Passamos três anos com eles se separando e voltando, dois anos presos em uma casa enorme onde ele saía de manhã e voltava a noite. A chave ficava com ele e nem pra escola eu ia mais, na casa não pegava sinal de celular, não tinha internet, televisão e os vizinhos moravam distantes, havia apenas mata. Ele poderia nos matar e ninguém descobriria, estávamos presos em uma das casa de Beaver Brook, ninguém ia nos ver, exceto quando houvesse alguma festa de família e minha avó nos procurava e queria estar perto, o que era raro.
Sinu entrou em depressão profunda. Não saía, não conversava, não cozinhava, não se importava com nada... vivia seus dias dormindo. Enquanto eu e meu irmão ficávamos sozinhos naquela casa fria, escura e silenciosa.
Não era uma casa ruim, um sobrado independente em cima três quartos, dois banheiros e um corredor enorme. Em baixo ficava a sala, cozinha, lavanderia e um quintal também enorme. Ainda assim era escura e fria, então não tinha alegria parecia sombria.
Sempre fui muito alegre e faladeira... quando era pequena adorava estar nas festas de família, a casa cheia me deixava eufórica e eu amava ficar naquele monte de bagunça e barulho. Quando minha mãe entrou em depressão eu parecia um robô, apenas levantava de minha cama e ia pra cama dela pra sentir alguém, as vezes levantava pra arrumar algo pra ela comer ou ir ao banheiro. Isso quando tinha algo para comermos, Alejandro não fazia compras, comia em sua padaria preferida e chegava em casa sem fome não se importando com o que tínhamos comido. Me lembro de várias vezes ter chorado por uma barra de chocolate pois nós sabíamos que tinha dinheiro, ele é um bom pedreiro e com boas indicações, se ele quisesse nós teríamos uma vida boa, não é como se algum dia ele tivesse essa intenção, nunca quis isso pra gente. Eles não brigavam mais pois ela tinha se cansado, vivia dopada de remédios e era raro conversar com ela, minha mamá fazia falta.
Por um tempo ela ia atrás dele onde quer que estivesse, o buscamos várias e várias vezes encontrando-o todas as vezes cercado de mulheres e vinhos caros. As pessoas zombavam de nós, diziam que mamá era louca e que ele falava mal dela onde fosse possível, eu o odiava com todas as forças... não precisava fazer nada ele só me encarava e ficávamos horas nos olhando nos olhos, nos odiando, no fim ele sempre dizia com desgosto:
-Você é igualzinha a ela! Idêntica!
Eu sorria feliz e dizia;
-Graças a Deus!!! Tudo que eu mais quero, melhor do que ser um lixo como você.
Esse era o maior elogio que alguém poderia me fazer, minha mãe é uma mulher forte, brava, corajosa, livre, educada, fiel e uma mulher acima de qualquer coisa, de respeito mesmo que meio louca... sempre foi meu porto seguro. Ela tem o dom de aconselhar e acolher, tinha expressão séria demais mas é um doce por dentro, é sincera e nunca fica do lado errado; e o mais incrível, ela sempre desvenda mentiras. Mamá tem a habilidade de olhar nos olhos e saber se é verdade ou mentira o que você esta contando, inteligente mesmo com o pouco estudo e vinda de família humilde, ela sabe andar por New York inteira sem se perder, conversa sobre qualquer assunto e se não disser que não sabe muito ninguém desconfia.
Ela me ensinou tudo o que sei sobre pessoas, raramente sou enganada por alguém, principalmente por homens. Pelo contrário, me divirto muito com as mentiras que tentam me contar e que mamá me ensinou a ver desde pequena. Não posso negar os defeitos... minha mamá é sagitariana, isso significa que não é muito responsável, é livre e quer fazer coisas que fazia quando era solteira, totalmente independente. Não precisa de ninguém e eu amo isso nela, embora as vezes seja um grande defeito. Mas cá entre nós... sou aquariana e dependência não é meu forte, então por mim mamá esta perdoada.
Com toda essa palhaçada, meus pais se separaram em definitivo graças a Deus. Ela descobriu uma traição e outra, e mais outra... e finalmente o divórcio foi assinado. Posso me recordar que nunca em toda minha vida fique tão feliz com uma separação ou com qualquer coisa. Nós fomos pra casa da minha irmã e eu voltei a frequentar a escola que aquela garota estranha frequentava, eu nem me lembrava mais dela. Mas eu iria lembrar logo logo...
Minha vida tinha melhorado, tudo estava bem e em sua perfeita ordem. Minha mãe estava apaixonada por um cara da Geórgia e vivia entre Miami e Geórgia, eu via que ela estava feliz e por um tempo, pude me sentir bem. Na escola eu já não era uma estranha o que evitava aquelas baboseiras desnecessárias, além de já ter conhecidos com quem passava meu tempo naquele lugar, escola realmente não era o meu forte. Passava agora mais tempo com a minha irmã do que com a minha mamá, o que não era de todo ruim já que ela tinha saído daquela depressão e estava curtindo a vida.
Por que temos que ir pra escola mesmo? Ta bom que eu não sou a garota com quem tiram sarro o tempo todo, muito menos a mais popular. Sou neutra naquele lugar conheço todos e todos me conhecem, tenho meu grupinho de amigas e ninguém mexe comigo. Mas porque preciso ir pra lá? Não poderia estudar em casa e ter plena felicidade dessa forma? Não, não poderia... mamá não permite, diz que devo conviver com pessoas e ser sociável, fazer o que né ela que manda.
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Confusa
RomanceA recente mudança de Nova York para Miami faz a vida de Camila virar de cabeça para baixo mais uma vez, mas quem disse que não poderia ficar pior?? Camila uma menina ingênua de 16 anos com muitos traumas e problemas com a mãe que tem depressão e am...