10|Dancing in the rain

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O céu estava cinzento, anunciando uma boa chuva. Otávio observou as nuvens escuras pela janela. Estava em casa, sem disposição para trabalhar. 

O relógio marcava 7:09 am, precisava estar no trabalho ás 8:00 am. Ele se sentou com sua xícara de café e ponderou.

A foto em cima do criado-mudo cinza lhe trazia boas lembranças de uma época não muito distante. O sorriso largo da bela mulher denunciava a felicidade presente naquele dia. Otávio lembra como se tivesse sido ontem, mesmo tendo se passado 2 anos. Ele sentia saudade.

Tomou todo o conteúdo do líquido amargo, preferia assim, sem açúcar. Apressou-se para ir para a empresa.

Enquanto estava parado no tedioso trânsito de Nova York, lembrou-se de Mia, mas precisamente na situação de Gabriel. Rose era uma boa pessoa pelo que viu, mas isso confundirá Mia. E se Rose precisar ir embora? Ela tem a vida dela. Sem contar que não dará pra fingir pra sempre. Há sempre um risco a se correr e um preço a se pagar.

O sinal abre e Otávio segue para seu destino.

__ Bom dia sr. Muller. - A recepcionista o cumprimenta com um sorriso perfeitamente ensaiado.
__ Bom dia. - Se limita a dizer.

As vezes Otávio pensa em largar tudo e fugir para qualquer lugar que ninguém o encontre. Uma ilha talvez. Isolado do resto do mundo. Só dar um tempo de tudo. A vida atrás de contratos e gravatas era desgastante. Talvez tenha sido por isso que Kath se foi.

"Você precisa decidir o que é prioridade na sua vida" era o que ela dizia.

Ela se cansou disso tudo. E se foi.

***

O dia havia sido cansativo. Otávio pegou suas coisas e saiu. Ja era noite e estava chovendo.

Dezembro estava chegando e a chuva daria lugar á neve.

Ele deu partida ansiando chegar em seu apartamento e dormir até amanhã.

No rádio tocava uma de suas bandas favoritas, Queen. Cantava um trecho da música quando parou em um sinal. Era sua parte favorita.

Viu o sinal abrir e deu partida, e tudo aconteceu de repente.  Otávio freou bruscamente quando viu uma lambreta cruzar seu caminho. Não foi como em uma daquelas cenas de filme onde tudo acontecia em câmera lenta. O susto pelo impacto não causado deixou Otávio preocupado. Imediatamente saiu do carro e foi ajudar a moça.

__ Você está bem? - Falou em meio ao som do trovão.
__ Sim, me desculpe. Eu não vi o sinal. - a desconhecida falou ao tropeços.
__ Tudo bem. Ainda bem que não houve nada. - Otávio suspirou e ficou calmo - Ah qual o seu nome? Você precisa de ajuda?
__ Meu nome é Amélia. Está tudo bem. Eu só estava apressada, não vi o sinal e não consegui parar.

Os motoristas impacientes começaram a apitar para que Otávio saísse do caminho.

__ Acho que preciso ir. - falou olhando a moça. Coçou a nuca sem saber o que fazer.
__ Tudo bem, mas obrigado por parar. Difícil achar pessoas assim em uma cidade como Nova York. Ah, mas eu nem sei o seu nome...
__ Otávio. Até mais Amélia. - Ele sorriu gentilmente e acenou.

Ele seguiu até seu carro, que ficaria molhado com suas roupas que estavam ensopadas.

__ Merda.

Chegou em casa e largou as chaves em qualquer lugar indo direto para o banheiro.

Enquanto enxáguava o cabelo, Otávio lembrou da moça que quase atropelou. Nem reparou em sua beleza diferente. Com certeza não era de Nova York. Pela pouca luz que havia, vinda dos postes e dos faróis do carro, percebeu que sua pele era bronzeada e seu cabelo, mesmo escondido pelo capacete, era encaracolado.

Ele terminou seu banho e vestiu um pijama confortável. Se sentia sozinho naquele apartamento cinza e frio. Sem as cores quentes de Kath.

Naquela noite, sonhou com madeixas encaracoladas.

****

__ Bom dia flor do meu jardim. - Anna falou dando um beijo nas bochechas de Amélia.
__ Por que essa felicidade toda? - Amélia já sabia que tinha algo por trás daquele sorriso. Ele tinha nome e sobrenome.
__ Christopher me pediu em namoro. Somos oficial. - Anna pulou de alegria.

Amélia revirou os olhos.

__ Eba. - A animação era notável no rosto da jovem.
__ Ai Amélia, qual é? Não ficou feliz por mim? - Anna perguntou fazendo biquinho.
__ Você sabe que esse traste não me desce. - Amélia fala pegando uma grande fatia de torta de frutas vermelhas. Era a favorita dela, receita antiga de sua avó, herdada por sua mãe e agora passada para ela.

Anna revira os olhos e suspira. Sabe que nunca fará a irmã mudar de opinião sobre seu namorado.

Amélia não se metia em sua vida, mas sempre lhe dava bons conselhos. E era bem cabeça dura, não tinha ninguém que tirasse dela alguma ideia.

__ Você já sabe o que vai fazer? - Amélia perguntou. - Sobre a faculdade?
__ Eu não sei ainda. Tenho que arrumar um emprego. Talvez a faculdade me dê um estágio. Eu to perdida. Só tenho esse mês pra conseguir algo ou adeus sonho de estilista.
__ Você deveria começar a colocar currículos. Eu também preciso de um emprego melhor para te ajudar.
__ Você não precisa....

Amélia sai e a deixa falando sozinha pois sabe que vão entrar na velha discussão. Ela lava o prato na pia e segue para o quarto, escolhendo uma calça jeans escura e seu all star surrado. Sua combinação favorita.

A moça toma um banho e se despede da irmã. Suspira com o ar frio de Nova York. Ja mora há 3 anos na cidade e ainda não se acostumou com o clima frio.

Ela monta em sua lambreta e dá partida.

Amélia se lembra de Otávio, na sua preocupação. Nunca tinha visto alguém assim em Nova York, geralmente as pessoas mal se falavam e parece que todo mundo era invisível. Isso que chamou a atenção de Amélia. Não que não tivesse reparado em como ele era bonito. Mas também reparou em suas roupas, com certeza não pertencia ao mundo de Amélia. Não que isso de alguma forma lhe preocupasse, mas era difícil olhar e não ver como eram diferentes.

Ela resolveu não contar do quase acidente para Anna. Não queria que ela se preocupasse em vão. Mas não conseguia parar de pensar em Otávio e em seus olhos doces e preocupados.

Mãe de aluguelOnde histórias criam vida. Descubra agora