Capítulo 2

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Descia as escadas quando no meio dela parou ao ver a pessoa que saía da biblioteca. Como se a percebesse, o homem de meia idade a encarou brevemente de modo intimidante e duro. Estranhando aquela atitude, quis pela milésima vez ter uma oportunidade de se encontrar sozinha com os pais, afinal, era no mínimo estranho o que acabara de acontecer.

Curiosa e pronta para saber do que se tratava a visita daquele estranho que saíra porta fora, simplesmente a ignorando, desceu as escadas rapidamente. Foi quando um movimento no canto lhe chamou atenção. Sua mãe, silenciosamente fazia um sinal para que ela se aproximasse do onde estava.

A expressão no rosto de Vera era de preocupação e angústia, e causou um alarde repentino em Maria Laura. Tentou correr para chegar mais rápido, mas ao fazer isso, a mãe a conteve fazendo sinal para que a mesma mantivesse silêncio e calma.

— Não faça tanto barulho, Maria Laura! Seu pai pode nos ouvir! — sibilou.

— Ouvir o quê, mãe?

Como se lembrasse repentinamente de algo, a mulher a olhou com espanto.

— Oh, meu amor! Eu não deveria estar aqui falando disso com você. Seu pai me disse para te contar depois do baile de caridade... Não o leve a mal, a intenção era não estragar as coisas no dia de sua chegada, mas eu simplesmente não posso ... — confessou olhando dramaticamente em direção a porta da biblioteca.

— Deixe de suspense! Diga logo o que tem a dizer! — Já estava sem paciência, mas desconfiando do que se tratava. — Vai me dizer que o meu pai tem desperdiçado dinheiro apoiando alguma mulher vagabunda outra vez?

Por um momento, torceu para que fosse aquilo, mesmo tendo noção do que de fato havia acontecido. Porém, se assustou quando sem conseguir reprimir o soluço que lhe apertava a garganta, sua mãe negou com os olhos cheios de lágrimas. Ali, o chão de Maria Laura se abriu. Estavam pobres.

— É pior que isso, filha, muito pior! Não sei como lhe dizer...— de repente parou e a encarou, num rompante despejou:— Seu pai está sendo obrigado a vender o Solar.

Um golpe como se lhe tivessem arrancado o ar. Fora exatamente o que ela sentiu naquele momento. Mas sem saber bem o que dizer, manteve o sangue-frio. Lembrou-se de como Luíza havia dito mais cedo, e se sentiu ainda mais estranha! Não era apenas sem dinheiro! Ficariam sem o principal negócio que tinham! Era o Solar que os impulsionava a serem o que eram ali naquela cidade!

Como puderam esconder isso dela?! Como viveriam com aquela situação dali em diante?

Sabia que estava sendo infantil em ter aquele tipo de pensamento, mas a ideia de ficar pobre a assustava mais do que tudo! Não sabia de fato como reagir. Sua vontade era de gritar as várias perguntas que tinha engasgadas, mas tentava se controlar a todo custo. Percebendo que a qualquer hora seriam surpreendidas, envolveu a mãe em um braço e a levou até um lugar mais reservado. Precisava saber mais do que nunca e detalhadamente sobre a situação. Encarou a mãe com olhar grave, ao passo que a mesma, devolveu com a mesma intensidade.

— Isso só pode ser algum pesadelo...

— Você acha que eu não me sinto da mesma forma? — perguntou com a voz oitavada, já limpando as lágrimas — Vou contar tudo, porque diferente de seu pai, eu acho que você deve saber o porquê de o Solar ser vendido... — dizendo isso, rumou para o canto do jardim mais reservado. — Aquele homenzinho asqueroso, que você viu acabando de sair do escritório... tem vindo todos os dias aqui durante as duas últimas semanas. A realidade é que seu pai sofreu uma série de reveses financeiros. — Desabafou de olhos marejados. — A aquisição do cargo de diretor executivo da companhia agrônoma só trouxe desgraças para esta casa! — Maria Laura escutava tudo com cenho franzido— Houve boatos sobre a divulgação de informações confidenciais, e seu pai teve de pedir demissão da diretoria, embora jure que não teve nada com isso, e ainda tem mais! — bradou — Há um tempo atrás, Otávio alterou uma série de investimentos na bolsa de valores, pois acreditava que os rendimentos estavam muitos baixos. Alguns dos novos investimentos eram de alto risco, mas ele pensou que valia a pena arriscar. Acabamos por perder e muito! Um verdadeiro desastre! Fomos obrigados a vender, filha, porque não temos mais condições de sustentar a casa. O baile de caridade de amanhã será o último que daremos! Ah, que vergonha! — Chorou mais forte.

Uma Doce LiçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora