Ella iria apagar o capítulo inteiro que escreveu e eu não poderia deixar. Não quando ela estava avançando, se permitindo ver uma possibilidade de algo bom acontecer depois de tantos finais infelizes que criou. Não quando aquilo poderia significar que ela também enxergaria aquilo na vida real. Comigo.
Tirei os fones que tampavam os ouvidos dela e virei a cadeira em que estava sentada para que ficasse de frente para mim, então me coloquei de joelhos, olhando dentro de seus olhos.
- Você deveria estar na sala assistindo o filme - murmurou.
E lá estava ela fugindo novamente, mas não importava quantas vezes fugisse, eu sempre a traria de volta. Faria exatamente como o personagem do livro, insistiria, correria atrás e faria dar certo, por mais que a chances fossem baixas.
- Eu não tô nem aí pro filme, Ella - soltei a respiração, deixando que meu indicador corresse por seu rosto. - Eu prometi te ajudar com esse livro e é por isso que estou aqui, quero ir com você em direção ao final feliz, te fazer olhar para a vida de um jeito diferente, te fazer acreditar que as coisas realmente podem dar certo.
- Eu não sei se consigo...
Os olhos dela estavam cheios de lágrimas e os lábios tremiam como os de uma criança. Ela nunca se mostrou tão sensível para mim e eu nunca a tinha visto tão linda como estava naquele momento. Completamente despida de qualquer barreira emocional que havia colocado sobre si. Ali estavam apenas as inseguranças, o medo de não dar certo, a esperança de ser surpreendida. Naquele momento eu via a Ella de verdade. Humana, cheia de sentimentos e inclinada a ser vencida por eles pela primeira vez na vida.
- Podemos começar devagar... - sussurrei, me aproximando mais até que apenas cinco centímetros separavam nossos rostos. - Podemos começar com o que a personagem sente quando ele a toca.
Continuei a acariciar o rosto dela, sentindo sua pele macia sob meu indicador e a vontade de apressar as coisas, mas ao mesmo tempo de fazer com que tudo durasse uma eternidade. Se eu adiantasse o beijo que queria tanto lhe dar, tudo aquilo acabaria em um segundo e, quando se tratava dela, a vida inteira não chegava perto de ser o suficiente. Eu precisava aproveitar cada momento que tinha ali antes que a realidade batesse à porta e me fizesse acordar.
- Diz pra mim, Ella - murmurei, sentindo sua respiração quente em meu rosto. - Diz pra mim o que ela sente quando ele a toca.
A voz dela estava rouca quando finalmente conseguiu responder.
- Ela sente que está prestes a morrer... - o indicador dela começou a repetir os mesmos movimentos em meu rosto. - ...mas nunca se sentiu tão viva.
Respirei fundo, aproximando meus lábios de seu rosto e vendo seus olhos se fecharem quando a beijei delicadamente no canto da boca.
- E o que ela sente quando ele está tão perto de beijá-la do jeito que sempre quis?
Rocei os lábios suavemente nos dela sentindo um arrepio ao me dar conta do quanto aquilo parecia certo. Segurei as mãos dela fazendo com que se levantasse junto comigo e os olhos que me encaravam de volta estavam turvos, como se estivesse em outra dimensão. A sensação de deixá-la daquela forma me fazia sentir o mais sortudo dos homens.
- Ela sente... - respondeu após o que pareceu uma eternidade. Os dedos que antes estavam em meu rosto se esticaram para a parte de trás da minha cabeça e encontraram lugar em meio aos fios do meu cabelo. - ...que esse beijo irá destruir tudo o que ela ousou pensar sobre o futuro.
Hesitei, tentando descobrir se aquilo era um sinal dela para que eu parasse.
- Mas ainda assim, ela nunca quis tanto alguma coisa na vida quanto isso.
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Eu duvido
RomanceElla sempre gostou de escrever, mas o que ela não esperava era que seu melhor livro fosse sobre a decepção amorosa que ela mesma viveu. Quando percebeu que se inspirar nos próprios relacionamentos dava certo, a cada início de namoro nascia uma histó...