Soleil

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Grace White
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9 de Agosto de 2015
18:51 d.p
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–Por quanto tempo você irá aguentar, minha querida? - Giselle dizia com seu forte sotaque francês. A cuidadora estava sentada ao meu lado da cama e passava sua fria e delicada mão enrugada sobre minha enorme barriga. A mesma acariciava na tentativa de poder sentir Soleil chutando, já que a pequenina sempre se mexia ao sentir mãos frias sobre si.

–Eu realmente não sei.

   Eu estava com fortes dores de cabeça, tomar comprimidos para esse tipo de dor só ajudaria a piorar o estado terminal de meu melanoma.

   Eu estava doente e principalmente grávida e isso só ajudava a adiantar minha ida para o caixão.

   Giselle havia me alertado sobre abortar Stormi desde o começo da gravidez, quando soube que ela só iria  me matar mais rápido. Eu nunca tive coragem para fazer isso, mesmo que eu não soubesse o que iria ser dela quando a mesma nascesse. Eu queria protegê-la por algum motivo e ainda quero.

   Ela seria minha única família desde que me mandaram para fora de casa quando souberam que eu era garota de programa. Ela seria minha pequena estrelinha nessa terra e minha continuação.

  Fui expulsa de casa aos 19 anos quando meus pais souberam por certos vizinhos do meu "trabalho". Não foi escolha minha trabalhar para isso e sim por necessidade. Na época iria fazia 18 meses que meu pai estava desempregado e minha mãe trabalhava como faxineira numa fábrica de roupas, o que a mesma ganhava não dava para ajudar a pagar as contas. Eu estava completamente desesperada para ajuda-los, mas não havia nada para fazer e nem mesmo os trabalhos de verão ajudavam a pagar as dividas que se acumulavam. Eu me sentia inútil por achar que não estava fazendo o necessário.

   Tudo começou numa festa de despedida do ensino médio. Estava sentada e bebendo no sofá da grande mansão enquanto ouvia as histórias malucas dos meus amigos que estavam provavelmente dando surtos de tanto álcool e maconha que consumiam. Meu olhar para eles era uma olhar vazio, pois não me importava ou achava graça de suas histórias. Minha cabeça estava em casa, imaginando meus pais tendo uma mera discussão de como iam pagar as contas, talvez de como poderiam arranjar um emprego, ou até tentando cortar certos custos na tentativa de economizar. Em meio daqueles pensamentos uma garota loira e alta senta no meio de nós, ela falava de sua vida, de suas histórias incríveis até demais; e tudo isso  olhando atentamente para mim. No final da festa saindo pela porta da mansão, a garota loira me para dizendo que poderia me ajudar, dizia que sabia da minha vida e o que eu estava basicamente passando. Ela disse que só haveria uma maneira de conseguir resolver os meus problemas com o que ganharia trabalhando para isso, sobrando dinheiro até mesmo para mim.

   O desespero bateu tão forte que não exitei em negar essa grande "ajuda", nem cheguei a questionar como ela sabia o que eu estava passando. A garota me levou ao bordel, onde fui apresentada para a Mãezinha, ou é assim que minhas colegas preferem chama-lá. Eu estava precisando de dinheiro e fui uma criança boba demais e aceitei, fui tão burra principalmente por aceitar um contrato de 5 anos. As coisas aqui mesmo sendo ilegais, são mais organizadas do que parece.

   A garota a qual me meteu nessa confusão, foi encontrada morta no dia seguinte. Ou foi pelo menos os boatos que correram pela casa, diziam que ela trabalhava no bordel faziam uns seis meses, a mesma assinou um contrato de um ano para a mãezinha e queria sair antes do tempo, por isso queria encontrar alguém para a por em seu lugar.

   Foi o que ela tinha tentando negociar com Cafetina da casa para também sair dessa furada, mas colocando alguém em seu problema.

   Pensar nessa "longa" história me trazia pesadelos, dores de cabeça e uma profunda tristeza para mim. Aliás, eu não aguentava mais estar a disposição de tantos homens nojentos de ter que ceder mesmo não querendo, de me sentir mal no final de tudo... com minha gravidez não precisei mais me incomodar com isso, talvez isso seja algum dos motivos de realmente ter resolvido seguir a gravidez, evitar as mãos...

