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era nítido.

ela me disse que não gostaria de sofrer novamente
revelou que todas as flores ganhas murcharam
lentamente
e pediu aos céus para amar alguém capaz de fazê-las nascer dentro de si
ao invés de obrigá-la a vê-las morrer

um dia, dentre desabafos silenciosos, cecília não se conteve e abriu a boca para levantar suas hipóteses sobre o que era viver:
falou que a gente é folha solta
daquelas que nascem e saem da árvore durante sua devida estação.
depois afirmou que a vida se assemelhava a uma montanha prestes a ser escalada
e quando vi já era possível criar um livro
com todas as suas metáforas
algumas mais engraçadas e outras com mais sentido

após entregá-la um vaso – casa para girassol perto de crescer –
cecília disse que a importância era essa:
ver outra vida acontecer ali
bem em frente aos seus olhos
podendo estudá-la ou apenas cuidar do ciclo
que estava por vir.
ela se considerava bicho do mato:
teve sua infância jogada ao vento
e banhada pelo mar – aquele que conhece tanto.
se olhava no espelho e enxergava um passarinho:
tudo queria e tudo podia ter
seja aqui ou seja n'outro canto
seja na cabeça ou com o corpo todo
seja ao lado de alguém ou seja só consigo.

cecília carregava certa paixão pelo mundo e outras coisas a mais no olhar
entre os lábios desenhados
e movimentos aparentemente calculados.
como era possível alguém fitar o nada
sendo capaz de ver o tudo?

de certa forma, a questão se aplicava a você
em relação a mim.
gostava das minhas atitudes
elogiava minhas falas
sendo que nada tinha aqui – pelo menos
nunca descobri algo
bom o suficiente

até encontrar você

que seguia a regra de que
quanto menos se procura, maior a chance de achar

                           então quando te achei
corri o risco de me encontrar também

             sem sucesso

por sempre ver a sua imagem
                                   refletida a minha

mas, olhe ,
você era passarinho

cecília-te.Onde histórias criam vida. Descubra agora