CINCO

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Micael Xavier

Eles não mereciam meu respeito, minha boa vontade ou minhas lágrimas, mas nesse momento tudo que eu faço é deixar as poucas lágrimas rolarem pelo meu rosto.

Hoje foi o último dia que eu pisei naquela gravadora, foi a última vez que eu precisei cumprir alguma coisa daqueles contratos bestas que tive que assinar várias vezes.

Mas estou livre agora. Todo o peso que sai das minhas costas transbordam pelos meus olhos e esse é o motivo do meu choro.

Alívio.

É estranho pensar que o meu maior sonho se tornou o meu pior pesadelo. Eu fui obrigado a fazer coisas que não quis, a estar em lugares que eu não queria e viver uma vida de mentira.

Mas acabou. Finalmente acabou e hoje eu me libertei de tudo isso.

- Último compromisso como integrante do Garage9. - Beto, meu advogado, sorri - Agora é só curtição.

- Agora é paz, isso sim. - eu limpo as lágrimas do meu rosto e o suor da minha testa

Tá calor em São Paulo.

- E então, vai voltar pro Rio ainda hoje ou vai aproveitar o fim de semana aqui? - eu dou de ombros

- Sei lá, cara, só quero paz mesmo. - Beto bate no meu ombro

- Você só tem vinte e sete, Cael, não inventa de se fazer de velho agora que se aposentou.

Cael.

A muitos anos que eu não ouço esse apelido, desde a infância ou, mais exatamente, desde que essa banda começou.

Beto e eu estudamos juntos, perdemos o contato por longos anos e, quando a banda estourou mesmo eu o reencontrei. Como advogado. E o fiz ser meu advogado.

Beto tem um irmão, não de sangue mas de coração, o Rodrigo e o besta também é músico, acreditam? Eu não o reencontrei depois de tudo, mas tô louco pra reunir a galera e me sentir ser humano de novo.

- Vamos numa boate, que tal? Comemorar sua carta de alforria. - ele balança o envelope com os últimos documentos entre eu e a banda

- Mano, guarda isso. - eu tento pegar mas ele não deixa

- Vou fazer unas trezentas cópias e guardar essa no cofre lá de casa. - eu afirmo - Bora?

- Pra onde? - eu franzo minha testa

- Você continua lerdo, meu Deus. Pra balada, Micael. - ele bate na minha cabeça - Vou ligar pros caras. - ele nem espera eu dizer alguma coisa, ele apenas pega o celular e sai de perto de mim

Eu reviro meus olhos e entro no carro. Meu lindo e muito caro carro. Sério, por que um Rover tem que ser tão caro? Comprei quase chorando.

Beto não demora pra entrar no lado do passageiro e eu não levo pra casa dele. Eu nem sei como vai ser ainda, se eu vou voltar a morar em Niterói, que eu morava antes da banda, ou continuar no apartamento em Ipanema.

Eu quero me desfazer de tudo que me lembra a banda, não quero ser extremista mas quero esquecer o que houve nesse tempo.

- Marquei com os caras as dez ou você acha muito cedo? - eu dou de ombros

- Não sei, a última vez que fui numa balada foi depois de um show, então o horário foi bem mais tarde. Muito mais tarde.

- Ai, eu sou um famosinho e vivo loucamente. - ele afina a voz e faz uns sons pra me provocar e eu bufo

- Vê se cresce, Roberto!

- Fica nervoso não, bebê. Pareceu até meu pai me chamando pelo meu nome. - ele ri - Trouxe roupa ou quer passar numa loja, playboy?

Xavier - Série Homens Perfeitos #2 Onde histórias criam vida. Descubra agora