   Desde que engravidei ninguém mais resolveu pedir meus serviços, apareciam alguns, mas eu tinha o privilégio de negar.

—O quê irá fazer com ela, querida? Mandar para o orfanato? Dar para alguém?- Giselle sussurra baixinho com a voz um pouco embargada. Dava pra sentir que sua preocupação não era só com a menina, era comigo. Giselle era uma das únicas pessoas que eu realmente podia contar tudo que pudesse. Ela tinha o papel de cuidar das meninas do bordel e muitas delas a vêem como uma figura materna e não é atoa, nós últimos meses algumas delas setem até ciúmes por ela passar mais tempo comigo do que com elas, me sinto culpada por isso e tento até fazer com que ela saia para dar atenção as meninas, mas Giselle diz que preciso de mais cuidado e atenção do que as meninas por minhas condições.

–Eu realmente não sei.- olho para minha barriga sentido minha filha chutar.

–A qualquer momento ela pode vir ao mundo, querida. E você até agora não escolheu um nome. Acha que não está na hora de nomear sua menininha?- Sorrindo para mim, ela retira suas mãos de minha barriga.

–Como que se chama Sol em francês?- quando pergunto, Giselle fica atônita por um momento. Ela olha pra pequena janela no alto do teto do meu quarto e observa a luz do por do sol iluminando levemente o quarto.

–Soleil...- Diz sorrindo

–Soleil... Eu amei, será esse o nome dela.- Digo segurando suas mãos e agradecendo por estar comigo até aqui.

–Você e sua filha são realmente uma luz por está casa escura Grace, continue assim até seu último dia.- Depois de dizer, ouvimos batidas na porta. Provavelmente era algum segurança dizendo que era para Giselle sair e ficar de olho nas outras garotas que estavam sobre casa.- Eu tenho que ir, meu amor. Qualquer coisa é só me chamar.- Giselle deposita um beijo sobre minha cabeça se despedindo com um semblante triste.

   Estava pensando na pergunta de Giselle, sobre o que eu iria fazer com a criança. Eu sabia exatamente qual foi a última vez com quem eu tive uma relação, a minha certeza sobre saber quem era exatamente o pai poderia estar errada, mas poderia estar certa.

   Sabendo ou não, essa pessoa era o único em que confiava para cuidar de Stormi, o único que vinha aqui e me fazia me sentir bem nesse lugar escuro. Dylan embora aparentava ser alguém idiota, arrogante e encrenqueiro, ele era alguém muito carinhoso que só precisava ser ouvido.

  Ele necessitava de mim para ter alguém para ouvi-lo, era algo muito além de vir aqui apenas para uma noite. As vezes nem passávamos a noite transando e sim conversando, ouvindo atentamente um ao outro. Era praticamente assim até o dia em que ouve uma briga entre ele e a dona do bordel, ele queria que meu contrato fosse fechado antes do tempo, queria me levar para sua casa e estava disposto a pagar uma grande quantia para a cafetina. E por algum motivo ela não aceitou e jurou que se o mesmo voltasse aqui seria recebido a tiros e desde então nunca mais o vi.

—Posso entrar?- Olho para a porta do meu quarto e vejo Lisa, um outro anjo desta casa. Apenas afirmo com a cabeça observando ela entrar e se sentando ao meu lado.- Como está a minha afilhada mais linda do mundo? Em coisa fofa?- Camila dizia com voz extremamente melosa, que me fazia sorrir enquanto ela acariciava minha barriga dizendo coisas fofas para, Soleil.

—Você não tem que trabalhar, ridícula?- Falo ironicamente  bagunçando seus cabelos longos e negros.

—Não estou afim- Lisa tira minhas mãos de seus cabelos me dando língua.

—Você infelizmente não tem esse direito de não querer.

—E quem disse que estou no direito?

—Não?

—Eu vim aqui para ver minha menina, que com certeza vai ser mais linda do que eu.- ela joga seus cabelos para o lado num ar de convencido.

—Coitada...

—Eii!!- Camila me dá um leve empurrão dando risada.- Depois eu sou a ridícula.

—Estou lisonjeada por ser chamada de ridícula. -Digo colocando minhas mãos acima do peito fingindo está ofendida. Minha amiga sorri e se ergue para me abraçar.

   Sinto Soleil chutar mais uma vez, só que, após esse chute sinto algo descer em abundância sobre minhas pernas.

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