Ira
"Sentimento humano de externar raiva e ódio por alguma coisa ou alguém. É o forte desejo de causar mal a outro"Mathias ao apontar o revólver para Paulo, sente um aperto no peito, como se o que estivesse prestes a fazer fosse errado, mas então lembra da noite que seu pai morreu e no quão difícil foi vê-lo no chão, sangrando até morrer; o ódio e a ira o cega por um instante e sem pensar mais, puxa o gatilho e dispara.
Um, dois, três... dispara tantas vezes que perde a conta, só quando Bruno coloca a mão no seu ombro, que Mathias larga o revólver, já sem mais nenhuma bala. Ele então encara o corpo caído e ensanguentado amarrado à cadeira apenas por um segundo e sai da sala, deixando Bruno cuidar de tudo. Ele irá limpar o local e deixar o corpo na garagem, a fim de não deixar suspeitas. Mathias desce as escadas, pega o carro e dirige até um bar qualquer onde depois da décima bebida, não lembra nem mais o próprio nome, quanto menos pensa no quão deve ter sido difícil para a família do Paulo receber a notícia de sua morte.
Dois dias se passam e lá está Mathias de novo, apontando seu revólver mais uma vez. Mas o alvo é diferente, se chama Gilberto ao invés de Paulo. E depois deles vêm o Pedro, o Raul, o Ricardo... tantos nomes que a memória de Mathias não se dava mais conta de gravar. E assim se passou um ano. 365 dias matando homens comuns, magnatas, empresários, todos aqueles para quem o pagavam para fazê-lo. Mathias tinha apenas uma condição: o alvo precisa ser culpado por algo, de modo que ele só mata por vingança.
Mathias começou nessa vida após a morte de seu pai. Um evento que ocorreu na frente de seus olhos, mas ele nada pôde fazer para impedir. Só o que lhe restou foi a vingança. Se não podia vingar a morte de seu pai, por nunca ter encontrado o culpado, vingaria para os outros.
***
Bruno chama Mathias, tem uma cliente nova. Este vai até seu escritório e se assusta, pois ao contrário do que está acostumado, não encontra um cara velho e rico, que paga o quanto ele pedir para matar algum inimigo. Quem ele encontra é uma mulher, muito bonita por sinal, que apesar de pequena, tem um olhar determinado de que não está ali para brincadeiras.
Interessante
Curioso, Mathias a cumprimenta e após as apresentações senta junto à Maria para fazer a principal pergunta
O que ela queria? Afinal, ela aparenta ser uma boa pessoa, acha difícil acreditar que queira que ele mate alguém.
- O meu pai. Ele foi assassinado ano passado, mas até hoje a polícia não desvendou o caso. Quero saber quem é o culpado e quando achá-lo, quero vingança.
Uau, ela queria que ele matasse alguém. Que surpresa. A bonequinha não era tão boa assim. Mas ele entende, se tivesse a chance de matar quem assassinara o seu pai, não perderia tempo. Mas ele não era detetive, não tinha como adivinhar quem matou o pai da menina. Apenas recebia um nome e fazia o serviço. Sem isso como poderia ajuda-la? Estava prestes a dizer que não podia fazer o serviço, quando ela disse o nome de seu pai e pela primeira vez nesse último ano que passou, ele sentiu uma coisa: Remorso.
Paulo Santana
Fora o seu primeiro. O primeiro que Mathias matou. Nunca esqueceria
E foi nesse instante que Mathias se arrependeu da vida que estava levando. Ao olhar para a mulher na sua frente, sentiu medo de contar a verdade e magoá-la. Ela o olhava com tanta expectativa; Como lhe dizer que o assassino de seu pai estava bem na frente dela?
Mas em um segundo de loucura ele aceita o serviço. Bruno, que estava por perto o encara sem entender nada. Ele também havia reconhecido o nome, mas Mathias faz sinal para deixar com ele, está tudo sobre controle. Após combinar o pagamento, Maria vai embora e Mathias pede que Bruno vá também. Quando fica sozinho, ele começa a pensar na vida, no que tem feito dela. Mathias então encara as próprias mãos.
