentos.
- Diz - repetiu.
- Vamos sentar-nos - encaminhei-nos para a mesa de jantar e sentei-me propositadamente à sua frente.
- Já me podes dizer o queres?
- Podemos esperar pela mãe?
- Não precisas, podes dizer-me e depois falas com ela.
- Eu prefiro falar com os dois ao mesmo tempo.
- Theresa, tu estás a fazer-me gastar tempo, se tens alguma coisa para me dizer, diz. E se não for importante, podes dizer depois.
- É importante! - num ato involuntário cerrei o punho e bati contra a mesa de madeira clara que nos separava - eu já sei que não o vais aceitar e não estou à espera que alguma vez o faças - pausei, tentando acalmar-me - eu vou embora.
- Embora? Embora para onde, filha?
- Para a cidade.
E naquele momento, podia jurar que o meu pai tinha vontade de dar a maior e mais audível gargalhada. O seu olhar capaz de me ridicularizar ainda mais não desaparecia. Eu só queria desaparecer.
- Jane, já ouviste isto? - berrou pela minha mãe enquanto se ria.
- O quê? - ouvi-a perguntar a meio do corredor que dividia a sala e a cozinha.
- Então não é que a tua filha quer ir para a cidade? - gargalhava.
Eu estava escandalizada. Talvez mais ainda que os meus pais. Eu imaginei mil e um cenários possíveis, desde que me ignorassem até me fecharem dentro do quarto, mas nunca julguei que se rissem da minha decisão e que a ridicularizassem desta maneira.
- Eu quero e vou - impus-me.
Os risos pararam e ambos me olhavam sérios e sem uma única esperança em mim. Que raio de família era aquela?
- Com que dinheiro, Tess? E onde vais viver? - perguntou-me o meu pai.
- Está tudo tratado - voltei a mentir, tal como tinha feito com a minha mãe.
O meu pai simplesmente se levantou da cadeira, deixando-me sozinha naquela mesa. A minha mãe voltou para a cozinha e eu continuei ali. Estática, sem controlo no meu corpo. Estava presa dentro da minha pele e não havia maneira de me libertar.
Ali passei longos segundos sem me conseguir mover um único centímetro, até voltar a sentir os meus músculos e ficar apta para me levantar e correr para o meu quarto.
Sentei-me em frente à secretária branca, debruçando-me sobre ela de modo a poder deitar a minha cabeça sobre os meus braços. Acabei por adormecer.
E não sei quantos meses depois, aqui está ele, o 3º capítulo. Tenho imensas ideias para esta fic e mal posso esperar por começar a escrever o drama todo que me passa pela cabeça!
Much love! x
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Not About Angels
FanficTheresa, uma mera inglesa de 18 anos sem qualquer visão de futuro, em que pouco na sua vida lhe interessa, está prestes a cometer o maior erro da sua vida. Toda a sua vida muda quando decide sair da vila de Lavenham e deixar tudo e todos que conhece...