Não suportava mais ficar em sua própria casa, então resolveu sair de Scarbrough Abbey naquele dia para visitar sua irmã, que morava um pouco distante dele. Suas visitas a ela eram comuns, seu cunhado estava acostumado com sua constante aproximação, até mesmo achava estranho quando ele não aparecia. Depois que se casou, suas visitas diminuíram, mas não impediu que trocasse cartas com Kiara semanalmente contando sua rotina. Escondia muitos detalhes, porque sabia que sua irmã iria pessoalmente até sua casa matar Beatrice.
Não foi nenhuma novidade para o mordomo da casa recebê-lo. Acompanhou ele até a sala verde, ofereceu-lhe chá — que aceitou de bom grado —, e comunicou que falaria com sua irmã sobre sua visita. Bruno apenas assentiu com a cabeça, sentou-se em sua poltrona preferida e fechou os olhos para descansar um pouco da viagem. Mas não demorou muito tempo o seu sossego, Kiara invadiu a sala com grande entusiasmo.
Ele se levantou e abraçou a irmã com força, passando a mão pelo penteado não mais perfeito. Amava bagunçar os cabelos dela desde pequeno, e ela nunca havia se importado, achava um gesto carinhoso particular deles. Toda vez que se encontrava com Kiara, era aquela mesma festa. De todas as pessoas do mundo, ela era a única que lhe trazia alguma paz.
— Bruno, meu querido irmão. — segurou o rosto dele com as mãos. — Fico tão feliz em vê-lo.
— Também estou feliz em vê-la. — passou seu polegar pela bochecha, fazendo os olhos castanhos dela brilharem com o carinho. — Preciso de você mais do que nunca.
Kiara franziu a testa, coisa que ela fazia quando estava preocupada.
— Não me relatou nada em sua última carta.
— Muitas coisas eu não tenho dito, irmã.
— Como ousa esconder coisas importantes da sua vida para mim? — seu tom de voz ficou raivoso, e Bruno entendia os motivos dela. — Estou muito irritada e chateada com você. — fez um biquinho, sinal claro da irritação dela. — Não vou conversar em pé.
— Claro que não.
Kiara sentou-se próxima a ele.
— Esse assunto é em relação a marquesa?
— Sim. Como sabia?
— Ela não está aqui. Na verdade, nunca está. Vi Beatrice apenas no casamento de vocês, isso é no mínimo estranho. Conversei com Charles sobre essa situação, mas ele disse apenas que era paranoia da minha parte. Ficarei contente em dizer a ele que eu tinha razão. — disse a última palavra com ênfase e satisfação. — Meu irmão, fui contra esse casamento desde o início. Falei diversas vezes com nossos pais para reconsiderarem essa alternativa de casá-lo de maneira arranjada. Nunca foi certo, jamais seria. Sei que se encantou com Beatrice assim que a viu, mas ela amava outro.
— Ainda ama. — abaixou a cabeça.
— Santo Deus. — a irmã colocou a mão sobre a dele. — É mais grave do que eu imaginava.
Bruno começou a contar todas as coisas que havia escondido da irmã. Kiara não interrompeu em nenhum momento, ouvia tudo com atenção, às vezes balançava a cabeça em negativa, outras apertava a mão dele, como maneira de consolá-lo.
No meio daquilo tudo, nem tinha notado a presença da criada servindo o chá para eles. Sua irmã esperou ela sair para poder falar.
— Bruno, eu odeio Beatrice.
— Não, não pode odiá-la. Não é culpa dela estarmos nessa maldita confusão.
— Infelizmente tem razão, como sempre. — revirou os olhos. — Como terei argumentos para dar umas boas palmadas nela?
Aquilo fez Bruno dar risada em meio àquela conversa.
— Estou falando sério. — disse ofendida. — Sabe que eu faria isso, não sabe?
— Claro. — tentou segurar o riso, quando sentiu a mão da sua irmã lhe dando um tapa. — Foi para confirmar seu argumento?
— Claramente. — respondeu satisfeita.
— Engraçadinha.
— Voltando ao assunto principal, você a ama?
Bruno ponderou na resposta.
Sim, a amava. Desde o jantar de noivado, quando pousou os olhos nela.
— Seu silêncio me respondeu.
— O que devo fazer?
— Nada.
— Nada? — perguntou incrédulo.
— Fique uns dias aqui comigo, esfriando sua cabeça. Ambos precisam ficar longe um do outro. — Kiara suspirou.
— Acha mesmo?
— Absolutamente. Estão machucados, podem se magoar ainda mais.
— Kiara, venho chorando todas essas noites.
A mão dela pousou em seu rosto carinhosamente.
— Lembre-se de todas as músicas italianas sobre amor que nossa avó cantava para nós na infância. Especificamente aquela sobre o tempo e o amor. Não estou dizendo que Beatrice vai se apaixonar por você, mas algum dia ela vai nutrir alguma ternura. Precisa de mais um pouquinho de paciência, mais do que já está tendo. Outra pessoa em seu lugar, teria matado ela ao pronunciar o nome de outro homem no ato do amor.
Bruno ficou calado.
— Acalme-se. — ela o puxou para um abraço. — Paciência é a resposta.
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Não feche os olhos essa noite
Short StoryBruno e Beatrice foram unidos por um casamento arranjado. Ele de imediato criou uma ternura pela a esposa, tentando fazer com que desse tudo certo. No entanto, Beatrice tinha amarras pesadas no coração; um amor do passado. Por mais que ele tentasse...