Capítulo Três

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QUEBRADA

Hoje completa um mês que voltei para a faculdade, ainda custo acreditar nas pequenas e preciosas mudanças em minha vida. A primeira foi voltar a cursar direito, nem no meu melhor sonho poderia imaginar que Salvatore permitiria que eu voltasse a estudar.

Continuo não demostrar medo em sua presença, algumas vezes o pego me observando, não sei o que se passa em sua mente tão perversa, mas sou grata por ele nunca mais ter me violentado sexualmente. Depois daquela nossa primeira vez de sexo sem violência, continuo me entregando a ele toda as vezes que ele me quer, com isso ele não age mais como um monstro, se a situação fosse outra poderia até dizer que fazemos amor, mesmo que esse sentimento não existe da minha parte, muito menos da parte dele. Salvatore deve desconhecer esse sentimento. Todos somos instrumentos em suas mãos, o que nos resta é dançarmos conforme a música.

Meu marido não tem me agredido mais fisicamente, porém verbalmente continua o mesmo de sempre. Ainda mantenho a distância, só me aproximo quando solicitada. Considero uma vitória essas mudanças, tenho que agir com cautela para não colocar tudo a perder, um homem como meu marido é imprevisível.

Nina e eu estamos cada vez mais amigas, ele mora com seus pais e dois irmãos. Um tem vinte e quatro anos e o outro vinte sete. Seu pai é um grande empresário e segundo ela ele é aquele tipo de homem família, que faz de tudo para cuidar e proteger os seus. Nina tem um terceiro irmão que está no Brasil. Ele tem trinta anos e é advogado, foi para o Brasil a serviço da empresa do seu pai que tem negócios em solo brasileiro.

Sou apaixonada pelo Brasil, é um país solar, as pessoas são gentis e felizes. A sua maioria humilde, porém felizes, a alegria é algo que já nasce com o brasileiro. Passei um período de dois anos no Brasil com meus pais quando eu tinha dez anos, depois retornamos quando eu fiz quinze anos e ficamos mais um ano por lá, aprendi um pouco de português, é uma língua bem difícil, porém, muito bonita.

Pego minha mochila e saio da sala conversando com a Nina, de repente sinto a mão de Giovanni no meu braço, ele praticamente me arrasta pelo corredor, alguns alunos ficam me olhando, o sigo sem questionar, pois, sei que tem dedo do meu marido nisso. Sinto vergonha de passar por isso na frente de tantas pessoas.

Chego no estacionamento Giovanni praticamente me joga dentro do carro, nele há dois homens, o motorista e o carona, Giovanni fica atrás comigo. Quando chego em casa há vários soldados espalhados por toda ela, e fortemente armados. Vejo Salvatore que nem me olha nos olhos, friamente ele diz ⸻ levaram Donna. Naquele momento meu mundo desaba, aquela frase vem como um concreto sobre mim. Sou retirada do chão pelo Giovanni e outro homem.

⸻ Portala in camera da letto e assicurati che non se ne vada.

Salvatore manda Giovanni me levar para o quarto e certifica-se que eu não saia de lá, diz em italiano como se eu não pudesse entender. Não tenho forças para perguntar nada, no momento só quero ter minha filha de volta em meus braços. O frio Salvatore não faz a mínima questão de me dizer se tem um plano, para trazer minha Donna, nossa filha de volta.

Meu corpo está pesado, Giovanni me coloca em seus braços. No quarto ele me coloca sobre a cama, as palavras do Salvatore martelam em minha cabeça ⸻ levaram a Donna, me derramo em lágrimas, o medo de perder minha filha me atingi, homens como Salvatore são capazes de tudo. Me sinto impotente trancada nesse quarto.

Se eu não tivesse desabado na frente dele, talvez ele deixaria que eu ficasse com ele, poderia saber mais do que realmente está acontecendo, mas como encenar com a minha filha em perigo, como manter a calma vendo o meu maior medo sendo realizado. Sempre soube que um dia isso poderia acontecer, um homem como meu marido tem inimigos por todos os lugares, e nesses casos sempre quem paga a conta é a família. Infelizmente eles levaram a minha filha e não a mim.

