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ATENÇÃO: Este capítulo da história pode conter algumas partes potencialmente sensíveis, se não se sente confortável, por favor não leia!

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Minhas pálpebras pesavam enquanto eu inalava o cheiro forte que o sangue possui. Joguei a gilete preguiçosamente no chão, para fora da banheira na qual eu estava imersa, onde a água transparente agora ganhava um tom mais avermelhado. Fechei meus olhos e senti meu pulso arder quando o coloquei dentro da água e prendi minha respiração, mergulhando por completo na banheira.

Após longos instantes, voltei à superfície e encarei o corte vertical de mais ou menos cinco centímetros que eu havia acabado de fazer, e então decidi me levantar. Andei sem pressa até a pia, ouvindo os pingos de sangue caírem sobre o chão do banheiro minúsculo, para então encarar minha feição cansada naquele espelho sujo.

Peguei um pouco de gaze e pressionei contra a ferida, pensando no por quê de eu ainda não ter acabado com tudo de uma vez, por quê eu ainda prolongava essa porcaria? Amarrei forte sobre o ferimento e fui até quarto em busca de uma roupa qualquer, xingando nomes horrendos enquanto ouvia as mesmas crianças pestinhas brincarem e baterem na porta do meu apartamento apenas para me estressar, assim como todos os dias.

Após estar vestida com uma calça moletom, uma blusa branca e uma jaqueta grossa e escura para não ter que sentir aquele frio infernal que Paris possui, abri a porta furiosa, mirando no grupo de crianças saindo correndo.

"Tu ferais mieux de courir, petits imbéciles!" **
"É melhor correrem mesmo seus pestinhas!"**

Revirei meus olhos e enfiei minha mão no bolso da minha calça, retirando de lá um maço de cigarros e meu isqueiro. Coloquei o cigarro entre os dentes e o acendi, dando nele uma profunda tragada, sem cerimônias. Fechei os olhos, aproveitando a sensação reconfortante de sentir meu peito se esquentar no meio daquela atmosfera gelada da velha França.

Olhei para frente, especificamente para o café caro que ficava à frente do 'immeuble' (cortiço) no qual eu morava. Aquele lugar era apenas frequentado por senhores barrigudos que fumavam charutos caros importados que se juntavam apenas para conversar sobre política e arte, como se realmente soubessem de algo sobre a velha arte. Arte é algo tão admirável que não deve ser debatida, mas sim admirada e contemplada.

Meus olhos percorreram o nome cintilante do café 'La Paix' que preenchia a vidraria do estabelecimento e pararam quando alcançaram dois olhos castanhos-claro. Olhos que me analisavam curiosos por sinal. Uma jovem e bela moça estava sentada do lado de dentro do café e me encarava com um olhar curioso, um olhar de uma criança quando nunca viu algo parecido antes. A encarei por alguns instantes, parecia ter em torno de dezoito anos, ela tinha cabelos lisos e castanhos, uma pele não muito branca e olhos bem puxados.'Un asiatique, avec une certitude totale'**, pensei.

'Uma asiática, com total certeza'**

Dei de ombros e desviei meu olhar do da moça, encarando a rua de pedras na qual eu morava. Encaixei o cigarro entre meu dedo indicador e anelar, e dei uma longa e profunda tragada no cigarro, logo o tirando da boca. Soltei a fumaça na névoa fria e comecei a caminhar, em passos lentos, até chegar na praça do próximo quarteirão.

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