la vie en black

Capítulo 2 - Late

Enquanto Gael ainda a segurava, as lembranças invadiram a mente de Mab, levando-a de volta aos primeiros dias de sua amizade. Ela tinha apenas 13 anos quando conheceu Gael, que acabara de completar 18. Tudo começou de maneira tão simples, quase cômica. Era o aniversário dele, e seus pais acabaram discutindo em um café por causa de um muffin. Mesmo assim, aquele incidente desajeitado deu início a uma amizade que cresceria ao longo dos anos, tornando-se uma das conexões mais importantes da vida de ambos.

Mab, naquela época, era apenas uma adolescente tímida e desajeitada. Seus cabelos ruivos estavam sempre bagunçados, e ela se sentia uma estranha em seu próprio corpo. Gael, por outro lado, era confiante, já um homem aos olhos dela, embora fosse apenas cinco anos mais velho. Ele parecia sempre estar um passo à frente, com aquele sorriso despreocupado e uma aura de segurança que fazia Mab sentir-se protegida e inspirada. Eles criaram uma amizade forte, com risadas, histórias compartilhadas e longos dias de conversas sobre tudo e nada. Gael era o tipo de pessoa que podia transformar qualquer momento ordinário em algo especial.

Quando Gael se mudou para o exterior, o vazio que ele deixou na vida de Mab foi maior do que ela poderia imaginar. A presença constante dele havia se tornado uma âncora, uma espécie de porto seguro para sua adolescente mente inquieta. Durante aqueles anos de juventude, Mab se apoiou nas memórias de seus momentos juntos, nas conversas pelo telefone e, mais tarde, nas redes sociais. A distância física entre eles aumentou a importância dessa amizade em sua vida, mas ao mesmo tempo a fez perceber algo que ela ainda não tinha coragem de admitir.

Nos últimos meses, a vida de Mab tomou rumos inesperados, ela perdeu o emprego de forma abrupta e com isso, percebeu que precisava se reinventar e finalmente descobrir o que desejava da vida.

Ela começou a postar fotos nas redes sociais, algo que nunca fizera muito antes. Não eram fotos comuns — eram mais ousadas, diferentes do que ela costumava compartilhar. Eram selfies em que ela se permitia mostrar um lado mais confiante, exibindo roupas que realçavam seu corpo, sorrisos provocantes, poses que revelavam uma nova versão de si mesma. Mab estava se redescobrindo, tentando se sentir confortável em sua própria pele, e de certa forma, queria que Gael visse essa transformação. Queria que ele soubesse que, de alguma forma, ele fez parte disso. Ela sabia que ele estava acompanhando suas postagens, porque sempre deixava um comentário ou uma curtida, mas nunca dizia nada diretamente sobre as fotos.

Foi durante esse período que Mab começou a desconfiar que o que sentia por Gael não era apenas amizade. As longas conversas que compartilhavam, os olhares e sorrisos de compreensão, tudo isso agora parecia carregar outro peso. Será que ele sentia falta dela da mesma maneira que ela sentia falta dele? Mab se pegava pensando nisso frequentemente, e cada vez que ela publicava uma nova foto, uma pequena parte dela esperava por uma reação de Gael que fosse além do habitual. Mas havia decidido não perder a amizade dele jamais, e por isso tentava fugir desses pensamentos. Não queria arriscar perder a conexão mais valiosa de sua vida, mesmo que o que ela sentisse fosse mais do que amizade.

Agora, com Gael de volta em sua vida, fisicamente na sua frente depois de tanto tempo, Mab não sabia como agir. O que as fotos permitiam, o distanciamento seguro e a liberdade de se reinventar, agora pareciam inadequados diante dele. Ele sempre a viu de uma maneira especial, mas agora, com as circunstâncias mudadas e com a vulnerabilidade à flor da pele por conta do emprego perdido, Mab se sentia exposta de uma forma que não esperava.

Gael também estava diferente. Ele sempre fora um homem decidido, mas havia algo mais intenso em seu olhar. Talvez fossem os anos vividos longe, ou as experiências que ele acumulara em sua vida no exterior. De qualquer forma, o Gael que estava ali agora parecia mais maduro, e isso a deixava ainda mais inquieta.

Depois de alguns minutos, eles se separaram, e Mab foi até a cozinha preparar o café, tentando acalmar os nervos. Enquanto colocava a água para ferver, Gael a seguiu, encostando-se à porta. O silêncio entre eles era confortável, mas ao mesmo tempo carregado de expectativas. Mab se perguntava se ele estava percebendo o quanto ela estava tentando manter a compostura. Cada movimento que ela fazia parecia carregado de um significado maior do que deveria, como se o peso do passado e do presente estivessem colidindo no pequeno espaço daquela cozinha.