Incubus - Arcanjo Miguel

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Em algum não-lugar o Arcanjo Miguel escutou a moça orar a São Miguel antes de deitar,  imediatamente enviou um de seus anjos em auxílio.

O servo pressentiu o Gato Preto e preparou-se para a batalha, esses espíritos custam a libertar uma vítima. "A paz esteja com você" e o Gato Preto pulou nas costas da jovem, o anjo conseguiu identificar o que restava de uma mulher sofrida que em sua última encarnação fora paga para seduzir e degolar um homem influente, depois da morte arrependeu-se do assassinato e escapou das sombras, porém continuava capaz de "vender" alguém para achar-se poderosa, virou um gato preto. Apesar de ser um espírito, conseguiu interromper a respiração da garota, enquanto gritava para que o anjo as deixasse. O anjo puxou o espírito de Diná para fora do corpo e o Gato Preto ficou confuso entre continuar agarrado ao corpo ou tentar recuperar a alma. Qual seria sua prisioneira? O anjo mantinha o espírito Diná a salvo, enquanto o corpo morria, porém, antes da tragédia ocorrer, a Voz surgiu e exorcizou o Gato Preto com suas chamas, que assustado rastejou para um canto escuro do quarto, e Rafael avançou por cima do próprio irmão, pois sua amada estava morrendo e mesmo sendo o Portador da Cura não poderia evitar, ela passou à regência de Miguel. Lutaram como inimigos e o anjo invocou seu príncipe. Com a chegada de Miguel, o Guerreiro do Senhor, os dois pararam imediatamente, através da oração, a moça sem saber, havia feito sua escolha e precisavam saber o que faria dela. Sem mencionar a situação miserável dos irmãos, pediu a Rafael que restaurasse a respiração da jovem, ela não merecia morrer pela luxúria deles. Em seguida falou ao Gato Preto, usando o nome de sua alma, Tânia, convidou para a luz e redenção, lembrou-a de sua filha e de seus descendentes na Terra, como seria boa a reunião na eternidade. Os pensamentos felizes finalmente redimiram Tânia, e o anjo com que havia lutado a levou.

Sobraram Rafael, Gabriel, Miguel e a moça. O Guerreiro permitiu uma despedida, o primeiro foi Gabriel, que a beijou apaixonado enquanto ela tentava abrir os olhos, ainda estava fraca demais. O adeus de Rafael foi o mais difícil já pronunciado, pediu perdão pela fraqueza e jurou que a pertenceria eternamente, por último sussurrou em seu ouvido "eu sei que você não gosta que eu durma tarde em plena quarta-feira, mas eu juro que vou à aula amanhã".

Sozinhos, Miguel secou suas lágrimas e a colocou na cama, compreendeu os irmãos, ela era moldada para ser irresistível a seres angelicais. Derrubara dois poderosos Arcanjos e agora seria seu guardião escolhido. Que fazer? Separou Diná do corpo para sentir apenas sua força imortal, o olhar dela era intimidador e achou por bem não estar em sua presença materializado. Mais sensato que os outros, concluiu que aquela era uma vencedora nata, seria uma convivência difícil, tomou Diná pela mão e levou- a para seu principado.

***

Proporcionou um belo sonho, com um lugar cheio de verde, estradinhas de chão e casas de interior. O barracão principal tinha nos fundos um lago com barquinho para passear sob o sol. Comeram frutas direto das árvores e Miguel mostrou- lhe sua coleção especial, tartarugas de todas as espécies e de variados períodos de evolução desse animal. Contou que o fascínio por tartarugas veio da estratégia de sobrevivência desse animal, enquanto a maioria evoluía no sentido da agilidade, tartarugas tornaram- se mais lentas e cascudas, riu, ou como dizem os humanos: "menos é mais". Assistiram o pôr- do- sol, quando na Terra o sol nascia e chegou a hora de Diná retornar à matéria.

O dia raiou cor- de- rosa e laranja, e Diná viu sentado em sua cama um homem mais lindo do que os outros, negro, com olhos estreitos e barba de faraó, sua aura transmitia sabedoria e bondade, parecia um rei, atraiu-o a se inclinar sobre ela e trocaram um longo beijo. Ele desapareceu e a moça pensou ter sido mais um sonho. Nunca mais teve alucinações com esse ou qualquer outro visitante noturno.

***

Anos depois, já uma mulher adulta ela chora num táxi, está triste, pois gostaria que o pai do bebê a acompanhasse nas consultas. Brigaram três semanas atrás, o motivo foi o diagnóstico de uma deficiência no filho. Ele exigiu o aborto, é um homem obsessivo com perfeição, abandonou o apartamento e nem a procura há dias. Ela se questiona se está errada, é crueldade trazer um deficiente ao mundo? Acredita do fundo do coração que não, todos têm direito à vida. O celular apita um sinal de mensagem "Me perdoe, fiz besteira. Estou aqui em casa esperando para ser família com vocês". Ainda chorando e com um sorriso nos lábios ela digita a resposta "Essa é a vida que eu quero, vai dar tudo certo, acredite que Deus nos presenteia com um de seus anjos".


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