Conforto.

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                                                                                          Krystal.

Eu não sabia quantos dias eu havia ficado fora. Parei de contar depois da segunda semana trancada naquela sala, apenas com um copo de água por dia e sem comida. Mesmo com a minha resistência, eu sentia que estava quase morta.

Os dias que eu passei lá, foram quase impossíveis de suportar. Eu tive algumas costelas quebradas e mais seis ossos diferentes trincados, quase se despedaçando. Mas devida ao meu processo de cicatrização mais rápido do que as de pessoas normais, fez com que meu organismo remodelasse os ossos imaturos, fortificando-os quase por completo.

Mas eu ainda nem chegava perto de estar curada. Fisicamente e psicologicamente.

Meu próprio tio me levou para o meu quarto numa cadeira de rodas, já que ele me deixou incapacidade de andar por muito tempo.

Ele abriu meu quarto com uma chave que eu não sabia que ele tinha, e me deixou lá dentro.

-Você terá uma recuperação melhor aqui.- ele disse e saiu, trancando a porta do lado de fora.

Nem se eu quisesse responde-lo, eu poderia, devido aos enforcamentos diários, que haviam danificado minhas cordas vocais.

Me virei para o enorme espelho da minha penteadeira e me levantei, com extrema dificuldade,e pude ver o quão lixo eu estava.

Tinha algumas manchas amareladas no meu rosto, que substituíam o preto que ele havia deixado no meu rosto há semanas atrás. Minha boca ainda carregava um corte, que ameaçava a querer sangrar. Meu pescoço tinha as marcas roxas de seus dedos, deixando levemente inchado.

Abri o roupão no qual ele havia me vestido e arfei dolorosamente ao ver como estava a situação do meu pescoço para baixo.

Meus braços estavam azuis, por causa dos apertões e as cordas que ele usava frequentemente. Minha barriga ainda estava quase preta de tanto ser atingida pelo martelo e chicotes. Virei-me de costas, e pude ver as queimaduras feitas pelo maçarico, se estendendo por toda a minha coluna.

Hoje mais cedo, meu tio tentou me alimentar depois de semanas sem eu sentir nada além do gosto do meu próprio sangue, mas o que eu comi não ficou muito tempo no meu estômago por causa da dor. Eu podia ver minhas costelas quase curadas através da minha pele. Eu estava horrível. Magra, pálida, com olheiras profundas e completamente deformada pelos ferimentos. Fechei aquele roupão, não suportando aquela imagem, e fiz a melhor coisa que eu poderia ter feito.

Peguei meu abajur em cima da penteadeira e, joguei com força no espelho, o quebrando em vários pedaços. Ignorei a dor lancinante no meu corpo inteiro e fiz a mesma coisa com todos os outros espelhos do meu quarto.

Durante todo o tempo em que fiquei trancada, eu não me permiti chorar. Nem uma vez. Eu parei de gritar de dor também. Consegui aguentar toda a dor calada, me recusando a dar motivos para aquele homem sorrir com satisfação. Mas, naquele momento, ao ver minha imagem destorcida no espelho quebrado, eu chorei. Chorei como uma criança.

Mas me obriguei a parar quando ouvi batidas na minha porta.

-Wood, abre a porta.- era Zayn. O filho da puta que fez isso comigo.- Eu sei que você está aí.

Fiquei ali, contendo minha raiva em silêncio sem fazer nenhum ruído, para que ele pudesse ir embora. Ouvi um grunhido de sua parte e seus passos foram se afastando.

Voltei-me a sentar na cadeira de rodas, com muita dificuldade. Eu estava com fome e com sede, mas minha garganta e minhas dores não me permitia nada disso.

Ouvi um barulho vindo da porta e soube logo quem era.

Zayn tentava abrir a maldita porta com o seu clipe de papel. Tentei me levantar da cadeira, mas me embaracei no meu roupão fui de encontro ao chão. Comecei a chorar silenciosamente ali mesmo, encolhida em cima dos cacos de vidros. A porta foi aberta, revelando Zayn, que ficou paralisado ao me ver daquele jeito.

Demorou alguns segundos até que a madame percebesse que eu estava caída no chão, sem poder me levantar, e foi me ajudar a me manter de pé.

-O que ele fez com você?- ele sussurrou. Sua expressão era de puro horror e ele nem havia visto meu corpo todo.

-Sai daqui.- minha voz saiu mais fraca que um sussurro.-Eu não quero a sua ajuda.- me remexi em seus braços me arrependendo amargamente por isso. A dor me atingiu em cheio.  

-Não se mova dessa maneira.- ele disse.- Não seja teimosa.

-Teimosa?- tentei levantar meu tom de voz, mas ela falhou completamente. Doía tanto tentar forçar minhas cordas vocais. Mas eu precisava falar.- A culpa disso é sua. Sai da minha frente.

-Eu não posso.-ele disse com a voz carregada de remorso. Quase acreditei.- Deixe-me te ajudar. Por favor, eu só quero cuidar de você.- ele estava implorando?

-Não. Sai daqui, agora.

-Não.- ele negou.

-Como é que é?- minha garganta queimava com todas aquelas palavras.

-Olhe para você. -ele disse apontando para mim.- Mal consegue ficar de pé. Se continuar assim,não vai ter a recuperação necessária. Eu posso chamar a Cooper e o Harry para cuidar de você, se você preferir. Eu não quero te ver assim.

-Então feche os olhos.- ao dizer essas palavras, comecei a tossir freneticamente. Zayn me olhou preocupado, até perceber o inchaço em meus pescoço. Ele me segurou firmemente para que eu não caísse, e esperou até que aquilo passasse.

-Eu posso chama-los para você.- ele disse.

-Não.- eu quase não tinha voz nenhuma. Eu não queria que eles me vissem assim. Não mesmo.

-Tudo bem.- Zayn respondeu, calmamente.

Senti seus braços em volta do meu corpo frágil, me carregar cuidadosamente até minha cama, e me deitando na mesma e me cobrindo com o cobertor. Não sei o porquê, mas não consegui conter meu choro.

Zayn me abraçou com cuidado e eu agarrei sua camisa, chorando ainda mais.

-Está tudo bem.- ele sussurrou.- Você vai ficar bem agora.

E eu não sei o porquê eu estava me confortando com aquelas palavras e pior ainda... Não sabia o motivo de estar me sentindo bem pela primeira vez em semanas.

Modified| Z.MOnde histórias criam vida. Descubra agora