Esta única folha de caderno foi encontrada em uma árvore, no meio da floresta amazônica, enquanto uma expedição federal para a descoberta de novas espécies e povoados passava por lá, no dia 27 de Janeiro de 2031.
17 de Abril de 2017
Meu nome é Caio Arnaldo de Sá. Eu tenho 38 anos, nasci na cidade de Caiasapo, sou pesquisador e historiador graduado e pós-graduado pela UniSapo e escrevo esta mensagem a quem primeiro achar meus relatos nesta densa mata em que me encontro (ou me encontrava). Eu arranquei as outras páginas antes escritas deste que costumava ser o meu diário, para que o próximo aventureiro que encontrar esta solitária folha não encontre dificuldades em descobrir quem foi seu antigo dono. Aliás, eu deveria estar falando direto com você, meu novo amigo.
Eu espero que não esteja com toda uma equipe junto de ti, porque eles não gostam de muitos visitantes. Espero também que não carregue nenhuma arma de fogo, pois acredite, você será mais desventurado do que eu. Eles têm mais de um jeito de te imobilizar.
Você deve estar se perguntando: "quem são 'eles'?". Bem, é difícil dizer. Eles não se intitulam como um povo, como nós, brasileiros, fazemos, por exemplo. Para eles, a ideia de um aglomerado de pessoas é única, uma vez que nunca tiveram contato com mais nenhum outro tipo de cultura. Até a minha vinda.
Para facilitar o seu trabalho, pesquisador, eu os intitulei de "Os Migaskalas", que significa "Os Revoltosos", em sua língua nativa. Se você for um bom historiador indígena, conseguirá notar que é muito diferente de qualquer outra tribo indígena brasileira. E eles realmente são.
Primeiramente porque não os vi usar nenhuma vez qualquer tipo de vestimenta ou pele de animais para cobrirem seus corpos, nem quando chovia ou "esfriava" (lembrando que estamos na Amazônia). Você pode dizer que "as outras tribos brasileiras não usavam também", mas esta tinha um motivo para não usar: eles diziam que o lugar de onde vieram fazia muito mais frio, e que seria um desperdício e uma falta de respeito muito grande com seus antecessores se usassem os animais para se cobrirem.
Outra diferença é que estas pessoas já conheciam a agricultura e a pecuária, mas existe algo muito peculiar neste último ponto: os Migaskalas não matavam seus animais. Eles os deixavam morrer naturalmente para que então pudessem os comer, numa cerimônia que será explicada daqui a pouco.
Mais um fato é que todos os integrantes do bando apresentam pelos em excesso e têm presas bastante grandes para um ser humano comum. Você até poderia os relacionar com seres primitivos da nossa espécie, mas eu desconsiderei esta possibilidade depois de perceber como são inteligentes.
Se eu quisesse me estender com as ímpares características dos Migaskalas, poderíamos ficar aqui a tarde toda, mas infelizmente dois fatores atrapalham esta nossa conversa: a falta de espaço na folha e a minha exagerada pressa de fugir daquele povo. Agora que consegui uma brecha, não posso deixar passar. Mas eu lhe darei mais detalhes, meu amigo. Aliás, pretendo dar mais detalhes ao mundo todo, caso consiga sair vivo desta floresta. Se nunca mais ouvir falar do meu nome, então será você mesmo que terá de descobrir os mistérios de que estive falando.
Se esta for realmente a situação, eu só tenho a lhe desejar muita sorte.
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Não Existe Onipotência
Storie breviRelatos raros do famoso historiador e pesquisador Caio Arnaldo de Sá, que dedicou sua vida a estudar as vezes em que o ser humano enfrentou Deus. Caio foi dado como morto, vítima de um ataque fulminante em 4 de Abril de 2028, porém, nestas poucas pá...