Nos dias seguintes, parecia que a vida estava colocando Yifan e Kyungsoo no mesmo lugar de propósito. Parecia até magia negra.
Em um dia se esbarraram no banheiro, no outro, tiveram os pedidos trocados no Burgguer’s por desatenção de Junmyeon que conversava animado com Sehun antes de entregar os pratos, num outro, acabaram trocando de skate por poucos segundos depois de discutirem sobre quem havia chegado na rampa grande primeiro.
Os xingamentos cabeludos seguiam até que um dos dois cansasse e desistisse, virando a cara e ficando o mais longe possível um do outro, coisa que já estava virando rotina para todos que eram frequentes no Juventude.
— Vai se foder! É claro que meu 360 triple flip é melhor que o seu! Tu errou ele todas as vezes, meu irmão — uma galera estava no Burgguer's aquele dia, inclusive Yifan e Kyungsoo, que discutiam mesmo estando em mesas diferentes.
— Seu cu! — bradou, batendo a mão na mesa de forma estrondosa, mas as conversas eram tão altas que isso sequer atraiu a atenção de alguém. — Se acha que eu não faço direito é porque nunca me viu de verdade. Sou bem melhor do que você imagina, porra — mostrou o dedo do meio, desviando de uma batata frita jogada por Yifan. Mesmo sendo inimigos, estavam sempre nos mesmo lugares, que era quase como se fizesse parte do grupo. Sehun e Jongdae não estavam gostando disso.
— Vão se foder, vocês dois — o mais novo disse de mau humor, se levantando da mesa e indo no balcão conversar com Junmyeon. Estava de saco cheio de Kyungsoo sempre tão perto ultimamente. O Wu viu o amigo sair, voltando a comer o lanche mais tranquilo.
O Do estava sozinho na mesa ao lado, enquanto os outros se aglomeravam na mesa de sempre. Chanyeol e Baekhyun estavam lado a lado. Ultimamente estavam muito juntos, dormindo na casa um do outro e tudo mais, Yifan sentia-se perdendo o melhor amigo.
— Ei, Chanyeol, que tal a gente ir pro Juventude de noite? Igual a gente fazia antes — sugeriu, vendo o Park sorrir meio amarelo e limpar a garganta.
— Hoje? É que... eu combinei de dormir no Baek — coçou a nuca, meio sem graça. Yifan semicerrou os olhos, apontando acusadoramente para o Byun, que piscou várias vezes.
— Está tentando roubar meu melhor amigo, Baekhyun? — o outro riu, o rosto ficando vermelho enquanto negava com a cabeça e as mãos.
— Não estou... roubando seu melhor amigo — afirmou, mas algo em seu tom deixou Yifan inquieto. Baekhyun riu, até empurrando o Park. — Toma, pode ficar — ambos riram e aquele sentimento de antes logo se dissipou. Seus amigos ainda pareciam os mesmos e tudo estava bem.
— Ah, vem aqui com o tigrão! — deu um tapa de leve na nuca do Park e bagunçou o cabelo do melhor amigo enquanto fingia um mata leão. Até Jongdae ria, observando os amigos enquanto descansava a cabeça no punho fechado. Ali, Yifan sentia que estava em casa.
Na outra mesa, Kyungsoo, vez ou outra, olhava de rabo de olho para Yifan, sentindo um pouco de inveja. Porém, tudo o que fez foi terminar seu lanche em silêncio, pagar e sair, mesmo que a cabeça estivesse cheia de coisas. O chinês viu o Do ir embora, sentindo o clima ficar menos tenso automaticamente. Parecia que as coisas ficavam tensas sempre que o outro estava por perto e isso deixava o Wu inquieto, de certa forma.
Mais uma vez passou um tempo pensando no Do antes de dormir.
[...]
Ter quinze anos às vezes poderia ser um porre, mas Yifan nem poderia reclamar tanto, afinal tinha até que bastante liberdade mesmo com a pouca idade. Por isso, quando disse que ia dar uma volta pelo bairro à noite daquele dia, a mãe só pediu para que ele tivesse cuidado e não voltasse tarde para casa.
Então, lá estava o chinês em cima de seu skate passeando pela rua que era iluminada pelos postes de luz. Já que estava próximo, decidiu dar uma passadinha no Juventude, estava se sentindo misteriosamente disposto naquele final de tarde.
Desceu do skate logo na entrada do parque, optando por caminhar sozinho para espairecer. Até respirou fundo em um certo momento.
O Juventude existia desde que a cidade foi fundada, sofrendo apenas algumas reformas em prol do melhor para a comunidade. Ele ganhou vários metros da área onde, agora, estavam as pistas, mas também tinha uma grande quantidade de árvores e zonas verdes perfeitas para piqueniques e fins de semana com a família — Yifan mesmo já viera várias vezes com a mãe deitar na grama e olhar as nuvens quando era mais novo.
O negócio é que o Juventude estava presente na vida do Wu desde muito cedo, passando a se tornar cada vez mais depois que o chinês descobriu no skate uma nova paixão. E, apesar de passar quase que integralmente seu tempo na piscina ou nas rampas, conhecia o parque de cabo a rabo como a palma de sua mão e sabia que naquele horário, mesmo que o parque estivesse sempre aberto, quase ninguém andava por ali. Por isso, quando ouviu as vozes conhecidas seguidas de sons de beijo, não conseguiu se refrear antes de ir para de onde vinham.
Wu se escondeu atrás do carvalho centenário, seu tronco sendo grosso o suficiente para que não notassem sua presença ali. Foi então que viu, não muito longe dali, o melhor amigo abraçado a Baekhyun. E ele sabia que era o Byun, porque este havia pintado o cabelo recentemente de vermelho berrante.
Yifan cobriu a boca, espantando quando o abraço deu lugar a um beijo apaixonado. E, pelo visto, não era a primeira vez que faziam isso, porque a língua dos dois pareciam se conhecer muitíssimo bem. Caralho! Fazia pouco tempo que tinha perdido o bvl, saber que Chanyeol estava ficando com alguém e não tinha lhe contado era quase tão chocante quanto esse alguém ser Baekhyun, que também era um garoto e amigo dos dois.
Chanyeol era gay? Como gays faziam... você sabe...? Sempre achou que as pessoas só virassem gays depois de mais velhas, por isso ver o amigo aos beijos com outro garoto com apenas quinze anos era assustador e ele não conseguia entender. Assim, só saiu correndo, pouco se importando se o barulho dos galhos secos pudesse o denunciar do que havia visto.
Quando chegou em casa, tudo o que fez foi cair na cama e tentar dormir, torcendo para que fosse apenas um delírio.
No fim, passou a noite toda em claro e não chegou a nenhuma conclusão.
[...]
Yifan estava puto. Acordou assim, e saiu de casa da mesma maneira. Dormira pouco e todos sabiam só de olhar, buscando ficar longe dele o máximo possível.
— Mano, olha a cara do Wu — Jongdae comentou quando o chinês chegou no Juventude duas horas depois do costume. — Não sei vocês, mas eu nem vou chegar perto, fui! — e saiu vazado, optando por praticar com seu skate em uma rampa longe.
— O que será que aconteceu? — Sehun questionou mais para ele mesmo, vista que tanto Chanyeol quanto Baekhyun estavam distantes naquele dia. — Deve ter sido algo sério para tirar o sono dele, mas tenho medo de perguntar... — continuou falando sozinho.
Baekhyun estava com medo e Chanyeol não sabia o que fazer para acalmar o namorado. O Byun não queria ser taxado de aberração e isso o inquietava, tanto que as palavras dos garotos entraram por um ouvido e saíram pelo outro. O único melhorzinho era o Park, mas até ele sabia que quando Yifan estava daquele jeito o melhor que faziam era ficar longe.
Todos sabiam.
Todos, exceto Kyungsoo.
O Do havia dormido muitíssimo bem naquela noite, por isso, quando chegou ao parque estava radiante. Vestia suas comuns roupas caras e tênis de marca, ostentando o shape lançamento e os rolamentos novos da EXODUS, a top #1 no mundo dos skatistas. Aproveitou que Yifan estava sozinho, decidindo se exibir um pouco.
Havia se tornado um hábito provocar um ao outro mostrando o quão bons eram naquilo que faziam — e Kyungsoo era ótimo acima da média. Fez questão de realizar as manobras complexas que sabia bem em frente onde o Wu estava sentado, conseguindo a atenção dele exatamente como queria. Aquilo o incentivava ainda mais, e, no meio de uma das peripécias que executava em cima da prancha, acabou dando um sorrisinho debochado para o chinês.
Se o Do soubesse que nos dias que Yifan não dormia bem o recomendado era se manter longe, jamais teria começado aquelas provocações. Porque para Yifan aquela fora a gota d’água. Toda a raiva que estava sentindo canalizou em Kyungsoo, e, de repente, todas as coisas que estavam lhe dando nos nervos eram culpa do novato recém-chegado da cidade grande. Por isso, fez questão de o pegar pelo colarinho e apertar o deixando na ponta dos pés para que pudesse olhar nos seus olhos. Kyungsoo ficou com um pouco de medo pela forma como eles faiscavam raivosos.
