A Metáfora do Titanic

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— Estou um pouco preocupado com você. A cada vez que nos encontramos, você demonstra menos expressões e sentimentos e, segundo as anotações que fiz, tudo indica que o seu nível social está decaindo, em controvérsia com seu nível de tendência à depressão, que só parece estar aumentando.

— Mike... Eu sou o psicólogo.

Em Deerwood, Pensilvânia, poucas pessoas sabiam usar o sarcasmo tão bem quanto Mike Hudson. Para ele, o uso de tal figura de linguagem era tão simples quanto o ato de enrolar um cachecol ao redor do seu pescoço. Infelizmente, isso tornava o trabalho do sr. Will um pouco mais difícil de ser executado.

Sua sala naquele consultório possuía uma janela de vidro que cobria toda a parede, dando uma vista dos prédios da cidade e permitindo a iluminação ser totalmente natural durante os horários em que o sol brilhava. Além disso, também possuía um pequeno lustre branco e bege, mas sem lâmpadas, um quadro pintado à mão por um homem cego e uma escada para um andar acima no canto esquerdo.

— Você realmente não planeja me contar o que existe lá em cima? — Mike questionou, olhando para a escada e juntando as sobrancelhas. — Nós nos conhecemos há algum tempo, você deveria considerar a ideia.

— Isso é tudo que você pensa ao vir para cá? — o sr. Will devolveu em pergunta, sentando mais eretamente em sua poltrona e recolocando os óculos no lugar.

— Basicamente. — respondeu, pendendo a cabeça para o lado esquerdo. — E eu também penso em como o sistema de limpeza de ruas da cidade não está funcionando, esse bairro está parecendo um lixão. Você deveria ligar para a prefeitura, aproveita que não estamos fazendo nada de mais interessante.

O psicólogo balançou a cabeça negativamente com os olhos fechados, logo em seguida repreendendo-se mentalmente, pois não deveria demonstrar seus pensamentos e opiniões pessoais quando não contribuíssem para o crescimento de seus pacientes.

— Sabe do que eu acho que você precisa, Mike? Mais interações sociais. Já considerou voltar a estudar?

— Não.

— Nós falamos sobre isso semana passada.

— Eu lembro. Sua esposa estava tentando engravidar na semana passada. Ela ainda está tentando?

— Isso é extremamente pessoal, mas onde deseja chegar?

— A questão é: assim como sua esposa não mudou de ideia sobre conceder o legado da nossa miséria para uma criatura, eu não mudei de ideia sobre conviver com as provas vivas do legado da miséria humana em forma de adolescentes.

— Mike...

— Não, Will. Eu sei das suas expectativas pra mim, mas não. Eu não planejo voltar a estudar. Principalmente depois de saber que o time de basquete queria o animal símbolo da cidade como mascote, mas o clube de drama protestou contra porque sentiu inveja. Você sabe qual o animal símbolo da nossa cidade?

— Um veado?

— Um veado. Exatamente.

Não era uma mentira. O protesto havia acontecido na praça de alimentação da Deerwood High School e no final da tarde haviam uniformes de basquete e roteiros de Hamlet rasgados por toda a parte. Talvez porque tivesse uma mente que era excentricamente literal e lógica, mas Mike não entendia como um veado conseguia ter criado tanta confusão. Nem sequer era um veado tão bonito.

— E quanto ao grupo de apoio que eu indiquei?
Mike abriu a boca para responder e então a fechou, lembrando-se da tarde em que passou no grupo de apoio à adolescentes.

O Projeto Inesperado de Mike HudsonOnde histórias criam vida. Descubra agora