Órbita.

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Eu... estou planejando me suicidar hoje.

Escrevia atentamente seu nome. Elisa Seabury. Era a última vez que planejava fazer aquilo, escrever o sobrenome da família de seu pai que a enchia de repulsa.

Será depois que eu terminar por aqui.

Olhou o relógio, vendo que faltava poucos minutos para o encerramento.

Na verdade, eu nem sei por que eu me esforcei tanto essa última semana para fazer essa prova, não irá servir de nada mesmo...

O tempo finalmente acaba e um homem começa a recolher as folhas. Todos saiem, e Elisa caminha até o ponto de ônibus.

E se eu passasse? Eu estaria tomando a vaga de alguém se eu vivesse... Bem, acho melhor não atrapalhar a oportunidade dos outros.

Assim que o ônibus para, Elisa paga sua passagem e dorme durante o caminho de volta.

Seu último chochilo. Em um banco de ônibus. Que privilegiada.

Nem fazia menção de se incomodar com as senhoras que conversavam mais alto que o considerável. Porém, não havia problema, logo mais ela dormiria para sempre e não precisaria se preocupar com elas ou com o motorista que não sabia passar por quebras-molas mais altos.

Só desperta quando uma garota praticamente se joga no banco ao lado, com uma expressão emburrada. Ela era linda, com seus cabelos negros e olhos azuis como o oceano. Por que alguém tão provida de beleza teclava em seu celular como se seu mundo estivesse desmoronando?

Elisa olhou janela afora e um garoto estava com um olhar preocupado em sua direção. Sendo mais exata, ele encarava a jovem enfurecida.

Talvez eles fossem melhores amigos, ou até mesmo namorados. Sendo o que fosse, parecia que o que tinha sido construído ali havia acabado.

Sem perceber, seus lábios se curvaram minimamente para cima. Era uma briga adolescente, há quanto não presenciava tal?

Ajeitou seu cachecol, desaparecendo o sorriso ao notar que seus anos do colegial haviam terminado e que agora, olhando para trás, ela viu que foi mal aproveitado.

Eu podia ter feito mais.

Ela nunca mais sentiria aquelas mesmas emoções novamente.

Para que viver num mundo se nada te diverte?

[♧]

Assim que destranca a porta, o vazio de sua casa lhe dá as boas-vindas e Elisa suspira.

Põem as chaves sobre a mesa, abre uma gaveta do criado-mudo e deixa as notas de suicídio sobre a estante na sala.

Apenas faz questão de dar uma última boa olhada na casa que estava vivendo há dois anos. Aquela casa parecia mais alegre no verão, mas o dia estava nublado há uma semana.

Nem o tempo estava colaborando para que ela vivesse.

[♧]

Estava pronta. Eram cerca de três da madruga do dia 21 de agosto. Não havia ninguém além dos solitários àquela hora acordados.

Não sabia se havia feito bem ao escolher uma das pontes principais da cidade, mas ainda assim podia imaginar o noticiário pela manhã: Mulher se joga de ponte ao perceber que a vida é uma merda fodida.

E se talvez, na verdade, a morte fosse algo bom? Bem, devia ser, ninguém jamais voltou de lá, e Elisa queria provar do mesmo veneno naquela noite.

Mas era assim mesmo. A morte. Ninguém sabe o que vem depois dela. Só porque ninguém retorna quer dizer que é algo que devemos temer? Não.

Para Elisa, a morte significava uma redenção, uma limpa em todo o seu histórico. E ainda assim, achava-a tão graciosa.

Seus pés cambalearam perigosamente para a beirada. Um xingamento escapou de seus lábios, não podia ignorar o fato que se jogasse dali, com certeza não teria chance nenhuma de sobreviver.

Medonho, mesmo esse sendo seu objetivo.

Seu celular começou a vibrar constantemente em seu bolso, nem lembrava do porquê de tê-lo trago. Talvez fosse para faciliar quando encontrassem seu corpo.

Olhou o visor, não era nenhum número salvo e também não era nenhum número de cobrança ou ofertas que conhecesse. Então, quem poderia ser?

Sem pensar muito, atendeu. Talvez fosse só um trote de adolescentes com muita falta do que fazer ou algo assim.

- Alô? - disse a outra linha. - Elisa Seabury?

Okay, conheciam ela. Qualquer merda que fosse, ela com certeza não estava afim de saber.

De todos os momentos, horas, dias, por que aquele? Será que, depois de tantos anos, aquilo era finalmente um mensagem de Deus?

Talvez ela devesse mudar de idéia e ligar para uma estação de tratamento? Nah.

- Sim, sou eu. Quem é?

- Boa noite, sra. Seabury. Eu sou o policial Khan, e vim perguntar se a senhora conhece esse número.

Porra, não.

- Não, não conheço.

- Então a senhora não conhece Stanley Samuel Fooster?

Deus, antes tivesse sido só um trote.

Pensou um pouco antes de responder, não via aquele bastardo há tanto tempo e era quase como se fosse um desconhecido. Por que precisaria dela agora? Afinal, de todas as noites, esta era para ser especial.

- Sim, eu conheço. Me desculpe, mas o que aconteceu?

- Ele agrediu um morador de rua e está aqui na delegacia KF. Precisamos que alguém busque ele.

- Ah... claro. Estou indo.

- Hã... sra. Seabury?

- Sim?

- Desculpe incomodá-la à esta hora da madrugada. Tenho certeza que a senhora não merecia isso.

- Ah, sem problemas.

Ótimo, mais uma madrugada onde tem seus planos arruinados, não tão diferente do colegial.

Mas eram pessoas como o oficial Khan que faziam o mundo valer a porra da pena, mas era uma pena que ela não estava nem um pouco afim de viver.

Uma ótima noite vivendo consigo mesma.

(*****)

Não se esqueça de votar e tudo mais, isso me anima muito para dar continuidade a história. <3




















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