Elas já mataram tanto, chegou a vez da última vítima.
***
No dia seguinte Maria recebe uma ligação e se assusta ao ter a notícia de que o serviço estava feito.
Eles foram rápidos.
E então ela se senta, espera ter alívio com a notícia, mas o que sente é angústia.
Não era isso que esperava sentir.
Conforme o trato feito, ela vai ao banco, retira a quantia acordada e vai até o local combinado, mas quando entra no escritório, estranha encontrar apenas Bruno, nada de Mathias.
- Achei que fosse tratar com ele. Foi você que fez o serviço?
Bruno nega com a cabeça e Maria percebe uma certa tristeza em seu rosto e uma folha de caderno em sua mão.
- Aconteceu algo de errado?
- Maria, tem algo que preciso te contar sim. Sente-se por favor
***
Maria sai do escritório e pega seu carro. Dirige sem rumo até parar no cemitério. Ela nem se dera conta de que estava indo para lá, só percebeu quando chegou. Depois de estacionar, caminha por entre as lápides até encontrar onde seu pai fora enterrado. Ela se senta no gramado em frente e se põe a chorar.
O que tinha acabado de acontecer?
Deus, era informação demais para processar. O destino era muito louco, a fez contratar um matador de aluguel, mas justamente o que havia matado seu pai. E ele aceitou o serviço. Quão louco ele era por ter feito isso? Ou talvez a pergunta seja, o quão desesperado ele estava?
Céus, Maria nem sabia o que pensar sobre
Bruno lhe contou o que Mathias deixou escrito em um bilhete de despedida. Na noite anterior ele se matara. Com a mesma arma que matou seu pai e todos os outros que era contratado para o fazer. Mas antes, ele havia ido até o empresário rival do pai dela que havia encomendado a morte de Paulo e o matado também. Fizera o serviço que ela pediu, mas se Maria soubesse antes...
Se soubesse que não ia sentir a morte de seu pai vingada, mas sim, angústia e remorso, ela não teria feito o pedido.
Como se arrependia.
Talvez o Mathias também tenha se arrependido. Matara tantos na busca de sentir vingada a morte do pai dele, mas só o que sentiu foi culpa, raiva, dor, sentimentos esses que cresceram cada dia até virar uma bola de neve que ele não pôde conter. O último prego do caixão dele foi Maria, que o relembrou como tudo começou, com o primeiro cliente, o pai dela. Mathias pensou então que talvez estivesse na hora de seu último show. Findar o espetáculo com o seu primeiro cliente, finalizar o ciclo que fora sua vida nesse último ano. Estava cansado e culpado. Só queria que tudo acabasse e foi o que fez.
O seu erro foi não perceber que o que precisava mesmo, um ano antes, era chorar o luto do pai e depois reconstruir sua vida, sempre recordando uma lembrança feliz do pai. Mas ele não soube lidar. Internalizou a ira pela morte e essa ira passou a alimentar sua sede de vingança, que nunca findou. Virou um homem que não reconhecia mais no espelho. Nesse ponto já não conseguiu mais achar nenhuma redenção para si. A não ser acabar com tudo. Libertar-se dessa vida de mortes sem fim.
Maria chora, derrama lágrimas por remorso, por dor pela perda de seu pai, mas também por Mathias, ela lava sua alma diante toda a situação e em meio aos soluços profere o perdão, para os céus ou qualquer lugar, na esperança de que Mathias possa ouvir
- Eu te perdoo Mathias, onde quer que esteja, eu te perdoo
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Os pecadores
Short StorySegundo a Literatura, os sete pecados capitais atualmente tratam-se de vícios humanos. Dentre eles temos: Luxúria, Gula, Inveja, Preguiça, Soberba, Ira e Avareza. Nessa coleção de contos abordarei cada um desses de uma forma bem interessante. Teremo...