Não tinha como continuar meu teatro, Donna é a única razão pela qual me mantém viva durante todos esses anos. Todas as vezes que fui trancada naquele quarto escuro hesitei em acabar com a minha vida por causa dela.

⸻ Quero minha filha, grito a todos pulmões. A porta é aberta, Giovanni surge e me diz que precisamos ir.

⸻ É a Donna, vocês a encontraram? Vocês acharam minha filha?

Ele não diz nada, com as mãos indica que eu preciso o seguir, na sala dois homens nos acompanham até o carro, não são os mesmos de antes. A casa já não está tão tumultuada, os seguranças de sempre transitam por ela. Paramos na porta de um hospital e meu coração acelera. Giovanni anda em passos longos e eu praticamente corro pelo corredor do terceiro andar deste hospital. Na porta do quarto têm quatro homens. Minhas pernas congelam, não consigo sair do lugar

⸻ Minha filha, minha Donna

Giovanni pega em meu braço com delicadeza, me olha com tristeza em seus olhos, faço uma oração interna e me forço a prosseguir. No quarto minha filha está ligada a alguns aparelhos, Salvatore está sentado em uma cadeira com o rosto escondido na cama da nossa filha. Giovanni pega uma cadeira e coloca do outro lado, me ajuda a sentar. Não consigo dizer uma só palavra, meu corpo e minha alma doem.

Minha menina.

Minha alegria.

Minha vida.

Olho para seu corpo pálido sobre a cama, praticamente sem vida. Um médico entra no quarto e pergunta ao Salvatore se ele já está pronto, ele levanta a cabeça e diz que sim. Olho para ele que age como se eu não estivesse ali, depois para o médico que percebe que não sei do que se trata.

⸻ Tua figlia? Confirmo receosa ⸻ ela teve morte cerebral, demos um tempo para seu marido se despedir para que possamos desligar os aparelhos, já temos a sua autorização.

Olho para Salvatore com todo ódio possível que extraio da minha alma. Como ele pode vir sem mim para o hospital, autorizar que desliguem o aparelho da minha filha sem antes me dizer que a perdemos, que por causa dele mataram nossa filha?

Ele se levanta ainda sem me olhar, beija Donna na testa e olha para o médico.

⸻ Spegnere, dá a ordem para que desliguem e saí do quarto.

Lanço meu corpo sobre minha filha e chamo por ela aos berros, meu pranto é tão alto que algumas pessoas aparecem na porta. Giovanni me tira de cima da minha filha e eu caio de joelhos no chão. Antes eu pensava que tudo o que passei era insuportável, mas nada se compara a essa dor, meu coração está em pedaços. Minha alegria, minha vida se foi. Minha menina era meu sol na escuridão da minha vida, ela era a luz que me iluminava naquele quarto escuro, o quarto da minha punição.

Os médicos retiraram tudo que está conectado a ela, Giovanni me ajuda a levantar, me aproximo do pequeno corpo da Donna e deito ao seu lado

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Os médicos retiraram tudo que está conectado a ela, Giovanni me ajuda a levantar, me aproximo do pequeno corpo da Donna e deito ao seu lado. O doutor diz que em questão de minutos ela daria seu último suspiro, ele havia retirado o respirador. Canto para minha menina uma canção antiga que eu ouvia quando criança, Donna adorava essa canção. Abraçada ao seu corpo frágil, em meio ao choro entoo a canção, no fundo ainda tenho esperança que ela vai acordar e me dá aquele seu belo sorriso.

Seu coração vai parando aos poucos até que ouço seu último suspiro que saí quase inaudível. Minha esperança de um milagre morre junto com minha pequena Donna.

Estou completamente quebrada, e dessa vez não sei se tenho forças para juntar os cacos, minha única razão de prosseguir se foi. Uma vez Donna me fez a prometer que um dia eu seria feliz, minha filha apesar de pequena sentia toda a dor que irradiava de mim. Infelizmente não sei se posso cumprir essa promessa, felicidade para mim seria eu e ela vivendo longe do Salvatore, sem ela tudo perde o sentido.




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