| Três |

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Durante o início da viagem, permanecemos ambos em um silêncio que só parece desconfortável para mim. O rádio, ligado num volume baixo, é a única coisa que se ouve dentro do carro.

Na subida da serra, com o dia já clareando, uma chuva fina se inicia, me fazendo, automaticamente, olhar para o céu apenas para constatar que o tempo está totalmente fechado.

— Será que é seguro subir a serra com esse tempo? — pergunto realmente preocupado.

— É tranquilo — ele responde simplesmente. Mas parece se compadecer da expressão de desespero em meu semblante. — A má notícia é que provavelmente vai ficar assim o final de semana todo, então talvez tenhamos que ficar dentro de casa o tempo todo.

— E a boa notícia? — pergunto sem conseguir disfarçar o nervosismo.

— Nós vamos ter tempo de sobra pra nos conhecermos melhor — ele responde com um meio sorriso nos lábios.

♦ ♦ ♦

Depois de quase duas horas de um silêncio angustiante, finalmente chegamos ao nosso destino. Eu não gosto muito de mato e essa coisa de natureza por todo lado, mas tenho que admitir que o lugar é realmente belíssimo.

A casa, que está mais para um chalé, é toda feita em madeira escura, com janelas e portas de vidro. Possui uma pequena varanda na frente com alguns degraus e fica praticamente numa encosta, o que é muito assustador, diga-se de passagem, ainda mais considerando que o vizinho mais próximo, pelo que Carlos me disse, está a, no mínimo, 2km de distância. Mas não posso negar que é uma imagem bastante idílica.

A parte de dentro do imóvel só pode ser descrita como aconchegante. Os móveis, assim como a própria casa, são todos feitos de madeira, o que dá ao lugar um aspecto rústico e charmoso ao mesmo tempo.

O espaço consiste, basicamente, em um grande vão com um único cômodo de alvenaria, que Carlos logo me explica se tratar do banheiro. Ao lado uma cozinha americana e, na parte de trás, uma grande parede de vidro, com uma porta de mesmo material dando para uma varanda praticamente suspensa. A vista é linda, mas eu me recuso a colocar os pés no lugar, usando como desculpa o fato de ainda estar chovendo, o que arranca uma gargalhada do meu sogro.

O teto da casa é bastante alto, o que permitiu que se construísse, sobre o espaço da cozinha e banheiro, uma espécie de mezanino, onde havia uma grande cama de casal, uma poltrona de couro marrom e uma cômoda, além de dois criados-mudos, um de cada lado da cama.

Duas coisas me chamam a atenção. Primeiro, a única porta que existe na parte de dentro do chalé é a do banheiro e, segundo, só existe uma única cama no lugar. Se Matheus tivesse vindo, como é que iríamos fazer na hora de dormir? O pequeno espaço, organizado como sala de estar, possui apenas cadeiras de madeira que, apesar de bonitas, não são nada confortáveis. Não acredito que eu vou ter que dormir no chão, penso enquanto encaro o tapete felpudo próximo à lareira.

— 'Tá pensando na morte da bezerra, rapaz? — Eu estava tão distraído que tive um pequeno sobressalto ao ouvir aquela voz poderosa tão próximo de mim. Nem vi quando ele se aproximou. Carlos havia subido para deixar suas coisas no "quarto" enquanto eu vistoriava o lugar.

— 'Tava aqui pensando que só tem uma cama...

— E o que é que tem isso? — pergunta como eu estivesse falando algo sem sentido. — Leva suas coisas lá pra cima — ele me corta antes que eu tenha a chance de dizer qualquer coisa —, eu vou tomar um banho rápido, depois vejo algo pra a gente comer.

Eu fico sem saber como reagir enquanto o vejo entrar no banheiro e fechar a porta atrás de si. Depois de alguns minutos tentando identificar algum significado nas entrelinhas das poucas palavras que meu sogro falou, subo com minha mochila para o "quarto".

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