O consultório era completamente branco, com poucos objetos, apenas um sofá para mim e outro para a psicóloga. Na primeira vez em que vim jurava que iria ficar deitado naquelas camas como nos filmes. E lá estava eu pela segunda vez depois de meses, sentado de frente para ela. Ela era negra, tinha o cabelo ondulado castanho muito escuro e usava um jaleco branco, por baixa do jaleco ela vestia uma blusa listrada preta e amarela, uma calça jeans preta e calçava um salto bem simples de mesma cor. Ela estava escrevendo algo que eu não sabia o que era mas parecia ser sobre mim.
-Bom, me conte como passou esses meses- Ela falava seria
Expliquei sobre minhas noites em claro, sobre a tristeza imensa que sinto geralmente e como isso vem afetando várias coisas na minha vida, falei do Apolo e de como ele me ajudava mesmo sem saber de nada do que estava acontecendo comigo e de como ele estava me fazendo feliz. Mencionei dos surtos que vinha tendo sempre, em que quando eu estava na rua me vinha a vontade imensa de me jogar na frente dos carros para me matar, mas eu não fazia isso. Não fazia.
Eu ia falando tudo e ela ia anotado e me olhando com seriedade, quando acabei ela disse:
-A nossa mente tende a achar formulas que parecem simples para um escape da vida, mas não é exatamente para escapar da vida e sim das dores. - Ela fez uma pequena pausa – Olha, para muitos a morte é a saída, mas isso deveria ser passado, hoje a psicologia existe pra isso – continuou – A morte vai acabar com seus sonhos, você pode não ter sonhos hoje, mas se não tem foi porque a depressão tirou de você, tente fazer uma lista de sonhos que você tinha, dos mais simples até os mais difíceis –
- Irei tentar – falei olhando para baixo
-Sua tia e seu esposo conversaram comigo e me disseram que você está chamando eles de "Mae" e "Pai", a anos – Eu a olhei com estranheza e ela continuou – Isso é apenas uma válvula de escape, isso é raro mas acontece de que quando alguém morre o nosso psicológico cria uma forma de escapar da situação recriando aquela pessoa para superar a perda –
- Mas meus pais estão vivos – falei com a respiração acelerada
- Não Travis, seus pais morreram a mais de um ano e seu psicológico fez isso com você para tentar superar, mas isso só foi mais um motivo para sua depressão, juntando a morte deles e da sua ex melhor amiga você – Ela fez uma pausa e continuou – Nos podemos fazer uma regressão para trazer a memorias reais à tona e descobrir a melhor forma de superar tudo isso –
Ela continuou falando, mas eu não queria mais escutar, estava em choque, minha visão começou a ficar embaçada, meu coração apertou de tal forma que eu nunca havia sentido. Então me levantei. A psicóloga me pediu para sentar e beber um como com água, mas eu continuei, fui até a porta, passei por ela e estava em um corredor, era como se eu nunca tivesse passado por ali, caminhei cambaleando um pouco, tinha algumas portas para alguns consultórios, meu deus, eu nunca demorei tanto, na minha cabeça, passar por aquela porta aliviaria todos os meus problemas, eu iria para casa e veria que ela estava errada, mas eu sabia que ela estava certa. Todos os momentos em que tive nos últimos meses desde o acidente veio até mim clareando tudo, lembrei de todas as vezes em que meus tios me corrigiam me pedindo para chama-los do jeito certo. Apesar de tudo, eu não aguentava, eu queria apenas parar a dor, então eu já sabia o que eu devia fazer.
Passei pela porta de vidro, recepcionistas me chamavam pelo nome, cheguei na calçada, na minha frente tinha uma avenida com carros em alta velocidade. Vinha algo grande, eu não enxergava direito pois meus olhos estavam cheios de lagrimas que desciam e naquela altura eu já tinha desistido de limpa-las pois de nada adiantava. Era vermelho e muito grande, estava um pouco longe, mas se aproximava em alta velocidade.
O grande vazio que existia foi preenchido com dor, a dor da perda, primeiro meus pais se foram e eu nem sei ao certo como tudo aconteceu, depois se foi a minha melhor amiga. Eles eram o meu tudo. Eles mantinham meus pés no chão enquanto ela deixava minha vida tao leve que eu sempre ia para o céu com ela.
Me joguei em frente, gritei, ouvi buzinas e tudo se apagou.
NÓS SEMPRE QUEREMOS ALIVIAR A DOR, NAQUELE MOMENTO A DOR SUMIU, MAS SURGIRAM OUTRAS, POIS AS CONSEQUÊNCIAS TE TRAZEM COISAS QUE VOCÊ NÃO ESPERA E A VIDA É ASSIM...
EU NÃO TINHA IDEIA DO QUE VIRIA DEPOIS.
O preto foi o que veio depois, até aquele momento.
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O Cara do Cemitério
ContoCom a morte de sua melhor amiga, Travis não consegue superar o acontecido e isso deixa sua saúde mental instável e apenas, talvez, um primo distante da sua ex melhor amiga faça com que ele se restabeleça no mundo novamente.