trois

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Com uma camisa verde de mangas compridas em meu ombro, fui até a sala e peguei o controle que estava jogado no sofá. Liguei a televisão portátil no canal Chérie 25 para assistir o programa matinal que todo verdadeiro francês assiste assim que acorda, Comment ça va bien!. Naquele dia despertei mais cedo do que o de costume e após vestir minha camisa, me joguei no sofá velho, sem planos para sair de lá tão cedo.

Fiquei em torno de meia hora na mesma posição, ouvindo com atenção as notícias sobre a capital, até que ouvi o som de batidas na porta ressoarem pela sala. Me sentei no sofá e diminuí o volume da televisão, ouvindo as batidas leves outra vez para ter certeza de que alguém estava na porta. Ninguém batia na minha porta, muito menos naquele horário da manhã.

Me levantei e fui em direção à portinha velha de madeira, sem me importar em vestir uma calça, já que eu estava apenas de camisa e calcinha. Abri a porta devagar e me surpreendi ao encontrar Jennie em pé na calçada. Olhei para a menina da cabeça aos pés sem me importar se estaria sendo invasiva demais com o seu corpo. Suas pernas finas estavam comprimidas em uma calça jeans preta, acompanhado de um suéter branco de mangas compridas e um par de tênis impecavelmente brancos. Seus fios, que brilhavam nos raios de sol da manhã, estavam amarrados em um coque frouxo no topo de sua cabeça. Me permiti observar cada detalhe, assim como sempre faço quando a vejo.

Olhei para o seu rosto e tive que segurar o riso quando notei seus olhos desviarem vergonhosamente da parte íntima do meu corpo. Sorri pequeno antes de falar. "Olá Jennie."

Ela não olhou para mim, ainda parecia envergonhada com a situação. "Oi Lisa."

"Quer entrar?" perguntei abrindo mais a porta, insinuando que ela entrasse.

A garota fez um esforço e olhou para o meu rosto. "Ah... acho que esperarei aqui fora."

"Não, entre. Meu apartamento é ridiculamente pequeno, mas não quero que morra de frio aí fora. Entre." eu disse sincera. A garota parecia querer retrucar, mas acabou se convencendo.

Ela passou por mim e foi entrando devagar, sem olhar muito para os detalhes. Andei atrás dela, e desviei para o quarto, tratando de vestir uma calça moletom azul. Assim que terminei, voltei para a sala e encontrei Jennie sentada no sofá assistindo o programa que eu assistia antes. "Então, essa é a toca na qual eu vivo."

Ela desviou seu olhar para mim e notei seu alívio quando me viu completamente vestida. Me peguei pensando se Jennie não era hétero, apenas por curiosidade, mas logo afastei meus pensamentos. Ela com certeza tinha algum namorado engomadinho e riquinho, assim como ela.

"Não é tão ruim assim." ela respondeu e eu me sentei ao seu lado. Não deixei passar despercebido quando ela se afastou lentamente de mim no sofá.

"Não precisa ter medo de mim." eu disse e a encarei por alguns instantes, mas logo me virei para a TV.

"Na verdade, não tenho. Mas é que você não deve gostar de muita aproximação, e nem coisas do tipo." ela disse coçando sua nuca em um movimento adorável.

"Está certa." respondi e sem me desviar da tela da televisão, me arrastei para perto dela no sofá. "Mas quando eu me sentir desconfortável, eu mesma afasto."

Vi quando ela assentiu de leve com a cabeça e voltou a olhar para a televisão. Senti meu estômago se remexer e um barulho mais alto do que eu gostaria ressoou da minha barriga, indicando o tamanho da minha fome. Jennie olhou para mim. "Não comeu ainda?" ela perguntou curiosa.

Neguei com a cabeça e me levantei do sofá, ficando em pé do lado dele. "Não estou com fome."

"Não é o que parece." ela sorriu de leve e eu andei em direção ao único quarto que tinha no apartamento, me jogando no colchão no chão e a deixando sozinha na sala. Estranhei o silêncio, mas após alguns minutos, Jennie apareceu na porta do cômodo. "Não tem nada na geladeira além de cerveja. Vamos sair para comer algo."

Olhei pra a menina, e neguei com a cabeça.

"Anda, vamos." ela insistiu e eu neguei outra vez.

"Já disse que não estou com fome, Jennie. Não insista." respondi e me virei para o lado contrário na cama. Não demorou muito para que eu sentisse o movimento no colchão e notei que ela havia sentado ao meu lado. "Vamos comer anda, eu pago." sua voz suave estava mais baixa e melodiosa que antes, como se estivesse empenhada a me convencer.

"De jeito nenhum comerei às suas custas, me escutou?" respondi sem me virar para ela.

"Certo, mas e se me fizer um favor em troca?" ela perguntou.

"Não Jennie, é melhor ir embora." respondi seca, com os olhos fechados. Ouvi o silêncio por alguns segundos.

"Não me peça para ir embora, por favor." ela pediu e sua voz parecia realmente triste. Me virei em sua direção e seus olhos estavam baixos. Me sentei no colchão lentamente e cruzei minhas pernas.

"Jennie, por quê está em uma casa desconhecida, conversando com uma estranha?" perguntei fitando seus olhos claros.

"Eu não faço isso... digo, entrar na casa de estranhos." ela disse. "Você não me parece má pessoa."

Sorri com sua frase e levantei do colchão, e estendi minhas mãos para que ela as segurasse e se levantasse também. As mãos macias de Jennie logo entraram em contato com as minhas e eu a puxei para cima. "Não deveria fazer isso. Você é uma garota linda, e se eu fosse uma aproveitadora?"

Ela sorriu. "Mas não é." ela respondeu e eu pude admirar seu rosto bem de perto. "E sobre a minha proposta, o que acha?"

Balancei minha cabeça em negativo e andei para fora do quarto, sendo seguida por Jennie. "Você não desiste fácil, não é?"

"Não." ela respondeu com convicção. "Eu te levo para comer e você faz algo por mim em troca."

Me virei para a garota e coloquei minhas mãos nos bolsos da calça. "E o que você quer?"

"Já que você mora aqui há dez anos, presumo que conheça bem a cidade." ela concluiu e pegou um casaco que estava no meu cabideiro na sala. Ela me entregou ele e eu o segurei. "Portanto, queria que tirasse o dia para me mostrar os pontos mais legais de Paris. Se você não tiver compromissos, é claro."

Semicerrei meus olhos e sorri de canto para ela. "E quem garante a você que eu vou aceitar isso?"

"Aceite." ela pediu. "Você não tem cara de quem se diverte com frequência e podemos nos divertir hoje. E até nos conhecer melhor." ela disse e parecia animada com a própria ideia. "Você topa?"

Vacilei um pouco, antes de assentir e conduzir a jovem garota em direção à porta. "Tudo bem, vamos fazer isso de uma vez."

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