deux

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- ouçam a música enquanto leem -

Rosie não aguentava mais ver a sua mãe daquela forma, deitada na cama sem se puder mexer muito à vontade. Logo ela que sempre fora uma senhora extrovertida. Rosie questionava-se o que havia feito de mal, numa outra vida, para merecer ver toda a gente a afastar-se dela assim, desta forma tão fria e dolorosa. Outro medo seu era ver toda a gente ir embora e ter de aguentar com toda a pressão dos ombros sozinha.

- Querida, vai apanhar ar. Não tens que estar comigo o tempo todo.

Rosie negou com a cabeça mas a insistência e a preocupação da mãe fizeram-na abandonar o quarto de hospital. As paredes brancas, já a apostar num tom de cinza, entristeciam a pequena rapariga de cabelo encaracolado. Rosie era uma boa aluna, sempre o fora aliás, e desde sempre tivera muito talento. Devido a isso, os seus familiares costumavam-na chamar de 'estrelinha dourada' e, no fundo, era isso mesmo que Rosie ambicionava ser: uma pequena estrela. Mas, como tudo existente, também as estrelas acabam por morrer, independentemente do seu brilho, cor ou tamanho. Tudo na vida acaba, nada dura para sempre.

Rosie caminhava sozinha pelo hospital. Através das grandes janelas do corredor, podia observar inúmeras crianças deitadas na cama e, estranhamente, todas elas sorriam.

Corajosas crianças, pensava a menina para si mesma.

As suas mãos macias passavam nas paredes imperfeitas do hospital. Rosie queria ar fresco, queria ver a luz do dia. Cansada desta prisão atormentadora, desejava a finalização do seu pesadelo. Ela, unicamente, ambicionava espairecer as ideias que estavam enclausuradas dentro deste edifício, assim como ela e a sua mãe.

Todos os dias o seu pai lhe ligava para questionar como estava tudo a correr. Questionava como estava a mulher doente que tanto amava pois, devido ao seu emprego, ele não podia, de todo, vir visitá-la. Na verdade, era pelo facto de começar tão cedo a trabalhar e de acabar tão tarde que condicionava muito as suas visitas visto que o hospital deontológico tem um horário fixo para visitas e, segundo afirmaram, não podem abrir exceção. Apenas um familiar podia passar os seus dias com o doente e essa pessoa era Rosie.

Contudo, o seu pai não podia fazer nada em relação a isso visto que todo o dinheiro era preciso. Os tratamentos não se pagavam sozinhos e cada vez a conta ia ficando mais pesada, ainda que houvesse uma pequena ajuda proveniente do estado. Era de pasmar a força que a menina dos caracóis tinha por não chorar sequer em frente ao seu pai. Ela sabia que aquele homem também se sentia fragilizado com a notícia visto que a mesma ainda chocava o seu coração.

Rosie caminha até à parte de trás do hospital mas acaba por se desiludir ao ver que pouco ou nada havia naquele espaço. Não era como nos filmes onde se via uma vista incrível e onde as personagens principais davam um passeio ao fim da tarde. A única coisa que ocupava a área era o estacionamento onde já nem era possível ver muito bem o tracejado branco no chão alcatroado. Os seus olhos esbugalham-se ao ver alguns homens e algumas mulheres, de batas brancas, com cigarros na mão e a gargalharem no que parecia uma conversa bastante alegre.

Que mau aspeto, pensava Rosie achando-os uns hipócritas. Após tantos avisos aos doentes, apelando-os a não fumarem, ali estavam eles a contrariar as suas palavras com os seus atos.

- Hipocrisia, não concordas?

Um rapaz a seu lado comentou com o olhar colocado nos carros ali parados. Rosie olhou para ele por breves segundos e voltou a colocar o olhar no que se encontrava à sua frente. Assente com a cabeça, respondendo à sua pergunta sem precisar sequer de recorrer às palavras.

Rosie ainda não havia falado com ninguém para além dos seus pais e sentia-se um pouco desconfortável em o fazer. Ela não compreendia o porquê de se sentir dessa forma. Apenas achava que tinha que aproveitar todos os segundos com quem a amava e não desviar as atenções do que realmente importava; a felicidade dos seus pais.

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