O pedido

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...
Durante as aulas eu só conseguia pensar nela. Aquela criatura tinha que ser estudada, mas estudada por mim, de preferência. Acho que eu estava começando a gostar dela, o que prova que talvez eu não seja tão diferente dela, eu devo ser retardado também
Enfim
Passei a aula com a mente longe da sala, e eu nem estava pensando em como eu vou morrer e ser esquecido nesse emaranhado de pessoas insignificantes que passaram pela Terra pois pela primeira vez eu não me importava com nada disso.
Eu tinha algo melhor para pensar agora.
Quando o alarme tocou, eu acho que nunca me senti tão feliz, sabe, é tão bom saber que tem alguém esperando por você. Alguém que, assim como você, deve estar contando os minutos pra te ver. Ágata talvez seja a melhor coisa que aconteceu comigo nos últimos anos
Assim que cheguei em casa, vi dois tênis femininos. Espera, tênis? O que será que ela estava aprontando agora…
Subi as escadas e fui pro meu quarto e ela estava lendo meu diário. Sim, um diário, você não precisa falar o quanto isso é ridículo
- Você tem um diário, isso é fofo! - ela disse, enquanto lia
- Me devolve isso! - eu estendi a mão pra ela me entregar
- O que é esse tal niilismo existencial?
Eu tomei o diário e guardei em uma gaveta do meu criado-mudo
- Me responde, o que é niilismo existencial?
- Não é nada, esquece isso. Você não devia mexer nas minhas coisas…
Finalmente parei pra observá-la, ela estava usando roupa pra caminhada. Eu preferi nem perguntar nada, à essa altura do campeonato já tinha desistido de entender ela.
- E então, vamos fazer alguma coisa hoje? - eu perguntei, interessado
- Eu só vim jogar! - ela disse, ligando meu Playstation
Eu fiquei em pé, parado, a vendo jogar. Um pensamento passou pelo meu cérebro subitamente, me deu vontade de fazer algo bem louco. Algo que eu nunca imaginei que faria… com ela
A ladra de filmes
A garota que quase me matou afogado
Que quase arruinou meu trabalho de colégio
Que me fez passar vergonha na frente dos meus pais
E que… transou comigo no banheiro de um museu de arte
Acho que essa coisa que estou sentindo agora é exatamente o que ela sente toda vez que faz alguma doideira
Agora eu entendo...
- Á-Ágata… - eu falei, gaguejando
- Que é? – ela perguntou distraída, enquanto jogava
Eu respirei fundo, fechei o olho
- Você quer namorar comigo?
Um silêncio pairou
Eu não queria abrir os olhos pra não ver se ela estivesse rindo de mim ou algo do tipo, até que eu cansei de esperar com todo aquele drama adolescente e olhei pra ela, que ainda permaneceu jogando
- Ágata, você me ouviu?
- Fala.
Eu respirei fundo, talvez essa nem tenha sido uma boa ideia, ainda bem que ela não ouviu. Isso parece ter sido algum tipo de sinal, também, onde eu estava com a cabeça? Melhor simplesmente esquecer isso. Namorar com ela deve ser um caos completo, sinceramente, não sei de onde tirei isso
Enfim
Ela continuou jogando, e eu continuei vendo ela jogar e depois de um tempo, ela voltou a puxar assunto
- Então… o que é esse tal niilismo existencial?
- Esquece isso.
- Deve ser uma parada pesada. É tipo alguma crise de identidade?
- Esquece isso, okay?
Ela não respondeu, acho que fui muito frio com ela
- Você é um depressivo chato pra caralho, sabia? - ela contra-atacou
- Tá bom, desculpa, mas não precisa falar assim!
- Não, é sério! Você tá sempre chateado, reclamando, e… e… criticando as coisas, fala sério! Sabe o que eu acho? Eu acho que você devia curtir mais a vida. Carpe Diem, sabe?
- Carpe Diem… – eu retruquei, achando aquilo ridículo.
- É sério, você quer terminar como o Neil de Sociedade dos Poetas Mortos? Porque é isso que vai acontecer, e ele nem era depressivo, ele só era frustrado…
Eu não respondi, na verdade eu não tinha uma resposta. Apenas me calei e esperei que ela fizesse o mesmo… e ela fez
Mas logo depois ela se levantou
- Eu tô indo…
- Já?
- Se anima um pouco, quando você não estiver ocupado demais sendo o baixo-estima em pessoa, talvez a gente passe mais tempo junto!
- Que é isso…
Ela me deu um abraço e falou bem baixinho no meu ouvido
- Eu ouvi você me pedir em namoro…
Então foi embora. E eu fiquei ali parecendo um idiota.

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