Floresta azul- Live like warrior

Prólogo -Abandono

   Acho que quando se está perto do fim você começa a pensar no início.

No início tudo costumava ser azul. O que mudou exatamente? Só havia uma regra: Não ande pela floresta sozinho!
Um Sayreh nunca fica para trás. E foi aí que falhamos.

Perdemos a identidade, passamos sozinhos por tempestades devastadoras que saíram arrastando todas as flores que plantamos juntos em nossos corações e no fim tudo se resumiu a nada e o que era azul agora é cinza. A floresta, o céu e por alguma razão desconhecida os meus olhos também.

  – Você está bem? –Senti uma mão delicada tocar meu ombro com cautela. –Está a quase dez minutos encarando este espelho sem nem piscar.

  – O que é estar bem? –Respondi sua pergunta com amargura na voz. –Eu já me esqueci o que é isso.

  –Angy, já faz um ano. Podemos fazer um tributo, algo para nos lembrarmos e algo para convencer o seu coração que acabou!  –Ela segurou meu rosto com as duas mãos e eu encarei hesitante seus olhos extremamente penetrantes. Um castanho muito claro e belo. – Não há mais nada a fazer. Lucy se foi! Jeen e Deyman também! Estão mortos...Não há o que fazer quanto a isso.

Eu vinha ouvindo estas mesmas palavras a meses e ainda me cortava o coração. Talvez por que não estivesse totalmente convencida.

  –Você não entende...Estou ligada a ela. Eu consigo sentir,mesmo que muito pouco e a energia seja muito fraca. Eu consigo sentir. – Meus olhos marejaram levemente. Chorar já era um hábito diário. – Eu não vou desistir de encontrá-los!

  –Foram sugados por Ordep! Não tem volta! –Apertou mais suas mãos em meu rosto.

  –Catness para! – Empurrei seu corpo para longe de mim e virei de volta para o espelho. –Só...Por favor! Para!

Vi o reflexo de sua expressão endurecer. Seus olhos felinos, ela estava vestindo o ódio, continuei a fitando pelo espelho. Parecia querer avançar em mim,mas não o fez. Ao invés de rosnar e tentar me ferir ela apenas respirou fundo e retomou o ar neutro e sua postura de sempre. Agora eu podia ver tristeza e talvez um pouco de mágoa em sua íris. Ela não iria me machucar... Não mais.

  –Eu só peço que não fique tanto tempo na frente deste espelho. Tem gente lá em baixo que precisa de você.– Falou com a voz trêmula. – Clarisse, Diara, Allan...Eu.

  Não respondi nada. Desviei o olhar dela para fitar meu próprio reflexo, alguns segundos depois a porta do quarto bateu com força atrás de mim. Sozinha novamente.  Olhar para mim era como ver a decadência humanizada ou quase. Tinha o fantasma de um rosto feliz ali...Olhos azuis, bochechas levemente coradas, um sorriso, cabelos loiros com volume e ondulações lindas, essa não era mais Angelina Sayreh. Olhos cinzentos, rosto pálido, bolsas quase negras em baixo dos olhos e cabelos presos para trás.
Não era só eu,mas a floresta também parecia morta.
Novamente meu foco mudou e eu encarei uma foto velha pendurada ali no espelho. Eu e Lucy, na minha festa de dezesseis anos, vestidos de baile, pulseiras combinando, sorrisos abertos e felizes. Eu aprendi com a vida que não se pode voltar no tempo. Ou então filhos podem nascer diferentes, casais estarem trocados e talvez uma morte ou duas,mas eu ainda podia ve-los.

  –Mostre-me a última vez que eu os vi...–Meu reflexo se embaçou e logo formou-se uma imagem.

Era noite, um escritório organizado, Nedim sentado em sua poltrona e eu a sua frente o encarando com ansiedade e curiosidade. Ele me fitou por vários minutos como se escolhesse cuidadosamente todas as palavras,mas sem conseguir conter acabou por dizer tudo de uma vez.

  –Eu vou morrer...

Arregalei os olhos e franzi o cenho recuando. Abri a boca incrédula algumas vezes até exclamar: