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Querida G,
Muitas coisas tem acontecido. Muitas mesmo, coisas que não deviam estar acontecendo. E é engraçado pra mim, já que eu tento manter minha pessoa longe de pessoas muito impulsivas, problemáticas ou namorados (eu ando evitando me apaixonar). Mantenho a minha vida no nível mais comum o possível, ou pelo menos, tento.

E eu acho que eu nunca falei como eu realmente me sinto, sobre você. Quer dizer, eu escrevi cartas que nunca vou enviar e falei com meus pais porque é um dever deles saber disso.

Achei que seria legal escrever sobre isso aqui. Você não sabe quem eu sou, eu não te conheço e, muito provavelmente, você nunca lerá isso. Mas gosto da ideia. Postei este livro imaginando que do outro lado da tela talvez uma pessoa em especial lesse. Mas ela também nunca vai ler, e se ler nunca vai saber que é pra ela, mesmo se alguma vez eu mencionar o nome dela.

Bem, isso vai ser longo, eu também não sei onde eu quero chegar com isso.

Você sabe, tem pessoas que você espera que fiquem na sua vida com você, pra sempre. Você sente que não importa. Você se vê com sessenta anos numa cadeira de balanço vendo seus netos correrem e falando com a pessoa que também está velha, mas está ali. Sente uma conexão forte, talvez mais forte que o casamento, porque hoje em dia é... Como diz aquele livro? Espera, quer dizer, eu vou mencionar a parte aqui: "Mesmo considerando as estatísticas que mostram que a maioria dos casamentos não dura, as pessoas ainda acham que casamento é o estado normal do ser humano. A maioria das pessoas quer se casar. Tem alguma outra coisa que as pessoas fazem em grandes números, com uma taxa de sucesso tão terrível?" É do livro Eu Estou Pensando Em Acabar Com Tudo de Iain Reid.

Eu não tenho sessenta anos, não me casei, não tenho netos e muito menos uma cadeira de balanço, e sei que essas conexões nem sempre são assim (a maioria não é).

Tinha uma menina assim na minha infância, a C, vivia na minha casa, me acordava pela manhã pra brincar, pegavamos piolho uma da outra, fazíamos roupas de alta moda de papel, isso tudo desde os meus três anos talvez, mas ela não estava mais convidada na minha festa de onze. Quero dizer que ela foi de fato uma das melhores amigas que poderiam ter entrado na minha vida e me sinto feliz pela participação dela ali. E se você perguntasse pra "Eu" de anos atrás, eu diria que não havia o que pudesse nos separar e ela diria o mesmo. Mas ela se foi.

Você também estava na lista de três ou quatro pessoas que eu achei que ficariam pra sempre. Mas você, diferentemente de C, você eu realmente gostaria que eu pudesse pegar uma tesoura e facilitar tudo pra te cortar da minha vida.

Porque apesar da nossa conexão ser forte, você não me faz bem, nunca me fez, na verdade. Você é tipo um cigarro. Eu não devo consumir, mas eu me sinto tão bem. (Eu não fumo, é mais pela metáfora mesmo). E no final, porque fatalmente tem que ter um final, você me destrói, acaba com a minha vida.

Estamos nessa relação doente a tanto tempo e você nem percebe (eu acho). Talvez seja a sua maneira de se sentir no comando. Porque você gosta disso, não gosta?

Mas você sempre volta chorando, arrependida pelo que fez, e eu abro os braços tentando por cem passos atrás, porque você me faz ter peso na consciência, você apela pra minha educação. Mas nem meus cem passos atrás me ajudam.

Você é assim, uma tragada é uma tragada. O seu abraço é tão ruim e tão sem volta quanto.

Mas você, já me comanda assim, já me tem. Que bom que não te vejo todos os dias.

Porque aí sim, eu estaria morta.

Acho que é só isso que tenho a falar por enquanto.

Com sinceridade,
M

Um título pra que?Onde histórias criam vida. Descubra agora