Asfixia [Creek][PT-BR]

Repouso

 O silêncio inquietante da sapataria dos Donovans foi rompido apenas quando Craig Tucker sugou pelo largo canudo o milkshake de morango que tinha em seu copo, dando tempo para que Clyde associasse tudo o que dissera-o minutos antes. Não era comum do moreno visitar o amigo enquanto esse ajudava no comércio da família - sendo quase tão raro quanto o garoto ajudar o pai em alguma coisa -, mas pequenas circunstâncias motivaram-no a fazê-lo, tendo ido vê-lo logo que sua detenção acabara.

Seu namorado, Tweek, havia visualizado suas mensagens há três horas, depois de sair do seu carro como um verdadeiro tornado e, por birra ou protesto, decidira ignorar qualquer tentativa feita de estabelecer um diálogo entre os dois. Craig, claro, tinha noção que parecia um tanto possessivo e paranoico por preocupar-se com um vácuo do loiro desse jeito, mas depois de seis anos de namoro, tinha orgulho em dizer que conhecia o garoto com quem saia bem o suficiente para saber que ser evitado nunca era um bom sinal.

Enquanto o semblante de quase indiferença tomava o rosto do Tucker, que frequentemente voltava a olhar as mensagens no celular, apenas para se certificar se o Tweek voltava a aparecer online sem respondê-lo, Clyde Donovan não parecia compartilhar dos mesmos sentimentos de certeza sobre as próprias ações. Era notável a sensação de quase desespero que tomava o garoto atrás do balcão, encarando o amigo sentado em um dos puffs da sapataria na esperança que ele reconsiderasse o que estava dizendo.

- Você não precisa contar a ele.. - Insistiu Clyde, mordendo os próprios lábios, ansioso.

- Eu preciso. Tweek quer que eu me desculpe com o David, você precisava vê-lo.. Ele estava furioso.

- Mas Craig.. - Clyde respirou fundo, tentando pensar em em quais argumentos poderiam fazê-lo reconsiderar. - Você realmente não precisa.. Quero dizer, desde quando o Craig Tucker pede desculpas?

Por mais que tentasse demonstrar confiança, o filho do sapateiro nunca foi alguém que poderia ser chamado de corajoso, sendo pior ainda quando sentia que alguma das suas fraquezas estavam prestes a ser expostas. Craig era o seu melhor amigo, inclusive encobriu-o nesse último incidente, ficando em detenção para salvá-lo de uma situação no mínimo constrangedora, mas agora por uma crise qualquer do namorado, ele parecia um tanto indisposto em continuar com essa história, querendo assumir para a vítima os detalhes do que ocorrera.

- Desde que o meu namorado surta toda vez que eu não consigo agir do jeito que ele quer - respondeu o Craig, não vendo sentido nessa discussão. Já havia tomado essa decisão, Clyde devia ser grato por no mínimo comunicá-lo com antecedência sobre.

Não se incomodava em ter de ficar depois da aula ou se tornar alvo do ódio do David, seu único problema era ver o Tweek agindo impulsivamente, colocando-se em risco sempre que sentia não ter controle das coisas ao seu redor. Expectativas e ressentimentos sempre foram uma ameaça em sua relação, pior ainda quando essas ameaçavam a segurança da única pessoa que realmente amava.

Se tivessem tido o mínimo de sorte, teriam tacado a bolsa de colostomia no armário de alguém que não fosse amigo próximo do rapaz, mas agora que já acontecera, o mínimo que podia fazer era expôr a situação e esperar que o latino comunicasse devidamente ao seu lourinho, deixando-o com a sensação de que tudo estava sob controle novamente. Depois de ser perdoado, esperava que o namorado voltasse a responder suas mensagens e todo o incidente fosse esquecido. Sobre o caso do Clyde, bastava torcer para que o David não espalhasse pra todos o problema dele.

- Eu posso conversar com ele.. Fazer o Tweek entender - sugeriu Clyde, tentando encontrar uma solução boa para os dois. Se convencesse o Tweek a deixar o assunto morrer, todos saiam ganhando, não?