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Nina, olha! — disse Sandy, cutucando minhas costelas.

Olhei para cima na direção da tela AV esperando ver a última tendência "volta às aulas" para adolescentes de dezesseis anos.

— Não, olha ali! — Sandy puxou meu braço, chamando minha atenção para a porta.

Quatro garotos se aproximavam de nós caminhando com jeito malandro pelo trem em movimento. Eles se sentaram do outro lado do corredor e rapidamente se juntaram num círculo. O som baixo das palavras ininteligíveis era acompanhado por bufadas agressivas que aumentavam no grupo deles. 

— Eles têm dezoito anos — cochichou ela. — Aposto que é aquele no meio o que está fazendo aniversário. Ele é gatinho! — e moveu-se, inquieta, no banco.

A propósito, ele ficava admirando a tatuagem no próprio pulso e passava o dedo no band-aid  atrás da orelha onde tinha estado seu GPS, e aí eu soube que ela estava certa. Toquei inconscientemente meu próprio rastreador. A bolinha minúscula do tamanho de um grão embaixo da minha pele quase não era sentida pela ponta do meu dedo. Como seria poder ir a algum lugar onde você não é rastreado?

Antes que meus pensamentos ficassem mais distantes, Sandy disse:

— Eles estão indo para a cidade comemorar. Eu queria...

— Não, você não queria — meu estômago se revirou só de pensar em festas de dezoito anos. — Nós já ouvimos falar delas, especialmente aquela em que houve o incidente com Angel. — Rapidamente, bloqueei as imagens da minha mente.

Sandy bufou se recostando no banco com os braços cruzados sobre o peito. — Aquelas histórias não devem ser verdadeiras. Os caras não iam fazer coisas como aquelas. Quero dizer, olha para eles... — ela se inclinou na minha direção, com ar conspiratório, e a vi olhando para os garotos através da franja. — Um garoto tão fofo como aquele jamais faria esse tipo de coisa. Preste atenção... — ela ficou mexendo dentro da bolsa e me entregou uma caneta. — Você que teve todas aquelas aulas de arte. Desenha a tatuagem, está bem? — e colocou o pulso na minha frente.

  — Sandy!— empurrei a mão dela para longe.— Podemos ser presas!

Um dos garotos, não o aniversariante, deve ter nos ouvidos, pois ergueu o olhar. Ele encarou Sandy da mesma maneira que já vi o padrasto dela olhá-la quando pensa que ninguém está observando. Eu agarrei o pulso dela e o ergui na direção dele para mostrar que não havia a tatuagem XVI obrigatória. Ele encolheu os ombros e voltou-se para os amigos.

— Ei!— ela afastou o braço para longe de mim.— Ele ia vir conversar comigo.

  — Não é conversa o que ele quer, Sandy. Aquelas histórias não são todas inventadas. Ginnie disse que desde quando começaram a fazer as tatuagens, vinte anos atrás, as meninas não estão mais seguras. Ela acha que...

  — Ela é sua mãe. O que mais você esperava?

— Não sei— encolhi os ombros, desistindo. Sandy estava tão envolvida com tudo que estava relacionado aos dezesseis que não havia diálogo com ela. A mãe dela e a minha pertenciam a galáxias diferentes no que dizia respeito a qualquer coisa que pudesse existir. Sra. Eskew não só permitia como incentivava a conduta sexual típica dos dezesseis da Sandy. Ela estava até a preparando para o CeFFem.  Minha mãe, Ginnie, pelo contrário, estava fazendo tudo o que podia para me manter afastada do programa, mesmo sendo a única saída do status da categoria dois. Quando tentei falar sobre isso, ela me disse para não me preocupar, que eu não seria da categoria baixa para sempre. Mas também nunca me disse como eu evoluiria. Não é que eu desejasse fazer parte do CeFFem, mas, além do casamento com alguém que pertencesse a uma categoria superior, eu não tinhas muitas opções.

A inocência termina aos XVIWhere stories live. Discover now