Sangue Frio

Histórias por detrás de um Mistério

   A água quente e límpida do chuveiro ia de encontro com o corpo de Noah. Ele ligeiramente levantava sua cabeça, e, passando as mãos sobre os olhos, tirava o excesso do líquido de cor de vinho do rosto. Com um pouco mais de força, retirava todas as impurezas de seu corpo. O vapor dominava todo o banheiro, embaçando o espelho por completo. Despejando o shampoo na palma de sua mão, e em seguida esfregando o produto no couro cabeludo, o garoto sentia a neve, que até aquele momento se concentrava em sua cabeça, se desfazer e voltar ao seu estado líquido, escorrendo juntamente com a água do chuveiro.
O barulho da água do chuveiro sendo aquecida eletricamente é interrompido quando o menino gira no sentido horário o registro. Esticando seu braço para fora do limite imposto pela cortina, Noah toma para sim uma toalha branca, com um pequeno bordado em duas pontas. O cheiro suave e agradável em conjunto com a maciez do algodão, formavam o combo perfeito de um bom término de banho. Enrolando a toalha na altura de sua cintura, ele empurra horizontalmente a cortina e sai de debaixo do chuveiro pensativo. Pára em frente ao espelho acima da pia e posiciona suas mãos na borda da pia de cerâmica. Se debruça sobre a mesma, e com uma das mãos, limpa o vapor que embaçou o vidro com um movimento circular. Abria uma das gavetas que haviam ali e retirava de lá seu barbeador elétrico. Empurra o botão que ligava o disposto e, no mesmo instante, sente ele tremer, mostrando que ainda havia bateria. Ajustava o pente e passava sobre a região de seu pescoço, em seguida, subia para as bochechas e por fim, apara a região de seu queixo e o bigode. Depois de fazer sua barba, destranca a porta e se prepara psicologicamente para sentir a diferença de temperatura ao abrir a porta. E assim o faz. Seus pêlos rapidamente se arrepiam e o menino se estremece por completo.
Noah segue para seu quarto, onde já deixara separado uma roupa em cima da cama; uma camiseta sem mangas preta, e por cima dela vestiria um suéter que em sua estampa, intercala entre tons de verde e cinza. Para a parte inferior, cobria-se com uma cuca box branca e uma calça de moletom também de cor esverdeada. Para finalizar, encaixava seus pés em um tipo de pantufa, e caminha até o rádio que ficava na estante ali perto. No caminho, arremessa a toalha na maçaneta da porta, deixando-a pendurada. Pressionando o botão Power do rádio e girando o de volume no sentido horário, escutava-se apenas um grande e incômodo chiado. Em dias de verão já era quase impossível receber sinal de rádio naquela cabana, ou seja, era de se esperar que no inverno, a única possibilidade era escutar aquele fatídico ruído. Todavia, essa era uma das únicas formas que o garoto poderia se distrair naquele instante, por isso, acaba decidindo escutar o som.
   Se aproximando novamente de sua cama, Noah balança os pés para retirar as pantufas e deixa a gravidade agir sobre seu corpo, caindo sobre o edredom branco que cobria toda a cama. Olhando para o teto, o menino agora aguarda ansiosamente a chegada do sono.

Alguns meses atrás...

   A cadeira de couro escuro girava lentamente no escritório do novo emprego do recém formado advogado. Enquanto rodava a cadeira, observava atentamente todos os detalhes, mas duas coisas prendiam mais ainda sua atenção; seu diploma e sua licenciatura emoldurados num lindo quadro de madeira de acácia, um ao lado do outro, pareciam refletir os primeiros feixes de luz do dia que entravam ligeiramente pela janela à frente dos mesmos. Para finalizar o ritual de inauguração, o homem retira de sua maleta uma plaquinha de metal. Eleva até a altura de seus lábios e junta seus lábios fazendo um biquinho, assim tocando sua boca no pedaço de metal. Agora apoiando a placa à mesa, o rito estava finalizando. O Dr. Will Milborne estava finalmente pronto para atuar na área a qual estudou anos para realizar.
   Toda a documentação de seu primeiro caso já estava posta em sua mesa. O advogado de defesa, teria que provar que seu cliente, acusado de agressão física e verbal contra sua ex- companheira, era inocente. Era uma tarefa que de princípio, transparecia ser extremamente complexa e muito arriscada para ser feita por um novato na área. Porém, provas de câmeras de segurança que comprovavam a inocência de seu cliente eram a chave para a vitória, afinal, elas mostravam claramente que o homem estava em uma loja de fast food no horário estimado, apresentado no relatório de corpo de delito, que a ex dizia ter acontecido os atos de agressão. A parte realmente amedrontadora era encarar um dos melhores advogados da região: Kyle Blake. A dicção do sujeito era impecável, seu poder de persuasão mudava a opinião de qualquer um. E isso deixava Will apreensivo, mas com um desejo enorme de vitória. Já imaginou? Um "caboclo" que recebeu sua primeira causa, vencer de um renomadíssimo nome da advocacia local. Certamente viraria uma lenda entre todos da região. E era esse o plano.