XVI - STEENSARK

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— O velho continuava o mesmo: o chapéu cônico, à moda nortista, inclinava-se um tanto para trás e de cima da testa saía uma aba curva a fim de proteger o rosto do sol — uma grande contradição nos Reinos da Noite! Mas aquele era Uléster, o antigo! — contou Raërn. — A capa grossa de inverno cobria-lhe o corpo por inteiro; era de um roxo tão escuro como negro, salpicada de pontinhos brancos já há muito esmaecidos. O magnífico cajado do magíer despontava pela abertura da capa, a pedra incolor na ponta ainda quente pela conjuração do portal. A barba dardava à frente do rosto menos pela sua natureza revolta do que pela mania que o velho tinha de esticá-la a todo momento com os dedos. O cabelo era do mesmo prateado, descendo em uma trança única por dentro da capa. O sorriso brilhou no rosto frio daquele velho amigo, acalentando meu coração, pois mais espero ser amaldiçoado por um gnomo do que receber um sorriso de um noitista como eu, é o que penso, senhores!

"— Então era você em Hájen, meu bom magíer? — perguntou-me Uléster. 

"Deixei-o a par sobre o espraiamento do Mal em Hájen, pois já há tempo não nos escrevíamos, como quando ele ainda ocupava sua torre de Domera Kais — não uma torre magíera, senhores, mas uma feita pelo homem, de encantamentos fracos. Acabando a história, Uléster respondeu-me:

"— Receio que as forças haxenianas trabalhem por lá, e há tempos. Talvez caiba explicar-lhe de minhas investidas àquelas terras, agora que entendo as suas. Sabe bem minha boa relação com os povos de minha região; uma relação antiga, que data de antes da ascensão skaal. Chamam-me de O Antigo, e há gerações percorro as ruínas das encostas e os povoados a norte, onde planícies vastas e pântanos escuros se estendem até o Mar Verde, sem nunca segredar a ninguém algo sobre minha morada: Steensark é um local tão hermético quanto o mistério que guarda, acredite! — disse-me meu amigo, enquanto coifava a barba com os dedos longos. — O pouco que sei sobre os acontecimentos do mundo, quedas de reinos, nascimento de impérios e guerras vem de meus bons homens, e há de saber, magíer, como o medo e o exagero rondam a mente desses bons homens: bons e simples, os meus, e nada têm a ver com dignatários perversos ou com a língua skaal, não os julgue! 

"— Não os julgo — concordei.

"— E têm razão em temer: é um reino maldito, Skjaldrøvík, e maldito são os haxens que o governam: os relatos de meus homens falavam em grandes bandos de homens a voavam como trapos ao vento, em direção a leste. Pouco me importei com o que me foi dito, e atribuí a visão ao medo e ignorância desses povos, mas os relatos foram crescendo com as primaveras e pus-me a vasculhar as vastas planícies e pântanos a norte com a Mente — e então silenciou-se, perdido em pensamentos. 

"— E então? — inqueri. Tenho uma impaciência de fogo, como meu bom príncipe e acólito a têm!

" — Inúmeras foram as vezes que os encontrei, os haxens! Nisso meus homens tinham razão, mas falharam nos números: voavam em grupos de seis, não mais. Por anos segui-os por sua rota e confundi-lhes as mentes quando pude, mas quando enfim alcancei o maldito destino dos haxens e me atrevi a abrir a Mente para aquela região, descobri um grande campo trancado! E agora me diga, magíer: a quem pertence a magia tão poderosa que repele uma mente antiga como a minha e uma torre antiga como Steensark?, diga-me!

" O nome veio-me à mente de súbito, mas como não ouso pronunciá-lo agora, tampouco o fiz em presença de meu velho amigo, e limite-me a dizer:

" — Por esse mistério atravessei mares e galguei encostas íngremes e enregeladas! Vulkermónt agora se vê ameaçada, magíer, pois o círculo do Mal já nos toca. Sinto seus dedos negros nas nossas fortalezas. De Jenár não temos qualquer ajuda e meu bom príncipe Hájenor já fala em marchar contra a cidade! Lembra do que me disse em Vvysenia, quando os kaieres atacaram seu reino? Lembra-se, Uléster?

VIRMÍRIA I {REVISÃO}Onde histórias criam vida. Descubra agora