— Tá maluco, cara?! Quer levar um sacode, aqui, na frente de todo mundo?! — seu tom era alto, ele praticamente gritava, quase espumando. O Do tentou se afastar, mas o chinês era incrivelmente forte quando com raiva.
— Me larga! — bradou. Nisso, a atenção do pessoal já estava neles e Jongdae, que já vinha na direção do Wu para lhe mostrar um cartaz que lhe chamou a atenção, apertou o passo a ponto de correr, grudando no braço do amigo para que soltasse o outro. Até largou o papel grande de qualquer jeito no chão, pisando em cima sem querer.
— Wu, solta ele! — gritou. Chanyeol também havia chegado, empurrando o maior para longe, finalmente libertando o Do do aperto, que tossiu um pouco sem ar jogado no chão e com o corpo trêmulo.
— Você tá louco?! — Chanyeol perguntou e Baekhyun se abaixou para conferir se estava tudo ok com o garoto. O Park odiou a forma como haviam se tornado o centro das atenções, tratando de dispersar o pessoal: — O que estão olhando?! O show acabou, saiam! — quem ainda estava prestando atenção, saiu, e tudo voltava a sua normalidade. Olhou para o chinês, que não encarava ninguém, com o cenho franzido. — Que merda deu em você? — o outro revirou os olhos, ainda bufando com uma raiva repentina incontrolável.
— Tá tudo bem? — Yifan ouviu Baekhyun perguntar ao Do e aquilo elevou novamente sua fúria.
— Esse filho da puta debochado me provoca e você ainda fica se importando com ele? Tomar no cu! — encarava, agora, os dois de frente. Kyungsoo já estava de pé quando Yifan se aproximou novamente, com Chanyeol impedindo com o braço que ele grudasse no pescoço do menor novamente. O chinês apontou o dedo bem no rosto do Do antes de começar a falar — Você é um pau no cu e eu te odeio! — tinha tanta raiva no olhar e no tom do Wu que Kyungsoo sentiu-se realmente mal, pela primeira vez, com aquelas palavras.
O maior desviou os olhos do Do, pairando no chão e vendo ali a oportunidade perfeita para se livrar daquela pedra no sapato. Era o cartaz que Jongdae havia trazido na intenção de mostrar o evento que ele estava esperando desde o início do ano: o campeonato de skate na cidade vizinha. E ali estava sua chance perfeita, mesmo que fosse movido pela raiva que sentia no momento.
— Me dá esse cartaz — pediu a Jongdae, que olhou para baixo notando ser o anúncio da competição que deixara cair antes. Yifan passou os olhos rapidamente antes de segurá-lo com uma mão e apontar o evento com a outra. — Aqui — mostrou. — Não aguento mais você, então vamos fazer um acordo — o desprezo na voz continuou deixando o Do mal, tanto que seu peito doía machucado. — Vamos competir — sugeriu. — Mas, quem perder o campeonato, vai ter de entregar o skate pro ganhador e nunca mais pisar no Juventude de novo — todos os amigos de Wu ficaram surpreso, entretanto Kyungsoo se manteve com a mesma expressão.
— Wu, isso não é exagero? — Sehun, mesmo que odiasse Kyungsoo, era sensato o suficiente para ver o quão demais aquilo era. — Entregar o skate... nunca mais pisar aqui... não acha qu-
— Tudo bem — Kyungsoo o cortou. — Eu aceito o desafio. Se eu perder, nunca mais volto aqui e te entrego meu skate — estendeu a mão que fora logo agarrada pelo Wu, firmando aquele acordo idiota demais até para eles. — Mas, até que a competição aconteça, quero poder treinar aqui numa boa, belê?
— Já é — sorriu malvado. — Aproveita seus últimos dias de Juventude, Do — e com uma expressão vitoriosa, Yifan juntou suas coisas e foi para a rampa mais longe de onde estavam.
Chanyeol e os outros estavam surpresos, só esperando que o chinês não surtasse caso perdesse. Wu era bom, não iria perder para Kyungsoo, certo? Queriam muito acreditar que não.
O grupo se dispersou, entretanto Kyungsoo ainda tinha os olhos um pouco perdidos. Esse era o tamanho da repulsa que Yifan sentia por si? E pensar que a primeira vez que colocou os olhos no chinês achou que pudessem ao menos ser amigos... era um tolo mesmo.
Com um suspiro de pesar, o Do ajeitou sua camiseta e subiu em seu skate. Se Yifan queria competir consigo naquilo que ele mais amava fazer, ele iria.

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Zóio de Lula
FanfictionYifan é um skatista que, junto de seus amigos, domina o Juventude, gostando de se exibir enquanto faz suas manobras radicais. Porém, tudo muda com a chegada de um novato na cidade que, além de ser um playboyzinho, manda muito bem no sk8, ganhando de...