Silêncio

671 68 31
                                    

Aquele dia havia sido tão longo que teve a impressão que estava cativo em um daqueles desagradáveis lapsos temporais que uma das crianças do bairro criava em sua infância, sempre alterando as regras do jogo para garantir a própria vitória. Por sorte, depois de horas na rua, Tweek finalmente havia retornado para casa, sentando-se em sua cama depois de um longo e prazeroso banho quente.

Antes que pudesse esticar sua mão e buscar o celular no criado-mudo, sentindo-se mais corajoso de responder seu namorado, voltou a olhar o corte em mãos, já tendo deixado em sua cama tudo o que usaria para criar um novo curativo. As sensações confusas de dor e conforto que sentira mais cedo ainda marcavam sua memória, sem entender como um simples machucado havia sido capaz de tirá-lo de uma de suas crises e devolvê-lo a consciência de seus próprios atos.

Com um receio tímido, deixou que seus lábios tocassem mais uma vez o machucado, mordiscando-o de leve e tendo apenas uma ardência incomoda como recompensa. Agora, com a mente clara, a dor parecia apenas dor, mas quando precisou, ela tomou uma forma diferente, não? Ganhando clareza e recuperando a sanidade sem que as alucinações e euforia viessem como efeito colateral à alguma super dose de medicamento.

Um suspiro longo fez com que abandonasse de vez essas reflexões, tentando efetuar seus primeiros socorros enquanto recapitulava em seu celular as últimas mensagens do Craig. Permitiu que seus lábios se curvassem em um sorriso quando uma nova mensagem do moreno chegou, pedindo mais uma vez perdão por ter sido babaca, tanto com Tweek quanto com o David. Havia deixado-o preocupado, não era? Talvez o exagero tivesse sido seu, amava-o demais, não devia ter sido tão duro quando ouviu as justificativas dele. Podia explicar sozinho ao David tudo o que havia ocorrido, esclarecendo os motivos que fizeram com que Craig tacasse merda no armário dele, não tinham porque culpá-lo por querer ajudar um amigo.

"Craig, eu exagerei, me desculpe também", mandou para ele após cuidar de sua mão.

"Querido, amanhã você verá que tudo voltará a ser perfeito, eu prometo", veio como resposta.

Do outro lado, o Tucker sentia um enorme peso sair de seus ombros ao ver que o seu namorado havia parado de ignorá-lo. Conversaria com o David e se explicaria pelo incidente, depois agradeceria ao seu amado por ajudá-lo à reconhecer o erro, e as coisas finalmente voltariam ao seu estado normal.

O temor inicial de que de algum jeito, por falhas de comunicação, Tweek acabasse tendo alguma crise de ansiedade e perdesse sua tranquilidade, passava a se extinguir. Não podiam deixar que coisas idiotas e problemas de terceiros abalassem o que tinham, o seu loirinho era a melhor coisa que tinha em sua vida, manter o que construíram seria sempre a sua prioridade.

X

No momento que Tweek abriu a porta de casa, na manhã seguinte, teve um impulso inicial de fechá-la um instante depois, batendo-a com força na cara bolachuda e sorridente que o aguardava. O filho dos donos da cafeteria não era como a maioria dos adolescentes birretos que faziam cara feia ao acordarem cedo, considerando-se até mesmo simpático logo cedo, mas a descrença do que vira fez com que reagisse no automático.

Poucos segundos depois, quando tomara consciência do que houve, abriu a porta mais uma vez, observando Clyde parado em sua soleira, confuso com sua atuação instantes antes. O garoto baixo e gordinho trazia, além de sua mochila nas costas, um enorme buquê de rosas e uma pequena caixa de chocolates, esperando que os mimos servissem como agentes para influenciar o outro rapaz.

- Bom dia, Tweek - cumprimentou-o com simpatia, estendendo para ele suas ofertas de paz. - Rosas e chocolates para o melhor namorado do mundo.

- Nós não somos namorados, Clyde - afirmou Tweek, ainda sem a mínima ideia do que o melhor amigo do Craig queria, mas de imediato, sentindo-se inclinado à rejeitá-lo.

Asfixia [Creek][PT-BR]Where stories live. Discover now