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23 – Fernando e Rafael

No banheiro da escola, entrava ano e saia ano e as mesmas marcas de caneta continuavam nas paredes. Eu não era muito de colar qualquer coisa ali mas achava divertido observar o que outros meninos da escola tinham a dizer.

Eu sabia que alguns dos rabiscos eram muito antigos. Um dos que sempre me intrigava estava escrito na porta de uma das cabines ao lado da pia. Em um tom bem desbotado de preto havia um desenho meio torto de um coração e dentro estava escrito "Fernando e Rafael, 1987".

Aquilo podia significar muitas coisas. Talvez um casal gay em 1987 que escreveu aquilo ali pra que ninguém esquecesse? Ou talvez alguém tenha escrito aquilo lá para zoar dois meninos que nada tinham a ver com isso.

Mas outra possibilidade, bem mais possível, era de que o coração não significasse nada e eu tinha uma imaginação bem fértil. De qualquer forma era bonitinho pensar em um casal de mais de 30 anos atrás nessa mesma escola, nesse mesmo banheiro, talvez marcando um ao outro na história do único jeito que era possível.

Eu tinha muito tempo para pensar nessas coisas enquanto esperava que Leo, Olívia e Vinícius terminassem a prova de biologia que eu havia entregado em dez minutos. Não havia estudado nada porque Vinícius e eu tínhamos combinado de estudar juntos na noite anterior, mas não conseguimos nos concentrar. Ele também não devia estar indo muito bem.

"Tu tá falando sozinho, real?" Gabriel diz, do nada. Olho para a porta e ele está encostado no batente, como sempre, espreitando nos lugares. De fato eu estava falando sozinho. Tinha esse hábito que era automático quando estava sozinho.

Eu me encosto na parede enquanto ele entra no banheiro e se aproxima de mim.

"Talvez." Eu digo pra ele simplesmente.

Gabriel se aproxima de mim. Ele está sempre usando aquela jaqueta de couro e as botas grandes. Olhando-o agora e pensando nas coisas que ele diz e faz, eu me pergunto como consegui cometer o mesmo erro três vezes.

"Eu ainda não acredito que tu tá mesmo namorando com o japa-boy. Honestamente eu achei que tu tivesse mais bom gosto." Ele diz, a centímetros de mim.

"É? Aparentemente pra ti qualquer coisa ou qualquer um que não tenha a ver contigo é de mau gosto. E eu não to nem ai."

Ele ri.

"Eu adoro quando tu responde assim."

Ele toca minha mão e eu a puxo de volta.

"Quer saber, não." Eu digo, e posso sentir Vinícius nas minhas palavras enquanto falo. "Eu já te disse mais de uma vez que não tem mais nada entre a gente e que nunca mais vai ter. E se tu realmente sente tanta falta assim de mim tu devia ter pensado nisso quando continuou me chamando de viado mesmo depois que eu deixei tu me chupar."

O rosto dele vai daquele divertimento maldoso para a raiva em uma fração de segundo.

"A tua sorte é que eu não sou de ficar putinho. Já tem gente que adora."

E eu ainda estou surpreso com o que saiu da minha própria boca e a adrenalina ainda corre solta pelo meu corpo, mesmo depois que ele vai embora.

24 – Pais do ano

"Vinícius? Eu estou falando contigo."

Mas é só depois que meus pais chamaram meu nome três vezes que eu levanto a cabeça. Estou morrendo de sono e estive pensando sobre Otávio pelo almoço todo.

O Que Meninos Fazem No EscuroOnde histórias criam vida. Descubra agora