O Senhor e, depois dEle, os apóstolos não nos tinham deixado ignorar que o mal se introduzia na nova ordem de coisas que ia estabelecer-se e que devia, por algum tempo, substituir Israel como testemunha de Deus sobre a Terra. Nada de tão grande nem de tão precioso aos olhos e para o coração do Senhor existe como a Igreja ou a Assembléia, segundo os eternos desígnios de Deus. Ela é o templo santo que se ergue, formado de pedras vivas e fundado sobre o Filho de Deus. Ela é o corpo de Cristo, a plenitude dAquele que enche tudo em todos. Ela é a pérola de grande preço: ele deixou tudo, deu-Se a Si próprio para a adquirir. Ela é a Sua esposa, a qual Ele ama, alimenta, santifica e apresentará a Si mesmo sem mancha. Tudo isso já existe no que diz respeito aos verdadeiros crentes e terá, dentro em pouco, a sua perfeita e completa realização na glória.
Considerando a Igreja na sua existência e na sua conduta neste mundo, a sua administração foi confiada ao homem e entregue à sua responsabilidade, como aliás, tem sucedido sempre nas diferentes dispensações de Deus sobre a Terra. Todavia — fato doloroso de verificar, mas inteiramente evidente — o homem tem falhado sempre quando Deus coloca algo sob sua responsabilidade. O primeiro homem, que devia guardar o jardim do Éden,* deixou-se seduzir; Noé, salvo para ser o novo tronco da raça humana, depois de os homens ímpios terem sido tragados pelo dilúvio, Noé, a quem Deus confiara as rédeas do governo, embriagou-se e caiu; Israel, povo escolhido do Senhor para manter a verdade da unidade de Deus no meio das nações idolatras, entrega-se à adoração de um bezerro de ouro; o sacerdócio, estabelecido para a manutenção das relações entre Deus e o povo, tomba nas pessoas de Abiú e de Nadabe, que oferecem fogo estranho; a realeza, que devia conduzir o povo no caminho da justiça, arrasta-o para o culto das falsas divindades; e a Igreja, responsável fazer brilhar na Terra a luz de Cristo e de nela manifestar a Sua vida — uma vida celeste —, falha também na sua alta vocação e vem a dar na coisa mais corrompida entre todas as coisas corrompidas, e tanto mais culpável quanto tem gozado de maiores privilégios.
As Parábolas do Reino dos Céus
O Senhor tinha já anunciado esta introdução do mal nas parábolas do reino dos céus, que lemos em Mateus, capítulo 13. Jesus tinha sido formalmente rejeitado pela nação judaica, representada pelos seus chefes (Mt 12:14 e 24). Por isso o Senhor rompe todas as relações messiânicas com ela e já não reconhece por Seus senão aqueles que fazem a vontade de Seu Pai, unindo-se a Ele (Mtl2:46-50; Jo 6:29). Apresenta-Se então, no capítulo seguinte, semeando a Palavra de Deus nos corações, e mostra os diferentes resultados produzidos por essa obra, segundo o estado da alma e a maneira que ela recebe a Palavra. Nas três parábolas seguintes, o Senhor faz-nos conhecer o aspecto exterior que tomará o reino dos céus durante a ausência do Rei que foi rejeitado, e a maneira que ele se estabelecerá. A parábola do joio ensina-nos que no campo, que é o mundo, o Senhor não tinha semeado senão boa semente, isto é, os filhos do reino, aqueles que lhe pertencem de verdade. Mas, por seu lado, o inimigo, o diabo, semeou o joio, os filhos do mal, entre o bom trigo, aproveitando-se, para tanto, da negligência dos servos do Senhor. E esses filhos do mal não são nem os pagãos nem os judeus, que já existiam quando o reino foi estabelecido.
O joio representa um mal introduzido por Satanás no meio dos cristãos. Depois de ter sido semeado o bom trigo, o joio se acha no meio. Os judaizantes, os falsos mestres, os heréticos em breve surgiram e difundiram as más doutrinas, afirmando, contudo, professarem o ( cristianismo. Tal é o aspecto do reino sobre a Terra, o que testemunha a incapacidade do homem para guardar em pureza o que lhe fora confiado. E esse estado de mistura do bem e do mal podemos facilmente verificá-lo. Poderemos nós trazer remédio contra o mal? Não. O Senhor ensina-nos que as coisas continuarão assim, sempre de mal a pior, até chegar o tempo final da ceifa. julgamento será então executado sobre os maus, e o bom trigo recolhido no celeiro.