Em terra de cego, quem tem olho é rei

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FELIZ ANO NOVO! FAÇA UM DESEJO!

"Piririm, Piririm, Piririm, alguém ligou pra mim... Piririm, Piririm, Piririm, alguém ligou pra mim...". 

O funk infernal reverberou em minha cabeça. Como meus neurônios tinham se afogado em bebida e lágrimas na noite passada, demorou alguns segundos até eu me dar conta que era meu celular e seu toque tão especial.

 Só podia ser uma pessoa: Toni Ávila, mais conhecido como melhor amigo.

Mas que melhor amigo era esse que me acordava uma hora dessas? 

Antes que a música continuasse, catei o telefone para atender. 

- Desembucha! 

- Quem é? Sou eu bola de fogo, e o calor tá de matar. Vai ser na praia da barra que uma moda eu vou lançar. – o idiota forçou uma voz grossa ao ser atendido e, mesmo com vontade de sorrir, não pude porque estava sem forças. 

- Toni, não vem com essa. Odeio essa musica porque só escuto ela em momentos ruins, o que significa que você só me liga nos momentos ruins. O que foi? 

- Poxa, você estragou o diálogo, Maria Luisa! Você deveria dizer: Vai me enterrar... 

- Na areia? – interrompi o meu amigo, também fingindo uma voz aguda, porém irritada. – Não hoje, Toni, o que foooooi? Minha cabeça está estourando! 

- Você por acaso esqueceu que dia é hoje, Maria Luísa? Como o bom amigo que sou, te liguei para acordar porque temos trabalho a fazer! Levanta dessa cama imunda, cate todas as latinhas de suas bebidas baratas e me encontre na portaria, com sua mala feita! 

- Ai, garoto, não precisa gritar! – retruquei sem querer assumir as verdades proferidas por Toni. – Como sabe que eu bebi ontem? – perguntei, curiosa, enquanto forçava meu corpo a sair da cama e realmente me aprontar, pois o sol já brilhava lá fora e eu não podia perder um segundo daquele dia: muito trabalho a fazer. 

- Como? Fala sério, como? Meu amor, eu te deixei em casa depois de jantarmos juntos porque você está um bagaço, Maria Luisa! Depois que seu supervisor idiota te comeu e te abandonou, você está se acabando por ele! – Toni gritou e eu soltei um muxoxo, já sentindo o motivo das minhas lágrimas querendo aflorar de novo. – Desculpe, amiga, pelas palavras, mas é a verdade e você sabe disso! É tão melhor que aquele escroto do Heitor, que não entendo como pode estar sendo tão cega! 

- Eu sei, eu sei, eu sei! Minha parte racional sabe de tudo isso, sou melhor que ele, ele não me merece, aquele deus grego de tanquinho e olhos azuis e cabelo loiro e lindo e cheiroso e...

- Começou, Malu! Se ame mais, amada! – Toni interrompeu o fluxo totalmente irracional de palavras que fluíam pela minha boca junto com minhas lágrimas que deixavam meu rosto mais feio e inchado. – Você já está no banheiro? Pare de chorar no espelho! Eu quero que você se arrume, não pense naquele desgraçado, arrume sua mala que iremos para o litoral! Temos trabalho a fazer! Ouviu bem, Maria Luisa Coutinho? 

Funguei diante de meu retrato horripilante na frente do espelho do banheiro. Como aquele desgraçado do Toni sabia que eu estava chorando na frente do espelho? Muitos anos ao lado dele, só podia. 

- OUVIU BEM, MARIA LUISA COUTINHO? – ele berrou do outro lado da linha e tive que gritar que tinha entendido antes que ele viesse e jogasse mais ainda na minha cara como tudo estava uma verdadeira merda, eu e meu apartamento. - Ótimo! Vai lá, não esquece seu vestido estupendo para o ano novo, ok?! Me espere lá embaixo! Beijos e queijos, amada. 

- Beijos e queijos. – só fui capaz de dizer nosso cumprimento habitual e então joguei o telefone na cama.

Deus! Quando me tornei aquilo? Aquilo que eu via diante do espelho não se parecia em nada comigo. Como cheguei ao ponto de me embebedar sozinha em casa em um sábado à noite, chorar horrores, perder a hora para o trabalho e ser acordada pelo melhor amigo gay que escolhia um toque ridículo no seu celular?

Happy New Year!Where stories live. Discover now