Mabs. Mabs. Mabs.
Acordo com o som familiar de alguém gritando meu nome. Não seria novidade, afinal, aqui em casa isso acontece com uma frequência quase perturbadora, já que minha família é numerosa e todos, sem exceção, têm uma cópia da chave da minha casa.
Mabelle O'Shea, ou simplesmente Mab, com seus recém-completados 23 anos, já deveria estar acostumada a isso. Não moro mais com meus pais há alguns anos, mas parece que eles ainda não conseguiram se desprender completamente de mim. Eles acham que, enquanto puderem aparecer e dar uma espiadinha, está tudo bem. O problema é que "espiadinhas" não acontecem só uma vez ou outra. E esse hábito familiar frequentemente termina em manhãs como essa, onde sou acordada bruscamente.
Eu sou a caçula de cinco irmãos e, acredite, isso não me dá muita privacidade. O sono pesado, herdado do meu avô, só é abalado por uma coisa: os gritos da minha mãe.
"Mabelle, minha filha, você vai se atrasar!" – A voz estridente de minha mãe, dona Anstey, reverbera pelo meu apartamento. Reviro os olhos e me cubro com o cobertor.
Meus pais, Anstey e Arwel, têm uma necessidade constante de me lembrar das responsabilidades, como se eu ainda fosse uma criança. Para eles, sempre existe uma grande chance de que eu vá me atrasar para qualquer compromisso, então acabam me acordando muito mais cedo do que o necessário.
"Benzinho, levante, por favor. Temos que ir ao aeroporto e a Nadia está na sala te esperando", a voz calma do meu pai é quase um alívio comparada à de minha mãe.
Droga. Como pude esquecer isso?
Nadia, minha sobrinha de cinco anos, filha do meu irmão mais velho, foi deixada com meus pais enquanto ele e minha cunhada aproveitam a segunda lua de mel. Como minha mãe está exausta e meu pai planejou visitar meu avô na Irlanda, fui designada a cuidar da pequena por dois dias até que a viagem dos meus irmãos termine. Eu até gosto de crianças, principalmente da Nadia, mas isso de ser acordada tão cedo... é outra história.
"Mabelle, você está acordada? Mab!" – Minha mãe está impaciente. Seus olhos, de um azul bebê idêntico ao meu, me fuzilam de uma forma que só ela sabe fazer.
"Mãe, já disse que meu nome é Mab, esse é o nome da vovó", murmuro, enquanto me levanto e me arrasto até o banheiro.
Olhando no espelho enquanto escovo os dentes, reflito sobre a minha frustração. Não é só o ato de ser acordada que me incomoda. É o sentimento de que, aos 23 anos, ainda sou tratada como uma adolescente incapaz de cuidar de si. Recentemente perdi o emprego, mas não significa que perdi a capacidade de viver minha própria vida. Sinto falta de quando Gael morava aqui perto. Ele, ao contrário dos meus pais, sabia exatamente como me acordar de uma forma que eu não ficava irritada.
Gael e eu éramos vizinhos e amigos desde sempre. Depois de oito anos de amizade, ele finalmente encontrou a maneira perfeita de me acordar: pelo aroma. No meu aniversário de 21 anos, Gael decidiu me surpreender fazendo cupcakes. Ele planejava entrar no meu quarto cantando "Parabéns" com um pequeno bolo na mão, mas a surpresa falhou. Não porque eu acordei com o som, mas porque o cheiro da baunilha que vinha da sacada me despertou antes.
Imediatamente, fui até sua casa e o encontrei de samba-canção, decorando os cupcakes com glacê preto e velas amarelas. Sua expressão de choque foi impagável, e eu ri. Rir logo pela manhã não era comum para mim. Mas naquele dia, a risada foi tão espontânea e genuína que ficou marcada na memória. Desde então, Gael passou a me acordar todos os dias com o cheiro de alguma delícia feita por ele: pães caseiros, tortas, biscoitos, brigadeiros. Que saudade dele.
Infelizmente, minhas habilidades culinárias são limitadas. Agora, a única coisa que me acorda é o aroma de pão que vem da panificadora programada para funcionar todas as manhãs.
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la vie en black
عاطفيةPara Mab nada é pior que ver seu amigo sofrer pela falta de uma família, ela não consegue entender a profunda dor que ele carrega e entende menos ainda a necessidade ardente dele por gerar um filho mas a amizade cultivada por longos e lentos anos cr...