capítulo 1

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Eu estava tremendo, isso, eu estava tremendo de raiva, isso nunca acontece, mas parece que temos exceções, eu me senti poucas vezes assim na minha vida, mas nunca tão intensamente e posso dizer, já odeio, odiar é uma palavra muito forte, mas ela se encaixa perfeitamente nesse momento, eu odeio estar com raiva, eu odeio descer do carro e nem a satisfação de ter estacionado perfeitamente me acalmar, eu não consigo me acalmar, estou fora de controle e isso é horrível. Observo o galpão em minha frente e ando rápido até a porta mesmo que sofra um pouco pra isso, bato na porta de ferro e uma fresta se abre, Henri, ele me olha com o desprezo usual.

— Eu quero falar com ele.

Toda a paciência que tive em minha vida inteira se evapora nos longos minutos em que ele demora para me dar uma resposta, hoje eu não queria esperar.

—Vai ter que esperar.

Ele leu a porra dos meus pensamentos? Junto minhas mãos na frente do corpo para acalmar a ansiedade que eu nunca tive, mas nesse momento se fazia presente e misturada com a raiva não me deixava pensar antes de falar.

— Eu moro nesse bairro faz duas porra de anos Henrik, eu nunca fui inconveniente e segui as regras melhor do que muita gente aqui, eu dou aula pra sua irmã e conheço a sua família, você me odeia, ok, sorte sua! Eu não ligo, eu sou gentil e você me trata pior que merda, tudo bem! eu não convivo com você, e você tem o direito de ser um caralho, mas hoje eu não vou aguentar seu drama, me deixa entrar nessa merda porque você sabe o que eu vim fazer aqui.

Ele solta uma risada anasalada, mas não vou dar pra ele mais do meu tempo, ele abre a porta e eu entro no galpão enorme que em sua maioria era ocupado por caixas, mas não presto muita atenção nisso, meu destino está na minha direita.

— Parece que aprendeu a falar, isso prova pra mim qual é o seu tipo.

Ouço a voz de Henri quando passo e escolho ignorar, ando rápido até a escada de metal e subo com dificuldade, há 4 salas aqui, penso em inspecionar cada uma quando ouço a voz dele vinda da última sala então a porta se abre, dois homens saem e me permitem a entrada, agradeço e no momento que entro na sala e meus olhos imediatamente encontram os dele, ouço a porta se fechar atrás de mim quase tão rápido quanto minha raiva evapora, é como se os últimos momentos tivessem acontecido há muito tempo.

— Você sabe o que aconteceu.

Minha voz está baixa e contida, a expressão dele não é boa quando confirma minha afirmação com a cabeça, de longe ele encara o curativo em meu rosto, de certa forma estou feliz por ter me acalmado, ele não é uma pessoa ruim e nem me lembro do porquê estar com tanta raiva, percebo que eu não devo ser a primeira a vir aqui depois do que aconteceu.

— Nós temos um acordo...

Começo e ele não olha mais para mim, seu olhar está na janela, eu o faço também e tento prender minha atenção em alguma coisa, ele está muito distante, vejo que mesmo sendo sábado tem alguns homens trabalhando carregando caixas, os negócios nunca param.

— Além de nós, na verdade, você tem um acordo com todas essas pessoas...

Eu não o encaro quando digo essas palavras, só continuo observando os trabalhadores da ampla janela, e quando penso o que vou dizer a seguir algumas lembranças aparecem, lembranças de algum tempo atrás, quase sorrio, mas esse não é o momento pra isso.

— Nós não interferimos nos seus negócios, você nos dá proteção, eu sei que é difícil, mas se vocês não dão conta não deveriam ter nos...

— Você fala como se fosse uma de nós.

Sua voz é distante e calculada, milimetricamente preparada para me quebrar.

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